quinta-feira, 4 de setembro de 2008

SENHORA DAS TEMPESTADES






QUARTO POEMA DO PESCADOR

Sei agora que Deus rola nas ondas
vem na última onda ei-lo na espuma
é reflexo brilho incandescência.
Se vou à pesca é para o procurar
se lanço a linha é para ver se o pesco
quando pesco um robalo eu pesco Deus
e é com ele que falo em frente ao mar
ele é seixo a alga o vento leste
a nuvem que lentamente cobre a lua
ele é a minha dispersão e a minha comunhão
o fragmento de estrela que se vê ainda
a tainha que salta
ele é o grão de areia e a imensidão da noite
o finito e o infinito
vai na corrente corre-me no sangue
não sei que nome dar-lhe
digo Deus
ele é o laço que me prende e me desprende
o que palpita em mim e o que em mim morre
vem na sétima onda e bate no meu pulso

ele é o aqui o agora o nunca mais
a morte que está dentro
rola na onda
bate na sétima costela do meu corpo
chamo-lhe Deus porque ele é o tudo e é o nada
eternidade que não dura sequer o eu dizê-la
ei-lo na espuma na lua no reflexo
de repente um esticão a cana curva-se
é talvez um robalo de seis quilos
isto é a pesca
o meu falar com Deus ou com ninguém
sozinho frente ao mar.

Ele é o vento a noite a solidão
O robalo que luta contra a morte
E é a minha ligação magnética com Deus
Esse umbigo do mundo
Que rola sobre as ondas e cai do firmamento
Com sua espuma e sua luz e sua noite
Chamo-lhe Deus porque não sei como chamar
Ao meu ser e não ser
De noite junto ao mar
Quando regulo a amostra e sua fluorescência
Pescando robalos
Ou talvez Deus
E sua ausência.


Manuel Alegre

4 comentários:

  1. Poema feito na Foz do Arelho...
    ... onde aprendi e vivi tanto...

    Um beijo

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  2. Terminou em grande, com um grande Homem, este espaço de “Poetas Fora de Moda”. Em grande começou, com outro grande poeta. Senhora das Tempestades estava em lista de espera nas prateleiras dos meus livros. Já está na mesa onde estão os livros que ando a ler ou que primeiro quero ler.
    Passei momentos muito alegres a ler as poesias de Poetas Fora de Moda e a ir à net e a antologias procurar outras poesias desses poetas.
    Foi bom, mesmo muito bom, como bom será certamente poder vir agora aqui encontrar-me com livros que muito nos darão a beber.
    Obrigada por nos ter permitido e continuar a permitir viajar pelos caminhos da poesia.

    Beijinhos

    Rita Carrapato

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  3. Este livro é enorme. Sempre que o leio parece que oiço um eco. Não sei se esse eco vem dentro de mim. Talvez seja preciso uma casa menos vazia para evitar esse eco.

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