terça-feira, 3 de novembro de 2009

QUANDO É QUE O LIVRO COMEÇA?



Há quem goste de um e deteste o outro. Os portugeses que leem e os que não leem repartem-se frequentemente em dois clubes rivais: os que amam José Saramago e os que amam António Lobo Antunes. Amores irredutíveis na maior parte dos casos.

Quanto a mim são dois grandes escritores. Que país pequeno como o nosso se pode dar ao luxo de ter um Nobel e um recorrente candidato ao Nobel?

É claro que podemos não gostar da escrita de um ou do outro mas parece-me pelo menos tolo pretender riscar algum deles do melhor que se tem feito na literatura portuguesa.

Ambos os escritores alimentam de alguma forma esta fogueira tão portuguesa e tão caseirinha ao fazer afirmações que muitas vezes não acrescentam à qualidade das suas obras.

Mas por vezes também nos enriquecem com um comentário ou uma afirmação. E ainda bem. Porque levar-nos a reflectir para além da estrita literatura ou a propósito dela também é função de um escritor.

Por isso, para o bem e para o mal, gosto de ouvir o que dizem. Parei há dias nesta frase de uma entrevista de Lobo Antunes ao Público:

"O LIVRO SÓ COMEÇA QUANDO A GENTE ACABA O LIVRO"




Muito se fala ultimamente de leitura. Mas não estou certo de que falemos todos exactamente do mesmo quando falamos de leitura.

A frase de Lobo Antunes resume uma ideia que me parece importante guardar. O livro vive para alám da leitura. É como uma bomba de profundidade que nos pode fazer reflectir, interelacionar, crescer, perguntar, tremer, rir, mudar...

Isto é, a grande leitura vai para além da leitura. A grande leitura é aquela que nos deixa no coração sementes de inquietação e de mudança.

8 comentários:

  1. Eu gosto e leio os dois. Claro que tenho um amor de paixão pelo ALA, pela sua forma de estar, de sorrir, de falar, de escrever o que escreve. Admiro a forma de escrever do Saramago, mas não simpatizo com ele enquanto pessoa.

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  2. Muito a propósito, esta interrogação acerca do que é a leitura: amanhã lá estarei, no seminário, em Mafra! Quanto aos nossos dois "meninos", confesso apenas o seguinte: consigo ler, e leio com gosto, muitos livros de Saramago; do Lobo Antunes nunca consegui acabar nenhum... As suas crónicas, pelo contrário, são muito "líveis" :-)
    Como são duas figuras fortes e polémicas, é natural que firam susceptibilidades. Sigo com interesse o que têm a dizer.

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  3. Ler um livro é viajar com o autor na descoberta e percepção de estados diversos da consciência, conforme o nosso nível de humor e sensibilidade em cada momento da leitura.Por isso é bom, desejável e surpreendente a releitura.

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  4. Os dois dinossauros das palavras digladiam-se por entre as folhas brancas. Qual o melhor? Ambos merecem o meu abraço...

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  5. Há alguns anos decidi dedicar-me a descobrir José Saramago. Li de enfiada, por prazer, uma série de livros dele, escolhendo aleatoriamente, pois na época vivia convicta de que se gostava de um livro do escritor, gostava dos outros todos. E o que é certo é que fui lendo por puro prazer. Uma enfiada que estão ali na prateleira, de vida arrumada, olhando para mim. A certa altura comecei a bloquear, a história andava em círculos e não avançava. Parei ali, quase no fim do livro. Não vou dizer qual. Depois disso, mais anos passados, li várias vezes O Memorial do Convento e outros de que não me arrependo. Saramago inspira-nos porque nos transporta ao real mágico, agarrando constantemente o leitor, através do lado verosímil das coisas que conta com as artes mágicas da coloquialidade. Não sei se merecia o Nobel. Às vezes canso-me dele, porque ele insiste e insiste na crítica. Mas não será essa a atitude cívica necessária, perante a fraca memória dos homens?

    Entretanto, recentemente, tenho descoberto José Lobo Antunes, que se está a transformar na minha leitua preferida, tal como Clarice Lispector, talvez pelo poder de conduzirem o leitor ao coração das palavras. Hoje, muito antes de escrever isto, de regresso da escola, vinha pensando nas leituras que me aguardam e no quanto andamos mergulhados na superfície das palavras, convencidos do inverso.
    As palavras polémicas de Saramago à comunicação social não têm interesse nenhum. Interessam-me os livros que ele escreve e sou eu que escolho.

    Beijos

    Margarida

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  6. Ler é uma verdadeira aventura que nos dá asas para voar, sem sairmos do chão.
    Cabe à imaginação do leitor reinventa-lo, sempre, em cada leitura.

    Um abraço pleno de emoções e um sorriso :)

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  7. Sábias palavras, Margarida. Não nos cabe julgar quem merece ou não merece o Nobel. Há grandes autores que não o ganharam. E vice-versa. Tomara que o grande prémio da APE em Portugal merecesse tanta polémica Era sinal de que as pessoas liam mais do que lêem.

    Ler também é discordar. Ler ensina a divergir. E esse é um dos mais belos programas de vida.

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