Por vezes penso que a dimensão imensa de Fernando Pessoa deixou na sombra poetas seus contemporâneos que mereciam outra atenção.
É o caso de Almada Negreiros, alma intensa do nosso modernismo. Grande pintor, desenhador e poeta.
A FLOR
Pede-se a uma criança: Desenhe uma flor! Dá-se-lhe papel e lápis. A criança vai sentar-se no outro canto da sala onde não há mais ninguém.
Passado algum tempo o papel está cheio de linhas. Umas numa direcção , outras noutras; umas mais carregadas, outras mais leves; umas mais fáceis, outras mais custosas. A criança quis tanta força em certas linhas que o papel quase que não resistiu.
Outras eram tão delicadas que apenas o peso do lápis já era de mais.
Depois a criança vem mostrar essas linhas às pessoas: uma flor!
As pessoas não acham parecidas estas linhas com as de uma flor!
Contudo, a palavra flor andou por dentro da criança, da cabeça para o coração e do coração para a cabeça, à procura das linhas com que se faz uma flor, e a criança pôs no papel algumas dessas linhas, ou todas. Talvez as tivesse posto fora dos seus lugares, mas são aquelas as linhas com que Deus faz uma flor!
LINDO! Dos mais belos poemas da nossa cultura literária.
ResponderEliminarAliás, gosto de o considerar um princípio pedagógico, que devia estar afixado em todas as salas de aula, para RELEMBRAR que pode sempre existir uma flor onde nem sequer suspeitamos...
Flor