segunda-feira, 31 de maio de 2010

A SENHORA ALICE




Senhoras donas, por favor!
Cada país (cada língua, cada cultura) tem a sua maneira específica de se dirigir às pessoas. Mal passamos Vilar Formoso, logo toda a gente se trata por tu, que os espanhóis não são de etiquetas nem de salamaleques.
Mas nós não somos espanhóis.
Também não somos mexicanos, que se tratam por "Licenciado" Fulano. Nem alinhamos com os brasileiros, para quem toda a gente é "Doutor", seguido do nome próprio: Doutor Pedro, Doutor António, Doutor Wanderlei, etc..
Por cá, Doutor é seguido de apelido, e as mulheres, depois de passarem por aqueles brevíssimos segundos em que são tratadas por "Menina", passam de imediato-- sejam casadas, solteiras, viúvas ou amigadas, sejam velhas ou novas, gordas ou magras, feias ou bonitas, ricas ou pobres -à categoria de "Senhora Dona".
Mas parece que uns estranhos ventos sopraram pelas cabeças das gerações mais novas que fizeram o "dona" ir pelos ares ou ficar no tinteiro. Quando recebo daqueles telefonemas que me querem impingir tudo o que se inventou à face da terra-- desde "produtos" bancários que me garantem vida farta, até prémios que supostamente ganhei por coisas a que nunca concorri-sou logo tratada por "Senhora Alice." Respondo sempre: " trate-me por tu, se quiser; ou só pelo meu nome, se lhe apetecer; mas nunca por Senhora Alice".
Mas o cérebro destes pobrezinhos não foi formatado para encontrar resposta a estas coisas, e exclamam logo: "ah, então não é a Senhora Alice que está ao telefone!"
Eu sei que isto não é uma coisa importante, mas que é que querem, irrita-me quando oiço este tratamento dado às mulheres.
Tal como me irrita quando vejo/oiço um jornalista tratar por você alguém com o dobro da idade dele.
É uma questão de delicadeza. De respeito. E de saber falar português. Três coisas, admito, completamente fora de moda.
Pois qual não é o meu espanto quando, aqui há dias, na televisão, oiço o Senhor Primeiro Ministro referir-se assim à mulher (também odeio a palavra "esposa"?) do Comendador Manuel Violas. "A Senhora Celeste?." (não sei se é este o nome da senhora, mas adiante).
Fico parva. Nos cursos todos que tirou, ninguém lhe ensinou que as senhoras são todas "Senhoras Donas"?
Parafraseando livremente o nosso Augusto Gil,"que quem trabalha num call-center nos faça sofrer tormentos? enfim! Mas o Primeiro-Ministro, Senhor? Por que nos dás esta dor? Por que padecemos assim?"

domingo, 30 de maio de 2010

O SENHOR JOSÉ



"Qual é o seu nome?", perguntam-me vezes sem conta naqueles assaltos à mão armada via telemóvel que são executados por pobres tarefeiros em nome das telefónicas, dos canais de televisão, dos bancos, dos seguros, dos inquéritos e de um sem número de chatos militantes que nos ligam com conversas oblíquas para, regra geral, nos venderem alguma coisa que não queremos.

"Qual é o seu nome?"
Caí que nem um patinho já não sei quantas vezes, respondendo imediatamente: "José Manuel Krusse Fanha Vicente."

"Senhor José..." começa então o funcionário do outro lado do telefone. E aqui é que a coisa se entorna. Fico transido, revoltado, irritado. Eu não sou o sr. José. Não quero ser, recuso-me a ser o senhor José. Detesto as pessoas que me tratam por senhor José. Senhor José é certamente uma marca de pastilhas elásticas. Ou de margarina. Ou de detergente. Ou de....

Eu tenho um nome! Tenho até vários nomes que me podem diferenciar dos outros Josés.

Gosto muito de ser diferente! E gosto muito dos que me são diferentes, c ada qual com o nome que o distingue, que o caracteriza, que o indivuidualiza. Não quero é ser mais um José! Isso é que não, por favor!

terça-feira, 18 de maio de 2010

CONTRA UM CERTO TIPO DE INTERPRETAÇÃO

“A IMAGINAÇÃO É MAIS IMPORTANTE QUE O CONHECIMENTO. ENQUANTO QUE O CONHECIMENTO DEFINE TUDO O QUE NÓS SABEMOS E COMPREENDEMOS NO NOSSO DIA-A-DIA, A IMAGINAÇÃO APONTA PARA TUDO O QUE PODEMOS VIR A DESCOBRIR E CRIAR."

Isto disse Einstein. Em contraste está o texto que recebi e transcrevo abaixo, com as respectivas perguntas de interpretação feitas à maneira de alguns corriqueiros testes escolares da disciplina de português. Há um pequeno pormenor: o texto não faz nenhum sentido. No entanto, muitos alunos responderiam correctamente a esse sem sentido, utilizando a lógica a que eventualmente se habituaram para obter os resulatdos que lhes são pedidos.

Talvez não estejamos muito longe das respostas a perguntas de interpretação sobre, por exemplo, "OS Maias" de que apenas se leu um resumo de 10 páginas...

Aqui vai o texto. Vale a pena reflectir sobre ele e o que ele nos permite reflectir sobre a interpretação de um texto.



Plot ro yo pedrí el escritor en el catón. Socré un ban cote. El graso estaba cantamente linendo. No lo drinió.
Una Para jocia y un Pari joci estaban plinando a mi endidor.
Estaban gribblando atamente. Yo grotí al Pari y a la para fotnamente. No goffrieron nu platión. Na el in yo
no putre licrerlo. Yo lindrió vala.



Perguntas

Dónde pedrió el escritor Plot ro?

Drinió al graso?

Quién estaba plinando a su endidor?

Estaban gribblando atamente o sapamente?

Lindrió o no?

sexta-feira, 14 de maio de 2010

CARREGAL DO SAL



Visitar escolas plo país fora e levar-lhes poesia, histórias reais e inventadas, amor pela leitura,reflexão sobre os livros e a vida, tem sido uma experiência riquíssima que me faz saber que a grande maioria das escolas, dos estudantes e dos professores estão muito, mas muito longe da imagem que se propaga nos meios de comunicação de desestruturação, indisciplina e incompetência.

É claro que nem tudo são rosas. O excesso delirante de burocracia imposto durante o consulado da anterior ministra é extremamente prejudicial. mantêm-se os processos de avaliação tendentes a empacotar e baixar a qualidade pedagógica. O excesso de actividades (ditas AECs) no 1º Ciclo criam problemas graves de saturaçã, stress e redução das capacidades de aprendizagem.

Mas os professores têm sabido superar estes desmandos de quem manda e não conhece o chão que pisa. E um dos muitos casos que tenho conhecido de uma escola a funcionar muito bem é esta EB23 de Carregal do Sal. Deixei lá amigos do coração e espero lá regressar assim que possível.

quinta-feira, 13 de maio de 2010

BARCELOS



EB23 Goçalo Nunes de Barcelos onde fui excepcionalmente recebido por jovens motivados, educadíssimos, curiosos, entusiasmados e professores apaixonados pelo seu trabalho e que fizeram deste encontro um momento excepcional. E, ainda por cima, coroado por muitos cravos.

O que é que se pode desejar mais?

quarta-feira, 5 de maio de 2010

A ARTE DE CONTAR HISTÓRIAS EM AVIS



Um pouco por todo o país, Câmaras Municipais, Bibliotecas Públicas, Bibliotecas Escolares têm vindo a promover a ARTE DE CONTAR HISTÓRIAS, recuperando uma arte antiga e o património da nossa cultura oral, ligando as histórias à promoção do livro e da leitura, procurando que os mais velhos se envolvam neste movimento e façam do conto uma forma de transmitir a sua memória aos mais novos.

Aqui, em Avis, no auditório Ary dos Santos, tive a felicidade de colaborar num dessas sessões em que se contam histórias. Uma arte feliz que une os mais novos e os mais velhos na preservação das raízes e na construção de um imaginário que nos devolva um futuro mais prometedor.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

ARTHUR DEPANIEVE



Mais um dos escritores presentes no encontro LITERATURA EM VIAGEM na Biblioteca de Matosinhos.

O Arthur, brasileiro de S. Paulo, parecia pessoa macambúzia. Mas quando fez a apresentação do seu livro pôs toda a gente a rir e com imensa vontade de ler este seu livro que se anuncia delicioso.

Jornalista e crítico musical, Arthur revelou-se uma pessoa cheia de humor e simpatia. No seu livro, delirante e difícil de descrever, um adolescente norte-americano negro e rico é raptado no Rio de Janeiro por homens com máscaras de Bin Laden. O relato é feito por três pessoas com três inclinações musicais diferentes.

E mais será difícl explicar.Está na minha pilha das leituras mais urgentes.


terça-feira, 27 de abril de 2010

FILOMENA MARONA BEJA



Na literatura portuguesa dos últimos anos, uma das obras mais interessantes é a da minha amiga Filomena Marona Beja.

É imprescíndivel ler dela "A cova do lagarto", romance construído sobre o ritmo alucinante da vida do engenheiro Duarte Pacheco e que venceu o Grande Prémio de Romance da APE de 2007. Há ainda "As cidadãs" que se passa entre o final da Monarquia e os primeiros tempos da República. E "A duração dos crepúsculos", "A sopa", "Betânia".

Além da admiração pela escrita une-me à Filomena uma comizade recente mas já calorosa. Encontrámo-nos em Matosinhos, na Literatura em Viagem. Ouvia-a fazer uma belíssima intervenção que começava por um poema de Kavafis.

Ali apresentou o seu último romance, "BUTE DAÍ, ZÉ". Lisboa, 25 de Abril, contradições, racismo... Já comecei a ler. E recomendo.

CRISTINA CARVALHO



Há tempos que, em cada livraria, vinha a namorar de longe "O GATO DE UPSALA". Ouvi grandes elogios ao livro. Bom para toda a gente dos 8 aos 88 anos. Disseram-me. Passa-se na Suécia no séc. XVII. História de amor e de um gato que salva a sua dona de morrer no afundamento do maior navio de guerra construído até então no mundo. Parecia um bom princípio.

E a autora? Quem seria? Ignorância a minha, claro. Pensei que era uma jovem e que seria o seu primeiro livro.

Conheci-a agora em Matosinhos na LITERATURA EM VIAGEM. E fiquei de boca aberta. Primeiro, sendo jovem, não será excessivamente jovem. Segundo, tem uma obra significativa já publicada. Terceiro, é filha - imaginem! - do grande António Gedeão (pseudónimo do professor Rómulo de Carvalho). E por fim, a Cristina é uma pessoa deliciosa, cheia de amabilidade e de bom humor. E pronto, foi num ai que ganhei uma bela amiga e companheira desta aventura maravilhosa da escrita.

Vou ler o livro dela a correr e aconselho-o a toda a gente. Tenho a certeza de que vou gostar. Quem o ler levado por estas minhas palavras, dê notícias.

sábado, 24 de abril de 2010

LÁZARO COVADLO



Lázaro Covadlo, escritor argentino, nascido em 1937. Por motivos políticos saiu da argentina durante a ditadura e reside desde então em Stiges, na Catalunha.

Eu já tinha ouvido falar dos seus contos. No blog "7leitores" o professor Albano Estrela tinha-lhe feito uma referência altamente elogiosa. Há muito que "Buracos negros" estava na lista das minhas leituras urgentes

Em Matosinhos, no fim-de-semana da Literatura em Viagem, à mesa das refeições, sempre ao lado da sua mulher mais jovem, alta e muito magra, Lázaro parecia um pássaro discreto encostado ao canto, de cabelo muito branco e uns olhos vivíssimos e perscrutadores. Abandonava o seu silêncio ao sabor das conversas com os escritiores ou jornalistas que lhe calhavam por companheiros de mesa.

Conversámos meia dúzia de vezes. Creio que nasceu uma hipótese de amizade entre nós. Aprtoveitei para comprar dois livros seus e trazer o autógrafo. Atirei-me logo aos "Buracos Negros", um livro negro, cheio de ironia, onde sinto o olhar do autor divertido a levar-nos por histórias aparentemente improváveis, inverosímeis e fantásticas. Mas não será a realidade isso mesmo, improvável, inverosímil e fantástica?

quarta-feira, 21 de abril de 2010

LITERATURA EM VIAGEM



De 17 a 20 decorreu na Biblioteca Municipal de Matosinhos mais uma edição da LITERATURA EM VIAGEM que, com as CORRENTES DE ESCRITA da Póvoa de Varzim, constitui um dos acontecimentos mais marcantes da literatura em Portugal, tendo ambas os eventos conseguido ganhar um prestígio internacional notável.

Escritores de vários conversaram com o público e apresentaram os seus livros num ambiente amável e muito enriquecedor.

Alguns faltaram. Ficaram pelos aeroportos fechados. Por isso só nos chegaram os sul-americanos, sobretudo argentinos e brasileiros.

Dos portugueses, de memória, estiveram o Carlos Vale Ferraz, Helder de Macedo, Carla Maia de Almeida,Isabel Barreno, Cristina Carvalho, José Mário Silva, Rentes de Carvalho, Filomena Marona Beja, Francisco José Viegas, valter hugo mãe, Rosa Alice Branco, Nuno e Pedro Silveira Ramos, Júlio Moreira, Alexandra Lucas Coelho, carlos Vaz Marques, Joaquim Magalhães de Castro... Devo estas a esquecer alguém. Peço desculpa. Acabei de chegar de lá. Ainda venho a quente.

Trouxe uma sacada de livros. Nos próximos dias vou trazer para aqui alguns nomes de escritores e livros chegados de lá. Coisas de fazer crescer a água na boca!

quinta-feira, 15 de abril de 2010

REPÚBLICA



Trago aqui duas notícias numa. A primeira tem a ver com a descoberta de um blogue que vale a pena estar atento: "ALMANAQUE REPUBLICANO". Tem imenso material interessante quer em termos de texto quer de iconografia e é filho dos mesmos que deram origem ao "ALMOCREVE DAS PETAS"

Aproveito para roubar imagens recolhidas pelos meus amigos do "Almanaque" numa sessão em que participei mas em que o foco esteve centrado no Professor Adelino Maltez.



Comemorações do Centenário da Implantação da Repúlica na Câmara Municipal de Condeixa. Começaram em Fevereiro e no dia de cada mês até Outubro haverá uma conferência, uma sessão de debate, um pequeno concerto, e tudo relacionado com a República.

Dia 5 de Abril pudemos assistir a uma magnífica conferência sobre "A carbonária e a maçonaria na Imlantação da República" pelo Professor Adelino Maltez.

Quem o conhece sabe a profundidade dos seus saberes, a forma sempre provocatória, irónica e estimulante como aborda a nossa História, a facilidade de comunicação e a paixão que coloca na abordagem que faz aos assuntos mais diversos.

Eu fico deliciado a ouvi-lo e levo sempre para casa uma quantidade enorme de dúvidas, questões, razões para me atirar aos livros e aprofundar este ou aquele tema.

Todos sabemos como este país anda necessitado de inteligência e paixão. Por isso é um privilégio ouvir homens como Adelino Maltez ou como o dr. António Arnault que estava presente na plateia e interveio criando um diálogo muitíssimo envolvente.




E já agora, no próximo dia 5 de Maio, o conferencista será o dr. Luís Gamito, psiquiatra, professor de psicodrama, ex-director do Hospital Júlio de Matos que vai falar sobre: "Miguel Bombarda e a psiquiatria na Rpública".

Qum puder não perca.

terça-feira, 13 de abril de 2010

ESTRELAS E ESTRELOS




Há cerca de 10 dias siau o meu último livro, "HISTÓRIAS PARA CONTAR EM NOITES DE LUAR"

São histórias para várias idades. Umas para pequeninos, outras para mais crescidos, outras até para adultos, todas para quem gosta de ler, de contar e ouvir contar histórias.

Enviei algumas destas histórias a professoras de diversos níveis. Recebi o desenho e a mensagem da minha amiga Teresa Queirós Vieira, Educadora do JI dio Facho, Vila do Conde:

"Há dias que os meninos me pedem que lhe envie o desenho que fizeram da estrelinha Maria Emília...

Contei-lhes a história, é uma das minhas preferidas! E acho que deles também.

Além da magia da história, aprendemos imensas coisas sobre peixe-espadas. Os meninos não sabiam como era um peixe-espada, imaginavam um peixe tipo mosqueteiro,com uma espada a sério!

O desenho foi feito antes de "conhecerem" o peixe-espada "pessoalmente".

Fomos então á lota e não foi nada fácil descobrir o peixe-espada, ficamos a saber que não é um peixe desta zona de costa. Aparece muito raramente por aqui,gosta mais da costa de Sesimbra, e tem bom gosto! Claro, quiseram saber onde era Sesimbra e tantas outras coisas.

Hoje passei a manhã inteirinha na praia,a estudar poças de maré. Nem imagina a quantidade de estrelas do mar que descobrimos! Ou seriam estrelos? Sei que eram todas belíssimas.

Acredite que além das descobertas maravilhosas, ficamos com a alma completamente impreguenada de mar!"

Bem haja, Teresa. Muitos beijinhos para os seus meninos.

domingo, 11 de abril de 2010

E AINDA MAIS CONTADORES DE HISTÓRIAS

Faltam ainda muitos. Não tenho a presunção de conhecer a todos os contadores. Estes que aqui tenho trazido são aqueles com quem mais me cruzo, amigos que me fazem voar sempre que os oiço.

Muitos mais haverá porque a arte de contar histórias está a crescer um pouco por toda a parte.

Há gente que guarda ainda memória das velhas histórias contadas ao borralho com a malga do caldo na mão. Há gente que ainda sabe de cor as cantigas de ceguinhas, tragédias e cimes de fazer chorar as pedras da calçada, gente que tem as histórias da sua vida para contar a quem quiser ouvir.

É preciso ouvi-los a todos. Porque todos têm para nos oferecer uma pequena fatia de uma arte pelo menos tão velha como o mundo.


António Craveiro


Miguel Horta


Jorge Serafim

sexta-feira, 9 de abril de 2010

MAIS CONTADORES DE HISTÓRIAS

Cá venho eu com mais uns quantos contadores. Com crianças ou adultos, já os vi fazer emocionar as plateias mais sisudas e fazer tremer os menos disponíveis para para a aventura da emoção..

São grandes mágicos, grandes shamãs da palavra na terra do coração.


Horácio Santos, "Lalacho"


Ana Lage


Clara Haddad

quarta-feira, 7 de abril de 2010

CONTADORES DE HISTÓRIAS


Cristina Taquelim

Contar histórias é uma das mais antigas e saborosas actividades.

Cresci com as palavras e a voz que as comboiava no percurso doce ou acidentado de cada história.

Encontrei resposta e consolo para algumas das dores do meu peito relembrando as peripécias fantásticas que a minha avó ia fazendo acontecer à minha frente através do misterioso e mágico discorrer das palavras.

Ainda hoje a mão dela vem lá do longe do tempo para virar a página de cada livro em cuja leitura embarco.


António Fontinha

A vida moderna, entretanto, dispersa-nos por um sem número de tarefas vazias de sentido e maravilha.

Nos últimos anos a arte de contar histórias voltou a renascer. De outras maneiras, porventura. Noutros espaços. Inserindo-se no grande esforço silencioso que as Bibliotecas fazem para levar os portugueses a ler mais.

Tenho a honra de pertencer a um grupo de pessoas que se tornaram Contadores de Histórias e que atravessam o país a oferecer o seu doce veneno a quem o quiser receber.

E quem os conhece fica encantado e só tem um pedido a fazer: "Conta-me mais uma história!"


Ângelo Torres

Estes queridos amigos e companheiros precisam de ser conhecidos. Mais conhecidos do que são.

Alguns, profissionais chegados do mundo do Teatro ou da Animação Cultural. Contam as histórias antigas e tradicionais. Outros são escritores e contam as suas próprias histórias. Outros ainda amadores que contam pelo simples prazer de contar.

Uns contam histórias que vêm escritas nos livros. Outros apanham as histórias que o vento lhes deixa nas mãos.

Fazem rir, fazem tremer, falam de Príncipes e sapos, de anões e de feiticeiras, de coisas comezinhas e outras do arco-da-velha.

Cada qual saberá como se tornou contador de histórias. Não os conheço a todos. Mas quero beijar os olhos daqueles com quem me tenho cruzado.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

TELEVISÃO E LEITURA




Grouxo Marx é um dos heróis da minha vida. Quem nunca viu os filmes dos Irmãos Marx não sabe o que perde.

Os textos de Grouxo são impagáveis e, sobretudo, inteligentes. Quem não conhece aquela frase em que ele diz que não pode pertencer a um clube tão mau que o aceite como sócio?

Embora não desdenhe de forma nenhuma do outro Marx, o Karl, gosto de dizer que, como muitos outros, sou "Marxista, tendência Grouxo"

Esta outra frase também dele é sobre a leitura.

"A TELEVISÃO É MUITO EDUCATIVA. CADA VEZ QUE ALGUÉM A LIGA EU VOU PARA A SALA AO LADO LER UM LIVRO"

Boa, boa!

sexta-feira, 2 de abril de 2010

UM LIVRO ESPERA-TE




UM LIVRO ESPERA-TE. PROCURA-O


Era uma vez
um barquinho pequenino,
que não sabia,
não podia
navegar.
Passaram uma, duas, três,
quatro, cinco, seis semanas,
e aquele barquinho,
aquele barquinho
navegou.


Antes de se aprender a ler aprende-se a brincar. E a cantar. Eu e os meninos da minha terra entoávamos esta cantiga quando ainda não sabíamos ler.
Juntávamo-nos na rua, fazendo uma roda e, ao despique com as vozes dos grilos no Verão, cantávamos uma e outra vez a impotência do barquinho que não sabia navegar.
Às vezes construíamos barquinhos de papel, íamos pô-los nos charcos e os barquinhos desfaziam-se sem conseguirem alcançar nenhuma costa.
Eu também era um barco pequeno fundeado nas ruas do meu bairro. Passava as tardes numa açoteia vendo o sol esconder-se à hora do poente, e pressentia na lonjura – não sabia ainda se nos longes do espaço, se nos longes do coração – um mundo maravilhoso que se estendia para lá do que a minha vista alcançava.
Por detrás de umas caixas, num armário da minha casa, também havia um livro pequenino que não podia navegar porque ninguém o lia. Quantas vezes passei por ele, sem me dar conta da sua existência! O barco de papel, encalhado na lama; o livro solitário, oculto na estante, atrás das caixas de cartão.
Um dia, a minha mão, à procura de alguma coisa, tocou na lombada do livro. Se eu fosse livro, contaria a coisa assim: «Certo dia, a mão de um menino roçou na minha capa e eu senti que as minhas velas se desdobravam e eu começava a navegar».
Que surpresa quando, por fim, os meus olhos tiveram na frente aquele objecto! Era um pequeno livro de capa vermelha e marca-de-água dourada.
Abri-o expectante como quem encontra um cofre e ansioso por conhecer o seu conteúdo. E não era para menos. Mal comecei a ler, compreendi que a aventura estava servida: a valentia do protagonista, as personagens bondosas, as malvadas, as ilustrações com frases em pé-de-página que observava uma e outra vez, o perigo, as surpresas…, tudo isso me transportou a um mundo apaixonante e desconhecido.
Desse modo descobri que para lá da minha casa havia um rio, e que atrás do rio havia um mar e que no mar, à espera de partir, havia um barco. O primeiro em que embarquei chamava-se Hispaniola, mas teria sido igual se se chamasse Nautilus, Rocinante, a embarcação de Sindbad ou a jangada de Huckleberry. Todos eles, por mais tempo que passe, estarão sempre à espera de que os olhos de um menino desamarrem as suas velas e os façam zarpar.
É por isso que… não esperes mais, estende a tua mão, pega num livro, abre-o, lê: descobrirás, como na cantiga da minha infância, que não há barco, por pequeno que seja, que em pouco tempo não aprenda a navegar.


ELIACER CANSINO
Tradução: José António Gomes


Eliacer Cansino Macías (Sevilha, 1954) é professor de Filosofia numa escola de Sevilha, desde 1980, e autor de romances para jovens e adultos. Em 1997, recebeu o Prémio Lazarillo por O Mistério Velázquez, recriação da vida do anão Nicolasillo Pertusato e da sua relação com Velázquez. Em 1992, foi-lhe outorgado o Prémio Internacional Infanta Elena pelo livro Eu, Robinsón Sánchez, tendo naufragado, obra que foi também finalista do Prémio Nacional de Literatura Infantil, de Espanha. Em 2009, recebeu o Prémio Anaya de Literatura Infantil e Juvenil por Um Quarto em Babel. O lápis que encontrou o seu nome (2005). Tem muitos outros títulos editados.


A Mensagem do Dia Internacional do Livro Infantil é uma iniciativa do IBBY (International Board on Books for Young People), difundida em Portugal pela APPLIJ (Associação Portuguesa para a Promoção do Livro Infantil e Juvenil), Secção Portuguesa do IBBY.

quarta-feira, 31 de março de 2010

EL TIEMPO PASA



Ouvi pela primeira vez "Años" neste disco de Raimundo Fagner que a cantava com Mercedes Sosa.

É um dos discos da minha vida. Ainda hoje o oiço comovido. Nele cantam ainda com Fagner Juan manuel Serrat e Camarón de la Isla. Aparece um poema de Florbela Espanca soberbamente musicado. E há ainda um poema de Rafael Albertí. E um outro de Ferreira Gullar. Enfim... Só ouvindo.

Comprei este disco. Nunca mais o vi nem em discotecas nem nas mãos de ninguém a não ser muito improvavelmente em Nápoles na casa do meu amigo Vittorio Placella, médico e poeta que me disse que era um dos discos da sua vida. A juntar a esta coincidência, o facto de fazermos anos no mesmo dia. Às vezes quase somos levados a acreditar nas mais misteriosas interpretações dos desígnios da vida.