sexta-feira, 31 de agosto de 2012

SEM ALTERNATIVA AO MERCADO?


Nunca li Jonathan Coe mas tenho o seu último romance, "A vida privada de maxwell Sim", na pilha cada vez maior das urgências.

A leitura de um livro faz-se por vezes de muitas coisas, opiniões ouvidas, críticas de jornal, entrevistas do autor... Tudo isso junto nos encaminha para o livro e nos ilumina e completa a leitura.

No dia 25 passado, a "Actual" do Expresso trazia uma muito interessante entrevista com Jonathan Coe.

Falava-se da tradição do humor na literatura inglesa, da situação no mundo e na Europa, da vida que cerca e que faz com que um escritor seja aquilo que é e escreva aquilo que escreve.

Respigo uma resposta do autor britânico:

"Parte do problema da Inglaterra é que a margem de diferença entre os partidos é muito pequena. E, em termos económicos, são todos de direita, nenhum deles defende uma alternativa ao mercado."


segunda-feira, 27 de agosto de 2012

CHEIRO A SOL



E mais um poema de Manoel de Barros. Ando com ele nos bolsos da memória. Há dias assim, em que a poesia não sai do ninho.




Retrato do artista quando coisa: borboletas
Já trocam as árvores por mim.
Insectos me desempenham.
Já posso amar as moscas como a mim mesmo.
Os silêncios me praticam.
De tarde um som de latas velhas se atraca
em meu olho.
Mas eu tenho predomínio por lírios.
Plantas desejam minha boca para crescer
por de cima.
Sou livre para o disfrute das aves.
Dou meiguice aos urubus.
Sapos desejam ser-me.
Quero cristianizar as águas.
Já enxergo o cheiro do sol.

Manoel de Barros


quinta-feira, 23 de agosto de 2012

O VERBO TEM QUE PEGAR DELÍRIO



MANOEL DE BARROS vai a caminho dos 96 anos. Grande é o poeta! E vivo! E continua a poetar altamente, creio eu.

Salvé Manoel! Viva a poesia!



No descomeço era o verbo.
Só depois é que veio o delírio do verbo
O delírio do verbo estava no começo, lá onde a
criança diz: Eu escuto a cor dos passarinhos.
A criança não sabe que o verbo escutar não funciona
para cor, mas para som.
Então se a criança muda a função de um verbo, ele
delira.
E pois.
Em poesia que é voz de poeta, que é voz de fazer
nascimentos -
O verbo tem que pegar delírio.

Manoel Lopes


quarta-feira, 22 de agosto de 2012

AMOR SÓ AMOR


De vez em quando desço - ou subo - aos jornais. Tenho evitado frequentar a informação ou aquilo a que se chama informação em Portugal.

Tenho mais que fazer.

Há coisas muito mais importantes a tratar do que ficar a saber os dislates de quem manda no país, os cursos que não tiraram, as asneiras que dizem nos discursos, as aldrabices descaradas, os roubos, os dinheiros escondidos na Suiça ou noutros sítios com menos vacas, as conversas dos comentadores patarecos que falam em economês, o fim dos casamentos dos jogadores de futebol, as operações plásticas das vedetas de ocasião e mais e mais e mais.

Mas no meio dos jornais, lá nos cantinhos mais esconsos, vou encontrando gente que pensa, que também fala da vida real, de coisas importantes e não das outras tontices de comer e deitar fora.

Falo do António Guerreiro, da Alexandra Lucas Coelho, de Frei Bento Domingues, do Professor Daniel Sampaio, de Ana Cristina Leonardo e mais alguns.

Respigo do artigo de domingo 19/08/12 de Alexandra Lucas Coelho no suplemento do Público a história do cantor brasileiro Jards Macalé que, durante a próxima Copa do Mundo no Brasil, tem o plano de desdobrar uma bandeira gigante do Brasil em que em vez de "Ordem e Progresso" esteja escrito "Amor, Ordem e Progresso".

Aliás, macalé já encaminhou para o governo um pedido de alteração da bandeira.

"O primeiro passo será esse.", diz ele. "Depois de desaparecer a Ordem e o Progresso fica o Amor."

Há gente assim pelo mundo fora. Gente que faz das palavras coisa séria. Da arte um caminho. Do amor uma utopia possível.

domingo, 19 de agosto de 2012

A FÚRIA DA AVALIAÇÃO, OU, QUEM NOS AJUDA A PENSAR


Gosto muito de quem me ajuda a pensar. E não foram raras as vezes que António Guerreiro, com a sua coluna AOPÉDALETRA no jonal Expresso, me tem ajudado a pensar sobre diversos assuntos da minha vida ou da vida de todos nós.

Por isso estou-lhe muito grato.

Na semana passada o tema era a avaliação, tema que me provoca e sempre provocou imensa brotoeja.

Sempre achei, enquanto professor, que nada do que fazia podia caber em nenhuma grelha de avaliação. Sempre achei que quem vale a pena, seja professor ou outra coisa qualquer, é quem vive aquém, além de todas as grelhas, quem se porta mal e não se verga perante o sistema, quem se borrifa para os relatórios e ama, ama, ama aquilo que ensina e faz de todo esse amor uma imensa dádiva ao mundo.

E encontrei por aí este cartoon que retrata muito bem todo o processo da avaliação que o António Guerreiro tão bem aborda neste texto seu que reproduzo.


"Para os epistemólogos, a avaliação é um gesto metodológico sofisticado, que releva de uma ciência. Mas a avaliação como prática do aparelho — como aquela a que todos os trabalhadores e instituições estão hoje submetidos — é outra coisa: uma ideologia poderosa e um mecanismo puramente gestionário. Sirva de exemplo a avaliação que o Governo mandou fazer às Fundações, cuja supervisão todos reconhecem como necessária, para que não se tronem instituições especializadas em extorquir dinheiro. A Fundação da Universidade de Lisboa foi avaliada com 7,8 pontos (numa escala de 0 a 100), e até a Gulbenkian ficou a meio da escala. Os resultados — qualquer pessoa de bom senso estará de acordo — estão errados, porque errados estão certamente alguns critérios. Mas o erro maior está no cerne da ideologia da avaliação, que tudo reduz ao mensurável. Medindo, calculando, numerando e comparando, os avaliadores imaginam-se a fazer um trabalho científico. Tão científico que nenhuma décima escapa à medição apuradíssima.

Os avaliadores são uma seita e a sua mística é a ordem quantitativa pela qual tudo acede a um estado estatístico e entra num ranking. Mas como sabem que o seu trabalho não é interno a um saber, eles precisam que os avaliados (que, por sua vez, são os avaliadores dos outros) lhes outorguem legitimidade, que a creditação seja ao mesmo tempo coerciva e consentida. Esse consentimento tácito é obtido através da autoavaliação que os avaliados são convidados a fazer e que lembre o ritual da autocrítica que era imposto nos regimes comunistas. Pela autoavaliação, o sujeito avaliado confessa os seus pecados, incrimina-se a si próprio, denuncia as suas inclinações menos produtivas. Tudo isso para responder às eternas injunções da burocracia e também para assumir uma cumplicidade estratégica com os avaliadores em posição de mestres."

António Guerreiro, «Ao pé da letra», Expresso-Atual, Portugal, 11.8.2012.

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

BIBLIOTECA DE S. LÁZARO EM LISBOA



Há pequenos recantos mágicos em Lisboa. este é um deles. A sala de literatura para a infância na Biblioteca de S. Lázaro em Lisboa, perto do Hospital de S. José.


Aqui estão as publicações infanto-juvenis desde 1900 . Ou melhor, aqui está guardada uma parte da infância de cada um de nós, Biblioteca das Raparigas, Condor ilustrado, Mandrakes, adaptações dos clássicos portugueses por Adolfo Simões Muller, a colecção Marabu e muito , muito mais.

É um espaço de paz e maravilha e posso mostrá-lo aqui a quem não o conhece através dos fotos do meu amigo Carlos Reis. bem haja.


E esta escada traz-me logo à boca aquele poema do David Mourão-Ferreira, "É uma escada em caracol..." que o Camané canta tão bem.

sábado, 11 de agosto de 2012

GANHEI UM POETA


Nunca ganhei a lotaria, o euromilhões, o totobola, nem sequer uma simples rifa de verbena. Mas poetas, já ganhei bastantes.

Desta vez foi o prémio Nobel Tomas Transtromer que me chegou graças ao excelente e continuado trabalho da editora Relógio d'Água e à tradução que me soa muito bem de Alexandre Pastor.

É uma alegria muito grande quando descubro a obra de um poeta que não conhecia e que me leva a novos patamares da relação com a palavra e as suas fantásticas viagens.

As línguas, a falta de imprensa, a insistência na divulgação do Mac Donald cultural, deixam-nos sozinhos da grande poesia, da grande música do mundo, de muito do melhor que alguns irmãos nossos fazem lá nesses seus cantinhos tão fora das grandes auto-estradas culturais

As línguas serão sempre uma ponte e uma barreira. Leio bem em francês e em espanhol. Dá para navegar no italiano. Entendo-me com o inglês corrente mas muito mal com o inglês literário. Gosto das edições bilingues para ler com um olho em cada língua.

Um dia vou aprender inglês a sério para ler no original Shakespeare, Walt Whitman, Ted Hghes, Walace Stevens, Alen Guinsberg, etc, etc.

Também gostava de aprender alemão. E russo, vá lá... Mas há tanto poeta que adoro nas traduções e que escrevem em línguas que nunca aprenderei.

O grego Yanis Ritsos, o russo Tarkoski, pai do realizador de cinema, o checo Vladimir Holan , o indiano Rabindranaz Tagore, o Tonino Guerra que escrevia em romagnolo...

Mas às vezes ganhamos um poeta graças ao Nobel ou a outra circunstância qualquer, como já me tinha acontecido em relação à extraordinária poeta polaca Szymborska.

Devo aos editores estas pequenas vitória e muito, como já disse, à relógio d'Água que é um oásis em Portugal.

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

O FUTURO QUE HOUVE E O QUE DEIXOU DE EXISTIR


Cresci a acreditar que era preciso andar para a frente. Amanhã ia ser sempre melhor. Trazíamos utopias no bolso. Ideias que falavam de mudança, de amor, de fraternidade, de solidariedade.

Chorei na passagem de ano de 67 para 68 a ouvir os Beatles a cantarem em directo na RTP (a partir da BBC) "All you need is love".

O amor valia muito nesse tempo. O amor que fazia com que cada pequeno gesto ganhasse força e sentido e caminhasse em direcção à maravilha.

O mercado, a bolsa de valores, o crédito bancário eram coisas velhas, sem alegria por dentro, fora de tudo o que fosse humanidade, amizade, futuro.

E nós estávamos carregados de futuro.

Eu cá talvez ainda esteja. Com esta idade não creio que tenha cura.

Mas assisti ao assassinato de vários sonhos. O da democracia chilena estrangulada pelos homens de Pinochet foi dos mais trágicos.

Luís Sepúlveda fala-nos desse crime. O futuro estrangulado de forma brutal.

Mas há muitas for mas de estrangular o futuro. Estamos a viver há alguns anos uma forma "suave" de matar os sonhos de futuro. As estratégias serão diferentes. Mas os mandantes são sempre os mesmos.

É por isso que os poetas, absolutamente zangados mas irresponsavelmente utópicos, só podem escrever que amanhã tem de ser melhor.



"E TUDO O QUE ESTAVA GRÁVIDO DE FUTURO FICOU, DE REPENTE, ENVENENADO DE PASSADO"

Luís Sepúlveda, “A sombra do que fomos”



segunda-feira, 6 de agosto de 2012

NUNO TEOTÓNIO PEREIRA


Tem 90 anos. Está cego. Estava cego de uma das vistas. Acordou há dias e percebeu que a outra vista apresentava sinais perturbadores. Tomou os transportes públicos para ir ao atelier conforme fazia todos os dias. Foi despedir-se de Lisboa. Ao jantar tinha cegado da segunda vista.

Esta história é contada pelo Público na edição de domingo 29.07.12, junto com uma biografia e uma entrevista. Todas de leitura obrigatória.

Nuno Teotónio Pereira é um dos arquitectos míticos para a minha geração, junto com Nuno Portas, Manuel Tainha e outros que não se preocupavam em fazer bolos de noiva pós-modernos para "enfeitar" a cidade e os bolsos dos empreendedores sem respeito pelos espaços colectivos.

Traduziu para português a "Carta de Atenas", bíblia dos arquitectos que procuravam nos anos 50 e 60 responder às necessidades sociais da cidade e da sua arquitectura.

Propunha uma arquitectura que permitisse uma vivência limpa, decente e comunitária.

Foi fundador do MRAR, Movimento para a renovação da arte religiosa. Nesse caminho é emblemática a igreja da Rua Camilo Castelo Branco em Lisboa (projecto conjunto com Nuno Portas, Vasco Lobo, Vitor Figueiredo, P.Vieira de Almeida).

O edifício que projectou para a R. Brancaamp, em Lisboa, conhecido pelo "Franjinhas", provocou uma tremenda discussão pública. mas isso era num tempo em que os animais falavam e apesar da censura e de tudo o mais, a coisa pública, a polis, era discutida na praça pública.

Nuno Teotónio Pereira foi um dos mais destacados membros dos "católicos progressistas", grupo que se levantou contra o Estado Novo, denunciando os crimes da Guerra Colonial, as condições dos presos políticos, os abusos da polícia política.

Integrando a vigília da Capela do Rato na passagem do ano de 72 para 73, contra a guerra e o regime vigente, foi preso e só libertado a 26 de Abril de 74.

Do Nuno Teotónio Pereira, amigo muito querido de quem fui companheiro em várias lutas posso dizer, não receando cair no lugar comum, que tendo perdido a vista continua aos 90 anos a ver muito mais do que muito boa gente este país.

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

SIMPLIFICAR OU NÃO SIMPLIFICAR, EIS A QUESTÃO

Repete-se há muito uma discussão em torno da literatura para a infância e juventude sobre o que se deve dar a ler.

Os dois grandes polos da discussão são os que defendem que:

- é necessário simplificar o vocabulário dos livros para jovens já que, lendo coisas simples, se habituam a gostar de ler e poderão depois passar a ler coisas mais elaboradas;

- a simplificação é filha do facilitismo e da estrita intenção comercial já que, quem se habitua a gostar da simplificação dificilmente entenderá aquilo que a leitura lhe pode dar de grande riqueza no olhar para dentro de si e dos outros.

E temos aqui uma achega do meu querido amigo Mário de Carvalho que é das pessoas que melhor escreve em Portugal, das que melhor usa esse instrumento fantástico que é a língua portuguesa.



"SE UM ESCRITOR SE LIMITASSE AO VOCABULÁRIO BÁSICO SERIA COMO UM MÚSICO QUE SÓ USASSE AS SETE NOTAS OU UM PINTOR QUE SÓ RECORRESSE ÁS CORES PRIMÁRIAS."


Mário de Carvalho, “JL”, 21.04.2010

terça-feira, 31 de julho de 2012

PALAVRAS ROUBADAS AOS LIVROS


Leio quase sempre de lápis na mão. Para guardar esses pequenos momentos de luz que os escritores nos oferecem e que nos fazem reflectir, olhar para as coisas de um ângulo inesperado.

Sublinhar, deixando nas páginas lidas os comentários surgidos no momento, as reflexões ou as emoções que não queremos perder, serve-nos também para dar mais consistência à leitura, deixar marca dela, permitir voltar a ela apen em torno das ideias que especialmente nos comoveram.

Fazer este trabalho de leitura é agarrar o efémero, fazer da leitura uma passagem de tempo que guarda um pedaço desse tempo na memória e que fica registada nas margens dos livros lidos.

E aqui vai uma dessas frases apanhadas com uma rede de apanhar asas e sentidos.

“- CUIDADO, MINHA NETA. ESCREVER É PERIGOSA VAIDADE. DÁ MEDO AOS OUTROS."

“A confissão da leoa” , Mia Couto

terça-feira, 24 de julho de 2012

DAS ESTÁTUAS AO QUOTIDIANO



Venho falar-vos de Eduardo Salavisa que se define a si próprio como desenhador do quotidiano. Na sua vida de professor desenvolveu o diário gráfico como instrumento educacional para encorajar os alunos a desenhar.


Encontrei-o há dias. Ou melhor, reencontrei-o. Não sabia que nos tínhamos cruzado nos exames de uma disciplina que assustava os menos dotados dos que andavam na Escola Superior de Belas Artes de Lisboa (como eu andei e onde me formei em Arquitectura).

A disciplina era Desenho de Estátua. Fiz 3 vezes o exame (que durava 16 horas, 4 manhãs), dois para entrar na Escola, mais 1 no final do 1º ano. O professor era Mestre Lagoa Henriques.

As estátuas a desenhar eram sorteadas em cada exame. Não havia muitas. Meia dúzia, talvez. A mim calhou-me sempre a Vénus de Milo. Acabei por saber desenhá-la de cor em todas as posições possíveis. Infelizmente, desenhar nunca foi arte que desenvolvesse especialmente.


O Eduardo publicou vários livros cm os seus desenhos. São os Diários de Viagens que aconselho fortemente os meus amigos a procurarem e mergulharem neles como num prazer muito especial.

O blog dele vale muito a pena visitar e por lá ficar a "viajar" pelos seus desenhos.

http://diario-grafico.blogspot.pt/


sexta-feira, 20 de julho de 2012

FALAR DE LIVROS


Repetir o mesmo texto em dois blogs em que participo, parece um pouco pretensioso. No entanto, penso que os leitores de um e outro talvez não sejam coincidentes.

A Leitura é uma paixão minha. E a reflexão escrita sobre essa mesma Leitura constitui um exercício que muito prezo e me ajuda a melhor entender e absorver o lido. Esse exercício tenho-o trazido a público no blog "7leitores" em conjunto com vários outros leitores "obsessivos".

Escrevi este textinho a propósito desse mesmo exercício e tenho a esperança que possa interessar também a leitores que sejam frequentadores deste blog e não do outro.


(Com muita admiração e amizade a Helena Vasconcelos e Eugénio Lisboa)


Receio muito o exercício da opinião, sobretudo quando se torna "profissional" e de olho gordo posto na gorjeta; quando procura criar poder e influência sob a capa da reflexão e da especialização; quando vive das modas, ou seja, do negócio de circunstância; quando usa as cinco estrelas, quatro garfos, três parafusos e meio, uma qualquer tabela classificativa; quando intencionalmente magoa, exclui, ignora.

Exemplos destes lemos larga e regularmente nas páginas de crítica literária, musical, cinematográfica, teatral, de artes plásticas, etc,dos nossos jornais.

"O intelectual, o mandarim universitário, o rato de biblioteca não frequenta a escola da bravura.”, afirma Georges Steiner.

("Quatro entrevistas com Georges Steiner", Ramin Jahanbegloo, Ediçõs Fenda, Lisboa, 2006)


Quando falo de livros falo de uma leitura conduzida de dentro da minha vida. Um encontro humilde e apaixonado, sem outras preocupações que não as de permitir que essa leitura me acrescente. E há um rio que corre do livro lido ao meu encontro , um rio por onde circulam pequenas luzes que me vão iluminar hoje e amanhã e depois.

Citado por Harold Bloom ("Ler" Junho 2012), afirmava Oscar Wilde que: "A crítica literária é a única forma civilizada de autobiografia".



O problema será talvez quando não se tem biografia e só se tem opinião. Mas o pior ainda é quando a ausência de biografia implica a incapacidade de amar e faz com que o opinante se esconda por baixo da capa enganosa de um saber que se a si próprio como único critério de análise.

Eu leio com paixão. E quando a paixão não se solta e os livro nada me acrescenta ao acto de tactear a vida com os dedos, então nem falo desses livros. Secam à nascença. Ficam muito bem guardados na gaveta do esquecimento.

Voltando a Bloom: "Quando somos mais velhos, queremos que a crítica - como o ensino, a leitura, a escrita - não seja apenas humanista, seja também humana. Tem de ser amor à literatura antes de mais nada.

E acrescente-se de novo Georges Steiner:

“Ler não é sofrer mas, falando com propriedade, estarmos prontos a receber em nossa casa um convidado, ao cair da noite.”

Vale a pena ler os grandes leitores. Aprendemos muito com eles. Harold Bloom, Georges Steiner, Eduardo Lourenço.

E eu sei pouco. Mas tenho para a troca.

segunda-feira, 16 de julho de 2012

EB1 GALEGOS - PENAFIEL


Tempo de pousio e de reviver memórias das muitas escolas por onde passei e de que não dei de imediato notícia mas que guardo com muita ternura no coração.

Aqui estão imagens da EB1 de Galegos



terça-feira, 10 de julho de 2012

A DITADURA EM QUE VIVEMOS


Não tenho dúvida de que vivemos numa ditadura comandada pelos bancos. E lamento as figuras tontas e cegas (ou nem por isso) de muitos dos nossos dirigentes, jornalistas, políticos, sempre dispostos a obedecer aos grandes patrões para ficar com as migalhas que os fazem sentir-se um poucochinho importantes.


(Magritte)

O parágrafo que se segue é o início do artigo semanal do meu amigo Nicolau Santos no Expreeso. Vale a pena ler. E talvez chorar. Ou lutar contra o status quo, sabe-se lá como. Com indignação certamente, com protesto sempre que se justifique, com desobediência civil porventura.

"A banca, grande responsável pela brutal crise que o mundo ocidental está a viver, não aprendeu nada com o tsunami que criou. Continua a ter o mesmo tipo de práticas e comportamentos, os mesmos estímulos perigosos, a mesma falta de ética para com os depositantes, a mesma arrogância e balofa superioridade que nos conduziram até aqui, a mesma divisa - a ganância é boa -."



sábado, 7 de julho de 2012

PERGUNTAS INGÉNUAS


Há muitos lugares comuns que de tanto ser repetidos acabam por parecer verdade. É sempre bom interrogá-los para não andarmos a dizer coisas por encomenda.

Aqui vão algumas dúvidas minhas que, noutro contexto completamente diferente, são da mesma família das que Brecht deixou em muitos dos seus poemas.

PORQUE É QUE A INICIATIVA PRIVADA É MELHOR QUE O ESTADO? E PARA QUEM?

COMO É QUE UM PAÍS PODE SOBREVIVER BEM SEM TER UM GOVERNO EFECTIVO DURANTE 18 MESES COMO A BÉLGICA?

PORQUE É QUE NÃO NOS DIZEM NADA SOBRE O QUE E PASSA NA ISLÂNDIA? E COMO É QUE AQUELE PAÍS SOBREVIVEU - E BEM - À CRISE?

PORQUE É QUE PAÍSES COMO O PERU NÃO PAGARAM A DÍVIDA AO FMI E ENTRARAM NUM CICLO DE DESENVOLVIMENTO?

ÀS VEZES FALAM MUITO EM NÓS. DIZEM QUE NÓS GANHÁMOS. QUE FOMOS ÀS MEIAS FINAIS. QUEM SOMOS NÓS EXACTAMENTE? QUEM DE NÓS É QUE GANHOU? E QUEM PERDEU?

E a última mas talvez a que vai mais fundo na dúvida:

O INVESTIMENTO CRIA MESMO EMPREGO? OU REDUZ?

(Nick Hannauer, multimilionário americano: "Um consumidor de classe média cria muito mais emprego que um capitalista como eu."

Director da emprea alemã IG Metall (há cerca de 25 anos) afirmou que o investimento não cria mais emprego, pelo contrário, suprime-o.)


quinta-feira, 5 de julho de 2012

VALONGO



Muitas turmas de várias escolas, 4ºs anos, no anfiteatro da Biblioteca Municipal de Valongo com escolas de Valongo a que me unem laços de especial afecto.

Fiquei babado. Estou habituado a andar pelo palco. Mas desta vez fiquei pouco à vontade, na plateia, a assistir as meninos que representavam e cantavam textos meus.

A sessão foi uma delícia. Um banho de ternura. E só no final subi ao palco.



quarta-feira, 27 de junho de 2012

TEM QUE SER


Ao fim do 9º ano, a minha filha Matilde disse-me que queria ir para Medicina. Avisei-a que era um objectivo ambicioso e que teria de trabalhar muito e bem para lá chegar. Ela respondeu-me: "O que eu quero, eu faço."

Deixou-me sem resposta e babado de orgulho. Logo de seguida, quando olhei para ela, devolvendo-lhe esse orgulho nos meus olhos, encolheu os ombros e disse: "TEM DE SER!"

E eu que estou farto de ouvir dizer a tanta gente" Tem de ser..." fiquei a pensar na diferença. E cheguei à conclusão que a diferença estava na exclamação para um lado e nos 3 pontinhos para outro.


(Miró)

Este país está tão cheio de três pontinhos... Tão cheio de "Assim assim...", "Cá se vai andando devagarinho...", "É preciso aguentar...", "Tem de ser.."

Precisamos tanto de gente que diga "TEM DE SER!" e que o diga na cara de quem nos tira qualidade de vida e dignidade e nos enche de mal viver porque obedece cegamente aos grandes senhores do capital.

É preciso um grande vento de mudança neste país, nesta Europa, neste Mundo. TEM DE SER!


(Picasso)

domingo, 24 de junho de 2012



A Biblioteca Municipal de Tábua é uma daquelas (felizmente muitas) onde somos sempre recebidos por um sorriso dos mais largos.

Porque as pessoas que ali trabalham sabem que estão a fazer bem um trabalho imprescindível ao futuro deste país: promover o livro e a leitura.

Gente que se chama Ana Paula, Filipe, Luís, Cátia, Ana e mais nomes não sei que a minha memória nem sempre me deixa ficar bem.

Eles e todos os que trabalham nesta área andam a navegar contra o economicismo, contra a iliteracia de quem governa, contra a escassez de meios.

Mas estão felizes porque são úteis, porque dentro de cada história, de cada livro, de cada biblioteca há cavalos a correr a galope para dentro da nossa alma.

Estive por lá na V Tábua de Leituras. E aqui fica prova na fotografia com a linda "andorinha" Helena Duque, a querida Luísa Ducla Soares, aminha amiga Carla Maria Rebelo, professora bibliotecária e a filha Matilde.

A festa durou uns dias. Foi bom. Foi muito bom.