segunda-feira, 15 de setembro de 2008

ASAS

Começam hoje as aulas pelo país fora. Alguns professores vão ajudar meninos a ganhar asas. Outros vão apenas cumprir o programa e aceitar, bem comportadinhos, todas as palermices que os mandarem fazer. Tenho pena destes últimos porque nunca ganharão asas nem ajudarão ninguém a aprender a voar.

Aos primeiros envio um beijo, um abraço e este poema. Eles sabem, ou pelo desconfiam, que ensinar é um acto mágico que está para lá de todas as burocracias, um acto em que cresce o aluno e o mestre e em que ambos aprendem a soltar as asas.


ASAS

Nós nascemos para ter asas, meus amigos.
Não se esqueçam de escrever por dentro do peito: nós
nascemos para ter asas.
No entanto, em épocas remotas, vieram com dedos
pesados de ferrugem para gastar as nossas asas como
se gastam tostões.
Cortaram-nos as asas para que fôssemos apenas
operários obedientes, estudantes atenciosos, leitores ingénuos
de notícias sensacionais, gente pouca, pouca e seca.
Apesar disso, sábios, estudiosos do arco-íris e de coisas
transparentes, afirmam que as asas dos homens crescem
mesmo depois de cortadas, e, novamente cortadas,
de novo voltam a ser.
Aceitemos esta hipótese, apesar não termos dela
qualquer confirmação prática.
Por hoje é tudo. Abram as janelas. Podem sair.

José Fanha

5 comentários:

Rita Carrapato disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Rita Carrapato disse...

É mesmo assim como diz o Fanha., embora grande parte dos dias da minha vida de ex-professora, não tenha conseguido abrir as janelas, derrubar burocracias e muros e soltar as asas tanto quanto eu queria. Sempre que o fazíamos (eu e alunos) o voo era lindo. Grande parte das vezes voei com as guias cortadas, o que tornava o voo menos bonito, mas mesmo assim valeu a pena voar.
Para aqueles que ainda não experimentaram soltar as asas deixo também um abraço e, se me permite, um recado. Aproveitem a pouca liberdade que ainda têm de serem senhores da vossa sala de aula, das vossas metodologias, das vossas estratégias e acreditem que se o fizerem conseguirão apagar alguns cinzentos que teimam em toldar esta coisa tão bonita que é ensinar e aprender.
Para si Fanha, um beijinho grande pela força aqui deixada e pela força que deixou nos meus dias de professora.
Obrigada pelo poema que ainda me tocou como se professora ainda fosse.

Rita Carrapato

Caçadora de Emoções disse...

Quando dei aulas também usei as minhas asas, e voei com os meus alunos... Sinto a falta desses curtos voos, dessa troca de experiências e aprendizagens. Do que dei, e sobretudo, recebi.
Este poema conquistou-me, definitivamente. De tal forma que, há algum tempo, fiz um "Post"com ele no meu Blog.

Beijo grande,

Maria disse...

Belo o texto introdutório do poema.
E como me apetece publicar um poema teu, vou levar este mesmo...

Um beijo

Vera disse...

José Fanha, infelizmente, hoje em dia, por razões várias e que não discutirei aqui, os Professores não voam nem ensinam a voar. Cumprem...uns bem, outros mal, outros...cumprem.
É triste. principalmente porque quando as Escolas são pequenas, potenciadoras de trabalho interessante, só se veem caras desanimadas, tristes, enfadadas.
Ninguém anda a voar...