Ler é um grande mergulho no mar sem fundo do pensamento, dos afectos, das emoções.
Ler leva-nos para além das circunstâncias. Na leitura nós encontramo-nos connosco próprios. Experimentamo-nos. Questionamo-nos. E conhecemos o outro. Os outros. E experimentamos o espaço e o tempo da diferença. E crescemos nesse fantástico universo das palavras.
Ler é uma aventura que está muito para além do espartilhamento em que os textos são submetidos em nome da necessidade de cumprir os programas por quem não sabe cumprir senão a casca do programa e fica muito aquém do fundamental.
A propósito, algumas palavras do professor e psicanalista Pierre Bayard que tem uma extensa bibliografia sobre a leitura e é, nomeadamente, autor do ensaio notável "Como falar dos livros que não lemos?"
“Existe um exercício catastrófico que consiste em resumir o livro de maneira muito precisa e responder de forma também muito precisa a questões como: qual é o nome e o apelido de todos os personagens, qual é a cidade onde vive o herói, etc. Para muitos este procedimento pode poarecer como uma espécie de registo científico, mas o verdadeiro leitor não funciona desta maneira.”
Pierre Bayard. Magazine Littéraire, Junho 2009
Esta citação faz parte de uma extraordinária conversa tida em público por Pierre Bayard e Umberto Eco em Nova York. A conversa integral pode ser vista em:
http://fora.tv/2007/11/17/Bayard_and_Eco_How_to_Talk_About_Books_You_Havent_Read
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2 comentários:
Na leitura escolar, a tendência predominante é a da leitura centrípeta, ou seja, a da centralidade do texto. A curta margem dada ao leitor sofre uma reconversão didáctica, através da sua ocupação predominante pelo professor (submetido a orientações programáticas) em interacção assimétrica com o aluno. A leitura escolar, quando a não impede totalmente, minimiza drasticamente a hipótese do aluno como leitor genuíno, como cúmplice do mistério. A leitura escolar reduz o aluno-leitor à condição de espectador participante da condução de uma leitura determinada pelo texto e pela sua circunstância didáctica. Este marcado desequilíbrio de autoridade entre o texto e o aluno-leitor, produzido pela didactização da leitura, provoca um efeito de desertificação: ninguém é ali um leitor genuíno. Professor e aluno formam uma dupla de emissor/receptor de uma leitura encomendada por finalidades utilitárias de índole escolar, inscritas em programas e outros textos orientadores e em instrumentos de avaliação. A leitura genuína sai de cena, expulsa em prol do seu sucedâneo didáctico: uma leitura de serventia.
Não se trata, no entanto, de uma situação cuja virtualidade resolutiva (assente num juízo sancionador quer da opção pela leitura didactizada quer da opção pela leitura genuína) se afigure fácil. Trata-se de uma situação claramente dilemática que necessita da intervenção de um factor capaz de a transcender em resolução positiva: nem a identidade escolar deve sofrer o detrimento da educação, produzido pela total aceitação da leitura genuína do aluno, de tendência centrífuga em relação ao texto; nem a educação do leitor se faz sem a criação de formas de cumplicidade do aluno com os textos. Os professores constroem cenas de leitura tecnicamente muito apuradas, promovem dispositivos oleados para que neles os alunos engrenem como leitores mas, não assumindo e libertando a sua cultura e o seu imaginário de leitores, não promovendo o contágio entre o imaginário do professor-leitor e do aluno leitor, retiram-lhes a possibilidade de, na escola, assumirem o papel fundamental de serem as pessoas, os sujeitos da leitura.
Ler é uma forma de escrever
surpreendente
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