terça-feira, 31 de março de 2009

TERTÚLIA SINTRENSE



Por iniciativa do Prof. Fernando Seara tenho organizado as sessões da TERTÚLIA SINTRENSE que, em jantares mensais, tem percorrido alguns dos principais restaurantes de Sintra.

Em cada sessão há um convidado para conversar sobre tudo e mais alguma coisa. Já pudemos contar com belíssimos serões à conversa com o dr. Laborinho Lúcio, a actriz Maria do Céu Guerra, o jornalista Nicolau Santos, o cantor Carlos Mendes. O último foi o escritor Mário Zambujal no restaurante "Adega Regional".

O próximo jantar será no dia 20 de Abril no restaurante "Tacho Real". O convidado é o Rúben Carvalho.

O custo do jantar ronda entre 15 e 20 €. As inscrições podem se feitas para o mail: martacastelobranco@gmail.com

segunda-feira, 30 de março de 2009

QUINTA DA BOAVISTA - MELEÇAS

Sábado passado, o Centro Social da Quinta da Boavista em Meleças fez 34 anos.

Nas paredes da sala dos 5 anos dei com estas respostas a uma pergunta que não sei qual é mas facilmente sou capaz de adivinhar. As crianças dão provas, por vezes, de uma imensa sabedoria. Ora vejam lá:


"NAS HISTÓRIAS, AS PALAVRAS VÃO A DIREITO"

David

"OS POEMAS PARECE QUE ESTÃO EM PÉ"

Rúben

"OS POEMAS ESTÃO DO LADO ESQUERDO E AS PALAVRAS DAS HISTÓRIAS ESTÃO EM BAIXO DOS DESENHOS"

Diogo

"OS POEMAS FALAM DE AMOR"

David

domingo, 29 de março de 2009

RELATO ECOLOGICAMENTE INCORRETO




Da minha querida amiga Licínia Quitério recebi o seguinte relato que merece ser transcrito pela sua altíssima índole desarrumadora de banalidades aceites pelo vulgo e mesmo por algum in-vulgo.



Relato ecologicamente incorrecto:

Já podes acender a luz. O apagão já lá vai. A minha vizinha da frente cumpriu o apagão e, quando se levantou para ir à janela ver o que deixaria de ter sido visível, esbarrou com uma perna numa cadeira, deu um grito que assustou a bichana que por sua vez deu um miado horrível e trepou para o psiché, derrubando aquele espelhinho de moldura de prata com amores perfeitos que se fez em cacos. Tal foi a aflição que a senhora conseguiu finalmente chegar à janela e gritar. Salvem o planeta, mas, para a próxima, façam o apagão em pleno dia. Ainda hoje anda bastante nervosa. E a canela (da perna) tem cá um hematoma da cor da noite escura.

Eu estou bem. Passei o apagão a gastar energia para assistir, pela televisão, ao desaparecimento dos maiores monumentos do mundo. Foi emocionante. Vou tentar um efeito semelhante com o Photoshop.


Bom Domingo e até ao próximo movimento apagacional.

Beijinhos.

Licínia


O blog da Licínia é http://sitiopoema.blogspot.com/

A imagem vem de lá.

SER OU NÃO SER BRUXA




APORTA

Início do Capítulo 10:

"Um dia, a minha mãe ficou muito surpreendida quando reparou que a Bruxonauta estava há que tempos encostada à ombreira da porta, tristonha, cabisbaixa, a suspirar.

- Ó menina Bruxonauta, nunca a vi assim... O que é que tem?

- Estou triste... Muito triste...

- Se calhar precisa de chorar... - disse o meu pai que só queria ajudar mas parece que ainda pôs tudo pior.

- Não me falem em chorar senão eu choro!

A bruxonauta nem parecia a mesma. A minha mãe sentou-a no sofá e até a despenteou um bocadinho o cabelo a ver se a animava. Mas qual quê!

- Vá lá. Desabafe. O que é que a pôs assim?

De dentes cerrados e olhos postos no chão, lá se resolveu a explicar-se.

- Estou farta de ser bruxa!

- Essa agora! Quem havia de imaginar? A menina, que é a bruxa mais simpática que eu conheço - exclamou o meu pai como se conhecesse mais alguma.

- Mas eu não quero ser Bruxa. A minha avó foi bruxa, a minha mãe também, mas eu não quero!. Não quero! Já disse!

A minha mãe olhou-a como se através dela pudesse ver o mundo inteiro.

- Cada um tem o seu destino. Contra isso não podemos fazer nada...

O meu pai deitou o rabo do olho para a vassoura electrónica da Bruonauta cheio de vontade de dar uma voltinha.

- É assim tão mau ser bruxa?

- É horroroso! O qu eu queria era ser astronauta. - os olhos até lhe brilharam - ser astronauta, isso é que é vida!"

quarta-feira, 25 de março de 2009

MONTES DE ALVOR



Com os meninos e a professora Ana Duarte na Biblioteca escolar da EB1 de Montes de Alvor.

É verdadeiramente excepcional o trabalho de promoção da leitura que alguns professores estão a fazer nas Bibliotecas Escolares.

É igualmente excepcional o apoio que algumas Bibliotecas Municipais dão a este esforço.

Neste caso é a Biblioteca de Portimão que, como tantas outras queridas bibliotecas, trabalha intensa e alegremente para um futuro que tem de passar pela leitura e por tudo o que a leitura nos traz: capacidade de nos conhecermos melhor a nós próprios, de conhecermos e dialogarmos melhor com a diversidade do mundo, de nos tornarmos melhores cidadãos.

domingo, 22 de março de 2009

PINGA O PINGO


PINGA O PINGO

Pinga o pingo da torneira
Pinga pinga
Pinga o pingo
Que amanhã já é domingo
E depois segunda feira
Pinga o pingo da torneira
na banheira
terça feira
quarta feira
Pinga de toda a maneira
quinta feira
sexta feira
Falta pouco p’ra domingo
Pinga o pingo
Pinga pinga
Pinga o pingo da torneira.

José Fanha

(do livro a sair em breve "CANTIGAS E CANTIGOS PARA FORMIGAS E FORMIGOS")

sábado, 21 de março de 2009

POESIA Á MESA



A "POESIA À MESA" é uma bela organização da Câmara Municipal de S. João da Madeira. Ocupa todos os anos a semana do Dia Mundial da Poesia. Leva poesia à escola, aos restaurantes e, na sexta-feira de cada uma destas sextas-feiras, aos bares nocturnos.

É uma festa bonita e calorosa.

Aqyui ficam algumas imagens desta festa nos últimos anos.

quarta-feira, 18 de março de 2009

Outra vez "A PORTA"



E cá está de novo, 19 anos depois, "A porta".

É uma nova roupa que a veste mas releio e continuo a achar que é o melhor texto que fiz na minha vida.

As ilustrações e grafismo são da Mónica Cid que fez do livro um objecto caloroso que apetece ter na mão.

Deve estar à venda no início de Abril.

Para lá daquela porta, os pais do narrador virão a descobrir um mundo estranho, talvez mágico, talvez diferente do nosso. A pouco e pouco vão conhecendo os vizinhos que vivem do outro lado da porta. São pessoas muito invulgares.

O Grande Espinafre que tem uma horta onde pode plantar tudo, parafusos, macarrão, peixe cozido ou mesmo cenouras.

O engenheiro Francisco Parafuso que tem horror a que as coisas mudem de lugar e procura aparafusar tudo ao tecto, ao chão, às paredes para que nada mude. Chega mesmo a aparafusar os ponteiros ao relógio e os sapatos do pai do narrador ao chão.

Há também a Princesa Princezinha, que vive no mundo dos sonhos e das fábulas, e que sonha, naturalmenmte vir a casar com um Príncipe Encantado quando tiver coragem de atravessar o Bosque de Todos os Medos.

Finalmente temos a Bruxonauta, bruxa falhada que sonha vir a ser astronauta.

segunda-feira, 16 de março de 2009

LA PORTA



Logo a seguir à edição portuguesa em 1990 de "A PORTA", o meu grande amigo e poeta napolitano Vittorio Placella traduziu-a para italiano. E "LA PORTA" saiu em itália na editora Adriano Salami de Florença com delicadíssimas ilustrações de Simonetta Funel.

E recordo o momento em que o menino relata a chegada dos pais à casa nova... Que de casa só tinha a Porta...

"- Aqui não há casa nenhuma! - insistiu a minha mãe.

- Mas há uma porta! - afirmou o meu pai, atravessando-a cheio de simpatia de um lado para o outro- - Se não houvesse, não podíamos entrar nem sair.

Parece-me que ele tinha razão, embora não se percebesse muito bem para que é que servia uma porta que dava para sítio nenhum.

Talvez fosse divertido entrar e sair e sair e entrar por uma porta tão invulgar e sozinha no meio de nada.

Isso era quanto lhe bastava. À minha mãe, não. Sentia-se perdida e ficou, de repente, muito triste.

O meu pai não a podia ver assim.

- Uma porta é um bom começo. O resto arranja-se com facilidade."

domingo, 15 de março de 2009

OS VOSSOS FILHOS NÃO SÃO TOSTÕES

Leio no Público de hoje:

"O Presidente da CONFAP, órgão supostamente representativo das associações de pais e, por essa via, dos pais portugueses, continua igual a si mesmo. Ontem reivindicou escolas abertas 12 horas por dia. Não como escolas, mas como depósitos de filhos. A ministra da Educação ouviu e gostou. E o ministério vai por certo continuar a subsidiar de forma generosa este tão fiel apoiante."




Não há palavras para o delírio palrante a que algumas pessoas chegam. Quem anda no ensino sabe bem de mais o que isto representa de infâmia e incremento à degradação da instituição escolar, da família, da educação dos nossos filhos.

Não pára a hipoteca que está a ser feita ao futuro destes jovens como pessoas e como cidadãos.

Os ingleses diriam: SHAME ON YOU!

Eu, em português, usaria certamente uma expressão muito mais pesada. Mas como sou um homem da poesia sei que podemos sempre em poesia encontrar o voo de algum poeta que se aplique à situação.

Lembrei-me do O'Neill e do seu poema "Deixa", publicado no início dos anos 50 (no tempo do fascismo, não sei se recordam...).

"PAIS

que fazeis?

OS VOSSOS FILHOS

não são tostões

GASTAI-OS DEPRESSA!"

sábado, 14 de março de 2009

A PORTA



As perguntas dos meninos nas escolas que visito repetem-se com muita frequência. Serão talvez o óbvio que faz os meninos perguntarem:

"Quando começou a escrever?", "Qual foi o primeiro livro que escreveu?", "Quantos livros já escreveu?", "Em que sítio gosta de escrever?", "Onde é que vai buscar inspiração?"

Devo confessar que fico por vezes um pouco cansado da monotonia que julgo resultar também de alguma falta de reflexão por parte dos professores que preparam estas perguntas com os meninos quend vão ser isitados por um escritor.

Já arranjei algumas respostas preparadas que me permitem fugir a esse rame-rame desinteressante e voar noutras direcções. Porque todos os caminhos vão dar a Roma e todas as perguntas permitem uma variedade muito grande de respostas. Aprendi á minha custa que, mesmo que as perguntas possam possam ser muito desmotivantes, as respostas é que não têm o direito de o ser.

Sempre que me perguntam: "Qual o livro que mais gostou de escrever?", eu respondo sempre que foi "A Porta". E leio duas ou três páginas deste livrinho que foi e continua a ser aquele que mais prazer me deu escrever al longo dos anos que levo de escritor.

"A Porta" foi escrita há 20 anos em circunstâncias muito particulares da minha vida pessoal. Um tempo em que não tinha uma casa e em que a minha casa foi a escrita deste livro.

"A Porta" é narrada por um menino que fala do dia em que o pai e a Mãe se mudaram para a casa nova e quando lá chegaram não havia paredes, nem tecto, nem casa. Apenas uma porta.

O livro foi editado pela Quetzal através do empenho e da ternura da Maria da Piedade Ferreira. As ilustrações, brilhantes, eram do meu amigo José Paulo Ferro, o livro era um mimo, um luxo, uma beleza. Está esgotado há alguns anos. Mas vai voltar!

terça-feira, 10 de março de 2009

QUÊ DE CÃO



(Desenho de um menino do Jardim de Infância do Alvor)


QUÊ DE CÃO


Atenção muita atenção
É preciso ter cuidado com o cão!

Ter cuidado com o quê com o quê com o quê?
Ter cuidado
com o quê
de cão!

É preciso ter cuidado
com a corda com o cardo
com a queda e com o calo
o costado do camelo
o cabrito e o cavalo
a quina do cotovelo
a cabeça a cabeçada
o cachucho a caldeirada
o caldinho o caldeirão

Atenção muita atenção
É preciso ter cuidado com o cão!

Ter cuidado com o quê com o quê com o quê?
Ter cuidado
com o quê
de cão!

É preciso ter cuidado
com o quê e com o cê
com o dê de dromedário
quem te viu e quem te vê
escreve lá este sumário
com a causa e o porquê
o motivo e a razão
deste cão ter o seu quê
à boca do coração.

Atenção muita atenção
É preciso ter cuidado com o cão!

Ter cuidado com o quê com o quê com o quê?
Ter cuidado
com o quê
de cão!

(Do livro no prelo: "CANTIGAS E CANTIGOS PARA FORMIGAS E FORMIGOS")

domingo, 8 de março de 2009

RECEITA DE MULHER




A fotografia roubei-a ao blog: http://leonorcordeiro.blogspot.com/

Juntei-lhe o poema para rememorar um grande poeta que trouxe sempre a poesia à Praça Pública. E vem a propósito da data esta...


Receita de mulher


As muito feias que me perdoem
Mas beleza é fundamental. É preciso
Que haja qualquer coisa de dança, qualquer coisa de haute couture
Em tudo isso (ou então
Que a mulher se socialize elegantemente em azul, como na República [Popular Chinesa).
Não há meio-termo possível. É preciso
Qu tudo isso seja belo. É preciso que súbito
Tenha-se a impressão de ver uma garça apenas pousada e que um rosto
Adquira de vez em quando essa cor só encontrável no terceiro minuto da [aurora.
É preciso que tudo isso seja sem ser, mas que se reflita e desabroche
No olhar dos homens. É preciso, é absolutamente preciso
Que tudo seja belo e inesperado. É preciso que umas pálpebras cerradas
Lembrem um verso de Eluard e que se acaricie nuns braços
Alguma coisa além da carne: que se os toque
Como ao âmbar de uma tarde. Ah, deixai-e dizer-vos
Que é preciso que a mulher que ali está como a corola ante o pássaro
Seja bela ou tenha pelo menos um rosto que lembre um templo e
Seja leve como um resto de nuvem: mas que seja uma nuvem
Com olhos e nádegas. Nádegas é importantíssimo. Olhos, então
Nem se fala, que olhem com certa maldade inocente. Uma boca
Fresca (nunca úmida!) e também de extrema pertinência.
É preciso que as extremidades sejam magras; que uns ossos
Despontem, sobretudo a rótula no cruzar das pernas, e as pontas pélvicas
No enlaçar de uma cintura semovente.
Gravíssimo é, porém, o problema das saboneteiras: uma mulher sem [saboneteiras
É como um rio sem pontes. Indispensável
Que haja uma hipótese de barriguinha, e em seguida
A mulher se alteie em cálice, e que seus seios
Sejam uma expressão greco-romana, mais que gótica ou barroca
E possam iluminar o escuro com uma capacidade mínima de 5 velas.
Sobremodo pertinaz é estarem a caveira e a coluna vertebral
Levemente à mostra; e que exista um grande latifúndio dorsal!
Os membros que terminem como hastes, mas bem haja um certo volume de [coxas
E que elas sejam lisas, lisas como a pétala e cobertas de suavíssima [penugem
No entanto, sensível à carícia em sentido contrário.
É aconselhável na axila uma doce relva com aroma próprio
Apenas sensível (um mínimo de produtos farmacêuticos!)
Preferíveis sem dúvida os pescoços longos
De forma que a cabeça dê por vezes a impressão
De nada ter a ver com o corpo, e a mulher não lembre
Flores sem mistério. Pés e mãos devem conter elementos góticos
Discretos. A pele deve ser fresca nas mãos, nos braços, no dorso e na face
Mas que as concavidades e reentrâncias tenham uma temperatura nunca [inferior
A 37° centígrados podendo eventualmente provocar queimaduras
Do 1° grau. Os olhos, que sejam de preferência grandes
E de rotação pelo menos tão lenta quanto a da Terra; e
Que se coloquem sempre para lá de um invisível muro da paixão
Que é preciso ultrapassar. Que a mulher seja em princípio alta
Ou, caso baixa, que tenha a atitude mental dos altos píncaros.
Ah, que a mulher dê sempre a impressão de que, se se fechar os olhos
Ao abri-los ela não mais estará presente
Com seu sorriso e suas tramas. Que ela surja, não venha; parta, não vá
E que possua uma certa capacidade de emudecer subitamente e nos fazer [beber
O fel da dúvida. Oh, sobretudo
Que ele não perca nunca, não importa em que mundo
Não importa em que circunstâncias, a sua infinita volubilidade
De pássaro; e que acariciada no fundo de si mesma
Transforme-se em fera sem perder sua graça de ave; e que exale sempre
O impossível perfume; e destile sempre
O embriagante mel; e cante sempre o inaudível canto
Da sua combustão; e não deixe de ser nunca a eterna dançarina
Do efêmero; e em sua incalculável imperfeição
Constitua a coisa mais bela e mais perfeita de toda a criação inumerável.

quarta-feira, 4 de março de 2009

BOXE E LARANJAS



Na sua juventude de estudante de Belas Artes, o Rolando Sá Nogueira teve a tentação do boxe, desporto muito popular pelos anos 40, e foi praticar num famoso clube de então, o Mouraria.

Ao fim de algum tempo de treinos foi-lhe marcado o primeiro combate, julgo que no Coliseu.

Os colegas de Belas Artes estavam entusiasmadíssimos tanto mais que o Rolando era muito alto e tinha aquilo que se chama um belo caparro.

João Abel Manta (outro grande Mestre tão esquecido)era e foi durante toda a vida um grande ou mesmo o maior amigo de Rolando Sá Nogueira. Foi ele ue me contou esta história.

João Abel não pôde ir assitir ao combate do amigo na noite anterior, mas na manhã seguinte estava de pedra e cal à porta das Belas Artes à espera do, esperava ele, vitorioso amigo Sá Nogueira.

Quando Rolando Sá Nogueira apareceu à esquina, vinha cabisbaixo, macambúzio, pouco glorioso.

- Então, pá, ganhaste? - perguntou-lhe João Abel.

- Não... Perdi...

- Perdeste? Porquê? O adversário era um grande calmeirão?

- Não... O gajo era muito pequenino... Eu é que não fui capaz de bater num tipo daquele tamanho.

Assim terminou a aventura do Rolando como boxeur. A sua obra, essa permanece, por exemplo, nos azulejos da estação de Metro das Laranjeiras.

As suas laranjas são tão doces como era envergonhadamente irónico o riso com que tornava todas as desgraças relativas.


segunda-feira, 2 de março de 2009

ROLANDO SÁ NOGUEIRA



Já aqui falei várias vezes do Rolando Sá Nogueira.

Mas insisto.

Foi o grande professor da minha vida. Como professor eu gostava de ser como ele. Um homem que não ensinava. Ajudava a aprender. A voar. Um homem que vivia atento às coisas importantes da vida: uma folha de erva, o desenho das pedrinhas na calçada, a curva de uma gaivota no céu, as rugas de um velho num portal, o olhar de uma prostituta, o ridículo dos homens importantes nas suas poses para a fotografia.

Saí em 68 do Colégio Militar com destino ao curso de Arquitectura na escola Superior de Belas Artes. Na admissão havia um exame obrigatório em que chumbei redondamente. Coisa que nunca tinha visto, nem praticado, nem desconfiado: Desenho de Estátua.

Chumbar nessa cadeira implicava um ano de espera para voltar a tentar entrar.

Fiquei com um ano vazio pela frente. E afinal não foi nada vazio. Terá sido mesmo o ano mais importante da minha vida.

68/69. Lá fora o mundo abanava, fervia, cantava, gritava, protestava, erguia barricadas. E aqui em Portugal o ar tornava-se irespirável.

Eu tinha 17 anos. O sangue a ferver nas veias. E sabia tão pouco...

Fui para a um curso de Formação Artística na Sociedade Nacional de Belas Artes. Frequentei então uma quantidade enorme de cadeiras, seminários, conferências. Imagine-se ter aulas com José Augusto França, Rui Mário Gonçalves, Ernesto de Sousa, António Sena, Manuel Tainha, Fernando Conduto e outros.

Mas o professor dos professores era o Rolando. Todas as manhãs, três horas. Um luxo.

Não tinha receitas. Seguia um programa inglês de abordagem às Artes Visuais. Mas fazia permanentes desvios ao sabor das circunstâncias da vida. Estava profundamente ligado ao mundo, interessado pelo que se passava à sua volta, apaixonado por tudo o que o mundo lhe trazia às mãos, revoltado pela humilhação a que os homens deste país eram permentemente sujeitos.

Era um professor. Mais que um professor. Um Mestre. Há outros assim. São inavaliáveis, inclassificáveis. Ajudam-nos a crescer até às estrelas.