domingo, 31 de agosto de 2008
JOSÉ CARLOS ARY DOS SANTOS (1937 - 1984)
José Carlos Ary dos Santos
Esive ao lado dele em muitas ocasiões. Em convívios universitários antes do 25 de Abeil, em muitas sessões e comemorações pelo país em tempos de revolução e pós-revolução.
Devo-lhe palavras muito caras de estímulo e amizade.
Como toda a gente fui tocado pelas suas boutades de enfant terrible, mas também pela força da sua presença e pela música dos seus versos.
Terei sempre um cravo junto à memória comovida que guardo do homem, do amigo e do poeta.
OS CÃES DA INFÂNCIA
São os cães da infância os cães dementes
ladrando-me às canelas do passado
cães mordendo-me a vida com os dentes
ferrados no meu sexo atormentado.
Paguei cada minuto do presente
com vergões de amor próprio vergastado
porém só fala quem se não consente
vencido temeroso ou amarrado.
Contra os cães uivo. Não me fico assim.
Não tenho pai nem mãe. Nasci de mim
macho e fêmea gerando o desespero.
Lutar é tudo quanto sou capaz.
Não me pari para viver em paz.
Tudo o que sou é menos do que eu quero.
José Carlos Ary dos Santos
ladrando-me às canelas do passado
cães mordendo-me a vida com os dentes
ferrados no meu sexo atormentado.
Paguei cada minuto do presente
com vergões de amor próprio vergastado
porém só fala quem se não consente
vencido temeroso ou amarrado.
Contra os cães uivo. Não me fico assim.
Não tenho pai nem mãe. Nasci de mim
macho e fêmea gerando o desespero.
Lutar é tudo quanto sou capaz.
Não me pari para viver em paz.
Tudo o que sou é menos do que eu quero.
José Carlos Ary dos Santos
A POESIA PORTUGUESA DO SÉC. XX
A Poesia portuguesa do séc. XX tem uma riqueza e uma variedade impressionantes. A quantidade de grandes poetas é extraordinária. Basta lembrar os primeiríssimos, Pessoa, Pascoaes, Florbela, Régio, Gedeão, Torga, Nemésio, Sena, Sophia, Eugénio, Natália, David, O´Neill, Cesariny, Herberto, Pedro Tamen, Ruy Belo, Fiama, Fernando Assis Pacheco, Manuel Alegre, LUísa Neto Jorge, Vasco Graça Moura… Podia ainda juntar Sá-Carneiro, Almada Negreiros, José Gomes Ferreira, Botto, Ruy Cinatti, Manuel da Fonseca, Natércia Freire, Reinaldo Ferreira, Sebastião da Gama,António Maria Lisboa, Ana Hatterly, Teresa Horta, Fernando Assis Pacheco, Gastão Cruz, Armando Silva Carvalho, Manuel Aberto Pina, Nuno Júdice, Joaquim Pessoa, Al Berto.
Publiquei aqui 36 poetas pouco conhecidos e pouco visitados mesmo pelos que gostam de poesia. Com uma excepção (Manuel Cintra) fiquei pelos que nasceram na primeira metade do século (ou ainda em finais do século XIX). Poderia acrescentar mais uns 20 ou 30. Fora os mais novos, nascidos na segunda metade do séc. XX.
Alguns desses poetas terão escrito um poema deslumbrante e só por isso merecem a nossa admiração. Outros só publicaram um livro. Uns passaram pela vida brevemente ou em bicos de pés e a sua obra é póstuma. Outros tiveram muito sucesso num tempo e num determinado meio e depois foram completamente esquecidos.
Infelizmente não temos publicações de poesia que divulguem esta riqueza da nossa cultura. Infelizmente também já desapareceram aqueles que eram leitores especialmente apaixonados por poesia e que faziam da sua arte de ler uma luz que nos iluminava e ajudava a separar o trigo do joio. Estou a falar de João Gaspar Simões, David Mourão-Ferreira, Eugénio Lisboa (que ainda temos o prazer de ler de vez em quando) e poucos mais.
Fiquei muito satisfeito por ter aberto estas portas a quem por elas soube entrar. Agradeço do fundo do coração aos que, com os seus posts, fizeram com que uma ideia de trazer à baila meia dúzia de poetas pouco conhecidos, acabasse por me levar à quase obrigação de fazer um trabalho mais extenso.
Um blog é, ou pode ser, um espaço de convívio e partilha e só faz sentido pela convergência de vozes, às vezes mínimas, mas sempre generosas e amigas.
Agradeço profundamente aos posts (falharei muitos muitos nomes por certo) Licínia, Júlio Pego, Paulinha Caçadora de Emoções, Margarida Graça, Samuel, Rita Carrapato, Maria, Mariam, Eufrázio Filipe, Lena, Tiago Carvalho… Tantos mais.
Termino esta série com aquele que é o mais amado dos poetas fora de moda. O mais popular, o mais cantado, declamado e copiado de todos: o José Carlos Ary dos Santos. E se digo que ele foi e é um poeta fora de moda, quero falar das modas literárias, das “bem pensâncias”, daqueles que julgam que a poesia se suja quando desce à rua, que me menoriza quando assume causas, que se banaliza quando quer oferecer a sua música e as suas palavras àqueles que mais precisam delas.
Mas também quero dizer que o justificado amor de muitas pessoas pelo mais fácil e público do trabalho poético do Zé Carlos, acabou por deixar na obscuridade a sua poesia mais pessoal, mais torturada e, muitas vezes, mais elaborada. É essa poesia que quero lembrar aqui e deixar sinal de uma grande saudade por um homem cuja arte e coragem fazem muita falta a todos nós e à literatura portuguesa.
Publiquei aqui 36 poetas pouco conhecidos e pouco visitados mesmo pelos que gostam de poesia. Com uma excepção (Manuel Cintra) fiquei pelos que nasceram na primeira metade do século (ou ainda em finais do século XIX). Poderia acrescentar mais uns 20 ou 30. Fora os mais novos, nascidos na segunda metade do séc. XX.
Alguns desses poetas terão escrito um poema deslumbrante e só por isso merecem a nossa admiração. Outros só publicaram um livro. Uns passaram pela vida brevemente ou em bicos de pés e a sua obra é póstuma. Outros tiveram muito sucesso num tempo e num determinado meio e depois foram completamente esquecidos.
Infelizmente não temos publicações de poesia que divulguem esta riqueza da nossa cultura. Infelizmente também já desapareceram aqueles que eram leitores especialmente apaixonados por poesia e que faziam da sua arte de ler uma luz que nos iluminava e ajudava a separar o trigo do joio. Estou a falar de João Gaspar Simões, David Mourão-Ferreira, Eugénio Lisboa (que ainda temos o prazer de ler de vez em quando) e poucos mais.
Fiquei muito satisfeito por ter aberto estas portas a quem por elas soube entrar. Agradeço do fundo do coração aos que, com os seus posts, fizeram com que uma ideia de trazer à baila meia dúzia de poetas pouco conhecidos, acabasse por me levar à quase obrigação de fazer um trabalho mais extenso.
Um blog é, ou pode ser, um espaço de convívio e partilha e só faz sentido pela convergência de vozes, às vezes mínimas, mas sempre generosas e amigas.
Agradeço profundamente aos posts (falharei muitos muitos nomes por certo) Licínia, Júlio Pego, Paulinha Caçadora de Emoções, Margarida Graça, Samuel, Rita Carrapato, Maria, Mariam, Eufrázio Filipe, Lena, Tiago Carvalho… Tantos mais.
Termino esta série com aquele que é o mais amado dos poetas fora de moda. O mais popular, o mais cantado, declamado e copiado de todos: o José Carlos Ary dos Santos. E se digo que ele foi e é um poeta fora de moda, quero falar das modas literárias, das “bem pensâncias”, daqueles que julgam que a poesia se suja quando desce à rua, que me menoriza quando assume causas, que se banaliza quando quer oferecer a sua música e as suas palavras àqueles que mais precisam delas.
Mas também quero dizer que o justificado amor de muitas pessoas pelo mais fácil e público do trabalho poético do Zé Carlos, acabou por deixar na obscuridade a sua poesia mais pessoal, mais torturada e, muitas vezes, mais elaborada. É essa poesia que quero lembrar aqui e deixar sinal de uma grande saudade por um homem cuja arte e coragem fazem muita falta a todos nós e à literatura portuguesa.
quarta-feira, 27 de agosto de 2008
MARIA JUDITE DE CARVALHO (1921-1988)
As portas que batem
As portas que batem
nas casas que esperam.
Os olhos que passam
sem verem quem está.
O talvez um dia
Aos que desesperam.
O seguir em frente.
O não se me dá.
O fechar os olhos
a quem nos olhou.
O não querer ouvir
quem nos quer dizer.
O não reparar
que nada ficou.
Seguir sempre em frente
E nem perceber.
Maria Judite de Carvalho
nas casas que esperam.
Os olhos que passam
sem verem quem está.
O talvez um dia
Aos que desesperam.
O seguir em frente.
O não se me dá.
O fechar os olhos
a quem nos olhou.
O não querer ouvir
quem nos quer dizer.
O não reparar
que nada ficou.
Seguir sempre em frente
E nem perceber.
Maria Judite de Carvalho
segunda-feira, 25 de agosto de 2008
POLÍBIO GOMES DOS SANTOS (1911-1939)
VITORINO NEMÉSIO - À MEMÓRIA DE POLÍBIO GOMES DOS SANTOS
O poeta que morreu entrou agora,
Não se sabe bem onde, mas entrou,
Todo coberto de demora,
No bocado de noite em que ficou.
As ervas lhe desenham
Seu espaço devido:
Depressa, venham
Lê-lo no chão os que o não tinham lido
Que o sorriso que o veste
Já galga como um potro
As coisas tenebrosas,
E esquecido – só outro:
Este
Nem precisa de rosas.
Vitorino Nemésio
Não se sabe bem onde, mas entrou,
Todo coberto de demora,
No bocado de noite em que ficou.
As ervas lhe desenham
Seu espaço devido:
Depressa, venham
Lê-lo no chão os que o não tinham lido
Que o sorriso que o veste
Já galga como um potro
As coisas tenebrosas,
E esquecido – só outro:
Este
Nem precisa de rosas.
Vitorino Nemésio
POEMA DA VOZ QUE ESCUTA
Chamam-me lá em baixo.
São as coisas que não puderam decorar-me:
As que ficaram a mirar-me longamente
E não acreditaram;
As que sem coração, no relâmpago do grito,
Não puderam colher-me.
Chamam-me lá em baixo,
Quase ao nível do mar, quase à beira do mar,
Onde a multidão formiga
Sem saber nadar.
Chamam-me lá em baixo
Onde tudo é vigoroso e opaco pelo dia adiante
E transparente e desgraçado e vil
Quando a noite vem, criança distraída,
Que debilmente apaga os traços brancos
Deste quadro negro – a Vida.
Chamam-me lá em baixo:
Voz de coisas, voz de luta.
É uma voz que estala e mansamente cala
E me escuta.
Políbio Gomes dos Santos
São as coisas que não puderam decorar-me:
As que ficaram a mirar-me longamente
E não acreditaram;
As que sem coração, no relâmpago do grito,
Não puderam colher-me.
Chamam-me lá em baixo,
Quase ao nível do mar, quase à beira do mar,
Onde a multidão formiga
Sem saber nadar.
Chamam-me lá em baixo
Onde tudo é vigoroso e opaco pelo dia adiante
E transparente e desgraçado e vil
Quando a noite vem, criança distraída,
Que debilmente apaga os traços brancos
Deste quadro negro – a Vida.
Chamam-me lá em baixo:
Voz de coisas, voz de luta.
É uma voz que estala e mansamente cala
E me escuta.
Políbio Gomes dos Santos
sábado, 23 de agosto de 2008
CABRAL DO NASCIMENTO (1897-1978)
CANÇÃO
O lenço com que me acena
Tudo o que está para trás,
É coisa já tão pequena
Que me faz chorar a pena
E rir de espanto me faz.
Vejo-o ao longe, a se perder,
A se apagar, a sumir,
Mas não sei, a bem-dizer,
Se ele é que vai a morrer,
Se eu é que vou a fugir.
E o lenço, com que a distância
Me diz adeus lá do seio
Do mar, rasga abismos de ânsia
Entre mim e a minha infância,
Sem deixar nada no meio.
Cabral do Nascimento
Tudo o que está para trás,
É coisa já tão pequena
Que me faz chorar a pena
E rir de espanto me faz.
Vejo-o ao longe, a se perder,
A se apagar, a sumir,
Mas não sei, a bem-dizer,
Se ele é que vai a morrer,
Se eu é que vou a fugir.
E o lenço, com que a distância
Me diz adeus lá do seio
Do mar, rasga abismos de ânsia
Entre mim e a minha infância,
Sem deixar nada no meio.
Cabral do Nascimento
quinta-feira, 21 de agosto de 2008
JOÃO APOLINÁRIO (1924-1988)
Joãio Apolinário
Nasceu em Belas. Poeta, advogado e jornalista.
Foi para a França como correspondente da Agência Logos onde viveu os terríveis últimos tempos da Segunda Guerra Mundial
De regresso a Portugal foi co-fundador do Teatro Experimental do Porto. Anti-fascista, preso, acaba por procurar o exílio no Brasil em 1963. Com a ditadura dos coroneis volta a ser perseguido no país de adopção.
Em Portugal é quase desconhecido embora alguns dos seus poemas tenham sido musicados pelo filho, o músico João Ricardo, fundador do grupo "Secos & Molhados" onde também começou a sua carreira Ney Matogrosso.
CARROCEL
O meu circo imaginário
com palhaços de papel
piruetas e brinquedos
viagens no carrocel
girando sempre ao contrário
quando dava corda nele
O meu circo imaginário
feito de pano e cordel
e mil pequenos segredos
(fantasias de papel)
ficando sempre ao contrário
do sonho que eu punha nele
O meu circo imaginário
e o meu belo corcel
cavalgando nos meus dedos
(fantasias de cordel)
sempre fazendo o contrário
daquilo que eu queria dele
O meu circo imaginário
meu brinquedo de papel
de magias e bruxedos
(fantasias de cordel)
da infância ao contrário
que vivi para sempre nele
João Apolinário
com palhaços de papel
piruetas e brinquedos
viagens no carrocel
girando sempre ao contrário
quando dava corda nele
O meu circo imaginário
feito de pano e cordel
e mil pequenos segredos
(fantasias de papel)
ficando sempre ao contrário
do sonho que eu punha nele
O meu circo imaginário
e o meu belo corcel
cavalgando nos meus dedos
(fantasias de cordel)
sempre fazendo o contrário
daquilo que eu queria dele
O meu circo imaginário
meu brinquedo de papel
de magias e bruxedos
(fantasias de cordel)
da infância ao contrário
que vivi para sempre nele
João Apolinário
segunda-feira, 18 de agosto de 2008
HENRIQUE RISQUES PEREIRA (1930)
Henrique Risques Pereira
Nasceu em Lisboa em 1930. Aproxima-se dos surrealistas e participa em 1949 nas suas actividades.
Desaparecido das actividades artísticas e literárias, fez-se há pouco uma exposição da sua obra plástica na Fundação Cupertino de Miranda e a edição de toda a sua obra poética sob o título de "Transparência do Tempo", organizada por Perfecto E. Cuadrado, especialista na história do surrealismo português.
É curioso como o carácter efémero que era atribuído à própria obra por muitos dos que circularam à volta do Movimento Surrealista Português nos traga, ao abrir dos baús, algumas belissímas surpresas como é o caso deste poeta.
PAI
com a saudade do teu filho
Pai do menino do triciclo ingénuo
Pai do menino doente
Pai amigo dos meus amigos
Pai avô
Pai conselho refúgio e amparo
Pai já não há sol amanhã
Pai que frio ficou neste mundo
Adeus Pai
para sempre
Pai ficou o céu mais vazio
nem uma nuvem nesta imensidão
Pai que frio
Henrique Risques Pereira
Pai do menino do triciclo ingénuo
Pai do menino doente
Pai amigo dos meus amigos
Pai avô
Pai conselho refúgio e amparo
Pai já não há sol amanhã
Pai que frio ficou neste mundo
Adeus Pai
para sempre
Pai ficou o céu mais vazio
nem uma nuvem nesta imensidão
Pai que frio
Henrique Risques Pereira
sábado, 9 de agosto de 2008
FERNANDO LEMOS (1926)
Fernando Lemos
“Fui estudante, serralheiro, marceneiro, estofador, impressor de litografia, desenhador, publicitário, professor, pintor, fotógrafo, tocador de gaita, emigrante, exilado, director de museu, assessor de ministros, pesquisador, jornalista, poeta, júri de concursos, conselheiro de pinacotecas, comissário de eventos internacionais, designer de feiras industriais, cenógrafo, pai de filhos, bolseiro, e tenho duas pátrias, uma que me fez e outra que ajudo a fazer. Como se vê, sou mais um português à procura de coisa melhor. “
Fernando Lemos nasceu em Lisboa, em 1926. Actualmente, reside em São Paulo, no Brasil. Frequentou a Escola de Artes Decorativas António Arroio e o curso livre da Sociedade Nacional de Belas-Artes.
Com um percurso profissional ligado às artes gráficas e à publicidade, Fernando Lemos circula por muitos territórios da arte ao longo do seu percurso. A sua obra multifacetada estende-se ao domínio da pintura, do desenho, da ilustração e à fotografia, campo que alcançou maior visibilidade pública nos últimos anos.
A ligação de Lemos à fotografia tem lugar na passagem da década de 40 para a de 50, no período em que desenvolve a sua actividade artística junto do Grupo Surrealista de Lisboa.
Em 1952, não obstante a qualidade do seu trabalho fotográfico, Fernando Lemos abandona a fotografia. No ano seguinte, emigra para o Brasil, tendo aí prosseguido a sua produção no domínio do design gráfico, do desenho e da pintura, e realizado diversas exposições individuais e colectivas.
A sua poesia iconoclasta e surrealizante dá notícia de uma admirável voz livre e encantadoramente selvagem.
HINO TRISTE SEM MELODIA
Uma tarde no Museu das Janelas Verdes
Lisboa 1975
Nós heróis do mar eis
nobre povo sempre as naus
na frente dos reis.
Primeiro a moldura depois
a pintura após o retrato
a epopeia depois do relato.
Às armas...Às armas...
Nuno Gonçalves primitivo
educado colectivo passaporte
nobre povo mas mísera sorte.
Onde pousaram às pressas
retornados não idos sentados
nos projectos
como se já fossem
esmaecidos abandonados.
Almada imortal plantel
Negreiros atrás da tábua
que no painel falta
para justificar a malta.
Levantai hoje de novo
todo o esplendor de Portugal
galinha após o ovo já que
primeiro Colombo depois
Cabral.
Azar mas...Azar mas...
pela pátria lutar.
Depois da casa roubada
as portas trancar.
Somar os séculos de Império
e Salazar pelos dedos 48 anos
detrito familiar.
Contar os trajectos
navegar navegar voltar
após vinhetas de sangue
fazer o mosteiro
capacho de choro milenar.
Chamar Nuno Gonçalves para pintar
Almada para reconstituir
murais para a nação destilar.
Quem vê caras não vê brasões
daí os retratos
e as condecorações.
É assim somos assim meu irmão
primeiro vítima depois
o Dom de Sebastião.
Para nós a Humanidade
é uma lotaria.
Fomos grandes por fora
colonos do riso sem alegria.
Primeiro a República
avental da Monarquia depois
maçónica a Ditadura
com selvajaria cheia de Peros
de Vazes de Escrivaninha.
Camões que precisou
naufragar para o original
dos Lusíadas na tormenta editar.
Nação sem dúvida valente e imortal
na emigrância per capita
fundamentar.
Azar mas...Azar mas...
unha por cunha coisa por loisa
casamento por procuração depois
por Brasil a noiva.
Fernando Pessoa que foi Ser
português voltou
para conferir a língua desolado
fiscal do produto viciado.
25 de Abril
apoteose de revista
todos os bons restantes
com os maus de antes
sem pontos de vista.
agora sem medo enredo
sem uma história prevista.
Agora o fado espanta
nosso retiro e desespero
talvez nos paguem a conta
ou só irónico o tempero.
Talvez se aprenda o ovo
depois da galinha depois do óbvio
da adivinha.
Levantai hoje de novo
o esplendor da galinha
o imortal povo
ovo pai da rainha.
Mas primeiro país depois
Portugal.
Pobreza em pó orgulho
pre-conceito generoso
e desfeito.
Viva meu irmão do coração
azar mas...às armas...
pela pátria lutar depois
sem mar
só com chão Recomeçar!
Fernando Lemos
Lisboa 1975
Nós heróis do mar eis
nobre povo sempre as naus
na frente dos reis.
Primeiro a moldura depois
a pintura após o retrato
a epopeia depois do relato.
Às armas...Às armas...
Nuno Gonçalves primitivo
educado colectivo passaporte
nobre povo mas mísera sorte.
Onde pousaram às pressas
retornados não idos sentados
nos projectos
como se já fossem
esmaecidos abandonados.
Almada imortal plantel
Negreiros atrás da tábua
que no painel falta
para justificar a malta.
Levantai hoje de novo
todo o esplendor de Portugal
galinha após o ovo já que
primeiro Colombo depois
Cabral.
Azar mas...Azar mas...
pela pátria lutar.
Depois da casa roubada
as portas trancar.
Somar os séculos de Império
e Salazar pelos dedos 48 anos
detrito familiar.
Contar os trajectos
navegar navegar voltar
após vinhetas de sangue
fazer o mosteiro
capacho de choro milenar.
Chamar Nuno Gonçalves para pintar
Almada para reconstituir
murais para a nação destilar.
Quem vê caras não vê brasões
daí os retratos
e as condecorações.
É assim somos assim meu irmão
primeiro vítima depois
o Dom de Sebastião.
Para nós a Humanidade
é uma lotaria.
Fomos grandes por fora
colonos do riso sem alegria.
Primeiro a República
avental da Monarquia depois
maçónica a Ditadura
com selvajaria cheia de Peros
de Vazes de Escrivaninha.
Camões que precisou
naufragar para o original
dos Lusíadas na tormenta editar.
Nação sem dúvida valente e imortal
na emigrância per capita
fundamentar.
Azar mas...Azar mas...
unha por cunha coisa por loisa
casamento por procuração depois
por Brasil a noiva.
Fernando Pessoa que foi Ser
português voltou
para conferir a língua desolado
fiscal do produto viciado.
25 de Abril
apoteose de revista
todos os bons restantes
com os maus de antes
sem pontos de vista.
agora sem medo enredo
sem uma história prevista.
Agora o fado espanta
nosso retiro e desespero
talvez nos paguem a conta
ou só irónico o tempero.
Talvez se aprenda o ovo
depois da galinha depois do óbvio
da adivinha.
Levantai hoje de novo
o esplendor da galinha
o imortal povo
ovo pai da rainha.
Mas primeiro país depois
Portugal.
Pobreza em pó orgulho
pre-conceito generoso
e desfeito.
Viva meu irmão do coração
azar mas...às armas...
pela pátria lutar depois
sem mar
só com chão Recomeçar!
Fernando Lemos
quinta-feira, 7 de agosto de 2008
RUI KNOPFLI (1932-1997)
Rui Knopfli
Nasceu em Inhambane, Moçambique e fez os seus estudos na África do Sul..
Entre 1958 e 1974 foi delegado de propaganda médica. Publicou o primeiro livro, O País dos Outros, em 1959. Foi director do jornal A Tribuna entre Maio de 1974 e Fevereiro de 1975. Co-dirigiu, com Eugénio Lisboa, os suplementos literários desse jornal e do A Voz de Moçambique. Lançou, com João Pedro Grabato Dias, os cadernos de poesia Caliban (1971-72), que reuniram colaboradores como Jorge de Sena, Herberto Helder, António Ramos Rosa, Fernando Assis Pacheco, José Craveirinha, Sebastião Alba, etc. Dirigiu o caderno Letras & Artes (1972-75), da revista Tempo, ali tendo publicado traduções de inúmeros poetas. Deixou Moçambique em Março de 1975, onde voltaria uma única vez - em Outubro de 1989.
Deixou Moçambique em 1975, mantendo nacionalidade portuguesa com alma assumidamente africana. Fez parte de uma geração de moçambicanos espalhados pelo mundo, que incluiu os poetas Alberto de Lacerda, Helder Macedo e Virgílio de Lemos, o cineasta Ruy Guerra, os filósofos Fernando Gil e José Gil, o arquitecto Pancho Miranda Guedes, o fotógrafo Pepe Diniz, a pintora Bertina Lopes e o ensaísta Eugénio Lisboa. Radicou-se em Londres em 1975. Aí exerceu, durante vinte e dois anos consecutivos, o cargo de conselheiro de imprensa (1975-97) junto da Embaixada de Portugal. Em 1984 recebeu o prémio de poesia do PEN Clube. Faleceu em Lisboa no ano de 1997.
Sempre me comoveram pessoas que nasceram em pátrias de cujas raízes físicas se perdem, por vezes, para sempre. O poema que abaixo publico fala disso mesmo. O que é a pátria? O que era a pátria para um português cujo território estava noutro continente?
PÁTRIA
Um caminho de areia solta conduzindo a parte
nenhuma. As árvores chamavam-se casuarina,
eucalipto, chanfuta. Plácidos os rios também
tinham nomes por que era costume designá-los.
Tal como as aves que sobrevoavam rente o matagal
e a floresta rumo ao azul ou ao verde mais denso
e misterioso, habitado por deuses e duendes
de uma mitologia que não vem nos tomos e tratados
que a tais coisas é costume consagrar-se. Depois,
com valados, elevações e planuras, e mais rios
entrecortando a savana, e árvores e caminhos,
aldeias, vilas e cidades com homens dentro,
a paisagem estendia-se a perder de vista
até ao capricho de uma linha imaginária. A isso
chamávamos pátria. Por vezes, de algum recesso
obscuro, erguia-se um canto bárbaro e dolente,
o cristal súbito de uma gargalhada, um soluço
indizível, a lasciva surdina de corpos enlaçados.
Ou tambores de paz simulando guerra. Esta
não se terá feito anunciar por tal forma
remota e convencional. Mas o sangue adubou
a terra, estremeceu o coração das árvores
e, meus irmãos, meus inimigos morriam. Uma
só e várias línguas eram faladas e a isso,
por estranho que pareça, também chamávamos pátria.
Rui Knopfli
nenhuma. As árvores chamavam-se casuarina,
eucalipto, chanfuta. Plácidos os rios também
tinham nomes por que era costume designá-los.
Tal como as aves que sobrevoavam rente o matagal
e a floresta rumo ao azul ou ao verde mais denso
e misterioso, habitado por deuses e duendes
de uma mitologia que não vem nos tomos e tratados
que a tais coisas é costume consagrar-se. Depois,
com valados, elevações e planuras, e mais rios
entrecortando a savana, e árvores e caminhos,
aldeias, vilas e cidades com homens dentro,
a paisagem estendia-se a perder de vista
até ao capricho de uma linha imaginária. A isso
chamávamos pátria. Por vezes, de algum recesso
obscuro, erguia-se um canto bárbaro e dolente,
o cristal súbito de uma gargalhada, um soluço
indizível, a lasciva surdina de corpos enlaçados.
Ou tambores de paz simulando guerra. Esta
não se terá feito anunciar por tal forma
remota e convencional. Mas o sangue adubou
a terra, estremeceu o coração das árvores
e, meus irmãos, meus inimigos morriam. Uma
só e várias línguas eram faladas e a isso,
por estranho que pareça, também chamávamos pátria.
Rui Knopfli
terça-feira, 5 de agosto de 2008
JOSÉ CARLOS GONZÁLEZ (1937-2000)
José Carlos González
Filho de pais galegos imigrados, nasceu em Lisboa e viveu vários anos exilado em Paris, regressando em 1974. Morreu em Kerlaz, na Bretanha, seu local de residência após a aposentação.
Poeta, de origem galega, de raiz surrealista, e nunca fazendo "tábua rasa" dessa experiência, como nos explica João Rui de Sousa, "o seu discurso foi sendo contaminado pela alusão aos factos comuns do dia a dia, com predomínio notório do flash citadino".
Estudou Direito em Lisboa e Românicas e Ciências Políticas na Sorbonne em Paris. Escritor e tradutor, foi técnico da Biblioteca Nacional, onde teve a seu cargo os espólios de Raul Brandão e de Vitorino Nemésio e Raul Proença. Organizou, prefaciou e anotou as obras António Sérgio – Correspondência para Raul Proença (1987). Traduziu obras de Albert Camus, André Malraux, Marguerite Duras e Julien Green, entre outros. Colaborou em vários jornais e revistas.
Um dia, lá por 84, escreveu-me uma carta a dizer que eu tinha copiado o título de um seu livro intitulado "Cantigas de mar e ar". O meu livrinho chamava-se "Cantigas de marear". Eslarecido o equívoco, trocámos mais uma ou duas cartas amáveis. Cruzámo-nos depois algures e trocámos um abraço de amizade que, infelizmente, não teve mais ocasião para se consolidar.
Gosoto muito do tom algo insubordinado de alguns dos seus poemas.
MEMÓRIA DE MINHA MÃE
Por que razão pensei que fosses
mulher fria hierática distante
igual aos teus antepassados de Covadonga
aos Celtas híbridos de Ibéricos
e que os teus cabelos muito jovens brancos
sinal fossem de tudo isso?
Por que razão sempre te amei tão pouco
quando amar-te era o meu mais fundo desejo
saber quando rias era verdade
como as rias da nossa Galiza
e os recifes abruptos da velha Astúrica?
Agora que estás longe longe demais
os teus olhos secos a tua pele com algumas sardas
o teu andar vagaroso mas vivo
agora que tudo isso é uma ideia um repouso
forçado num pequeno cemitério chamado Xiesteira
talvez comece a saber que não eras uma mulher fria
e que me amavas porventura muito
à tua hierática maneira.
José Carlos González
mulher fria hierática distante
igual aos teus antepassados de Covadonga
aos Celtas híbridos de Ibéricos
e que os teus cabelos muito jovens brancos
sinal fossem de tudo isso?
Por que razão sempre te amei tão pouco
quando amar-te era o meu mais fundo desejo
saber quando rias era verdade
como as rias da nossa Galiza
e os recifes abruptos da velha Astúrica?
Agora que estás longe longe demais
os teus olhos secos a tua pele com algumas sardas
o teu andar vagaroso mas vivo
agora que tudo isso é uma ideia um repouso
forçado num pequeno cemitério chamado Xiesteira
talvez comece a saber que não eras uma mulher fria
e que me amavas porventura muito
à tua hierática maneira.
José Carlos González
domingo, 3 de agosto de 2008
ROSA ALICE BRANCO (1950)
FLOR DE TINTA
O poema é o desenho desta letra
inclinada pelo rumor do vento
quando lhe peço abrigo
e vejo nele o espelho do meu corpo
repousando nos teus braços de ontem.
A tinta ainda não acabou de secar.
O cheiro fresco da página vira-se para a página seguinte
e a minha voz ouve-se melhor ao vento
quando conspiramos silêncio
a próxima letra
e a exactidão do seu desenho.
Agora há mimosas nas árvores
e lá em baixo o rio já não é como era
nem saberia sê-lo.
Esqueci como se bebe a água pela mão
ou como se bebe a mão
do rio.
Eu existia nessa transparência,
na flor espiritual e líquida
da tinta
que retoca no papel a sua vida.
Esta letra é o meu nome soletrado por ti,
o meu nome que ainda não está seco
e te olha nas acácias florindo em amarelo
no rigor do inverno.
Qualquer palavra tua me desenha
e assim começa qualquer coisa
que me estava destinada desde sempre.
Rosa Alice Branco
inclinada pelo rumor do vento
quando lhe peço abrigo
e vejo nele o espelho do meu corpo
repousando nos teus braços de ontem.
A tinta ainda não acabou de secar.
O cheiro fresco da página vira-se para a página seguinte
e a minha voz ouve-se melhor ao vento
quando conspiramos silêncio
a próxima letra
e a exactidão do seu desenho.
Agora há mimosas nas árvores
e lá em baixo o rio já não é como era
nem saberia sê-lo.
Esqueci como se bebe a água pela mão
ou como se bebe a mão
do rio.
Eu existia nessa transparência,
na flor espiritual e líquida
da tinta
que retoca no papel a sua vida.
Esta letra é o meu nome soletrado por ti,
o meu nome que ainda não está seco
e te olha nas acácias florindo em amarelo
no rigor do inverno.
Qualquer palavra tua me desenha
e assim começa qualquer coisa
que me estava destinada desde sempre.
Rosa Alice Branco
sábado, 2 de agosto de 2008
INÊS LOURENÇO (1942)
Inês Lourenço
Nasceu no Porto É licenciada em Línguas e Literaturas Modernas (Estudos Portugueses) pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Trabalhou nos CTT e no Ensino Secundário.
Participou em diversos eventos dedicados à Poesia, entre os quais se destaca: - La Poèsie Portugaise Après Pessoa, Bibliothéque Faidherbe, Paris, 2000; - Encontros com Poetas, Fundação Eugénio de Andrade, 2000; - Vozes e Olhares no Feminino, Porto 2001, Biblioteca Almeida Garrett, com Teolinda Gersão e Isabel Allegro de Magalhães, 2001; - 4º Encontro Internacional de Poetas, Coimbra, Biblioteca Joanina, 2001;
Coordenou e editou desde 1987, os magníficos CADERNOS DE POESIA –HÍFEN, com 13 números editados, na sua maioria temáticos, publicação de carácter inter-geracional, em que participam, com colaborações inéditas, grande parte dos poetas portugueses actuais, bem como poetas de outras línguas.
O trabalho poético de Inês Lourenço anda em torno do quotidiano. Pega num pormenor, num momento, num quase nada e acende-lhe o verso que o transforma numa luz maior.
RUA DE CAMÕES
A minha infância
cheira a soalho esfregado a piaçaba
aos chocolates do meu pai aos Domingos
à camisa de noite de flanela
da minha mãe
Ao fogão a carvão
à máquina a petróleo
ao zinco da bacia de banho
Soa a janelas de guilhotina
a desvendar meia rua
surgia sempre o telhado
sustentáculo da mansarda
obstáculo da perspectiva
Nele a chuva acontecia
aspergindo ocres mais vivos
empapando ervas esquecidas
cantando com as telhas liquidamente
percutindo folhetas e caleiras
criando manchas tão incoerentes nas paredes
de onde podia emergir qualquer objecto
E havia a Dona Laura
senhora distinta
e a sua criada Rosa
que ao nosso menor salto
lesta vinha avisar
que estavam lá em baixo
as pratas a abanar no guarda-louça
O caruncho repicava nas frinchas
alongava as pernas
a casa envelhecia
Na rua das traseiras havia um catavento
veloz nas turbulências de Inverno
e eu rejeitava da boneca
a imutável expressão
A minha mãe fazia-me as tranças
antes de ir para a escola
e dizia-me muitas vezes
Não olhes para os rapazes
que é feio.
Inês Lourenço
cheira a soalho esfregado a piaçaba
aos chocolates do meu pai aos Domingos
à camisa de noite de flanela
da minha mãe
Ao fogão a carvão
à máquina a petróleo
ao zinco da bacia de banho
Soa a janelas de guilhotina
a desvendar meia rua
surgia sempre o telhado
sustentáculo da mansarda
obstáculo da perspectiva
Nele a chuva acontecia
aspergindo ocres mais vivos
empapando ervas esquecidas
cantando com as telhas liquidamente
percutindo folhetas e caleiras
criando manchas tão incoerentes nas paredes
de onde podia emergir qualquer objecto
E havia a Dona Laura
senhora distinta
e a sua criada Rosa
que ao nosso menor salto
lesta vinha avisar
que estavam lá em baixo
as pratas a abanar no guarda-louça
O caruncho repicava nas frinchas
alongava as pernas
a casa envelhecia
Na rua das traseiras havia um catavento
veloz nas turbulências de Inverno
e eu rejeitava da boneca
a imutável expressão
A minha mãe fazia-me as tranças
antes de ir para a escola
e dizia-me muitas vezes
Não olhes para os rapazes
que é feio.
Inês Lourenço
sexta-feira, 1 de agosto de 2008
ANTÓNIO JOSÉ FORTE (1931-1988)
António José Forte
Nasceu na Póvoa de Santa Iria. Ligado ao movimento surrealista, integrou o chamado grupo do Café Gelo. Foi funcionário da Fundação Calouste Gulbenkian, onde, durante mais de 20 anos desempenhou as funções de Encarregado das Bibliotecas Itinerantes.
A sua poesia é tensa, intensa, subverte imagens, parte o vidro das palavras e faz-nos abanar e interrogar o mundo do quotidiano à nossa volta.
A sua obra está reunida em Uma Faca nos Dentes (Parceria A. M. Pereira), com prefácio de Herberto Helder. António José Forte faleceu em Lisboa no dia 15 de Dezembro de 1988.
LIBERTAÇÃO
Descerão por paredes sangrentas
e subirão do asfalto
ganindo com um prego na língua
com os pulsos atados às patas
sobre pulmões raivosos em barcos de esterco
e não olharão nem para baixo nem para o alto
mas para a frente
para o horizonte de fatias vermelhas
e para trás
para os afogados sem mar sem terra natal sem paisagens marinhas
cada um com um buraco em seu peito
esguichando palavras estridentes
descerão atravessando gargantas
e subirão pela espinha a golpes de jejum
descerão empurrando palavras
transportando-as ao pescoço como cintos de salvação
abrindo crateras nas cabeças queridas
e olhos nos olhos dos aflitos
subirão do asfalto
transparentes e feridos
com os olhos nas mãos
a cabeça no sangue
chegarão aos pares ligados pela boca
com um estandarte negro seguro nos dentes
e descerão sempre cada vez mais e cada vez mais alto
até chegarem á orla do inferno chorarem as últimas lágrimas e partirem de vez.
António José Forte
e subirão do asfalto
ganindo com um prego na língua
com os pulsos atados às patas
sobre pulmões raivosos em barcos de esterco
e não olharão nem para baixo nem para o alto
mas para a frente
para o horizonte de fatias vermelhas
e para trás
para os afogados sem mar sem terra natal sem paisagens marinhas
cada um com um buraco em seu peito
esguichando palavras estridentes
descerão atravessando gargantas
e subirão pela espinha a golpes de jejum
descerão empurrando palavras
transportando-as ao pescoço como cintos de salvação
abrindo crateras nas cabeças queridas
e olhos nos olhos dos aflitos
subirão do asfalto
transparentes e feridos
com os olhos nas mãos
a cabeça no sangue
chegarão aos pares ligados pela boca
com um estandarte negro seguro nos dentes
e descerão sempre cada vez mais e cada vez mais alto
até chegarem á orla do inferno chorarem as últimas lágrimas e partirem de vez.
António José Forte
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