quarta-feira, 30 de abril de 2008

1968 - ÀS PORTAS DE MAIO

16 DE MARÇO 1967.

NA UNIVERSIDADE DE NANTERRE OS ESTUDANTES RESIDENTES ACABAM COM A PROIBIÇÃO DE LIVRE CIRCULAÇÃO PELOS QUARTOS DAS RAPARIGAS.

ALGUNS MESES MAIS TARDE A PÍLULA É AUTORISADA LEGALMENTE.

A REvOLUÇÃO SEXUAL ESTÁ EM MARCHA.

AS MULHERES PARTEM À DESCOBERTA DO SEU CORPO E DOS SEUS DIREITOS.



JUNHO de 1967

SAI O ÁLBUM DOS BEATLES SGT. PEPPER'S LONELY HEARTS CLUB BAND



OUTUBRO DE 1967

CHE GUEVARA É ASSASSINADO NA BOLÍVIA


OUTUBRO DE 1967

O ESCRITOR GUATEMALTECO MIGUEL ANGEL ASTURIAS GANHA O PRÉMIO NOBEL DA LITERATURA


1967

HERBERT MARCUSE PUBLICA "O FIM DA UTOPIA"


1968

A GUERRA DO VIETNAME INTENSIFICA-SE


4 DE ABRIL DE 1968

É ASSASSINADO MARTIN LTHER KING EM MEMPHIS


30 DE ABRIL DE 1968

OS ESTUDANTES AMERICANOS OCUPAM A UNIVERSIDADE COLUMBIA DE NOVA YORK PARA PROTESTAR CONTRA A SEGREGAÇÃO RACIAL.



SALAZAR ESTÁ QUASE A CAIR DE UMA CADEIRA ABAIXO

terça-feira, 29 de abril de 2008

LITTLE BOXES



Pete Seeger parece ter feito com as suas LITTLE BOXES uma espécie de hino irónico aos nossos queridos gestores. Será assim que vamos todos acabar?

MAIO - SEJAMOS REALISTAS EXIJAMOS O IMPOSSÍVEL - 68

Não se teve impunemente 17 anos em Maio de 1968. Eu e muitas companheiras e companheiros tínhamos a cabeça a ferver e o coração a rebentar. E o Maio de 68 foi um espanto.

Faz 40 anos agora. E ainda não consigo arrumar-me. Acordo inquieto. Não consigo deixar de ser igual aos que precisam da minha igualdade.

Fiz da poesia a minha forma de ser rebelde.

Continuo a creditar que É PRECISO SER REALISTA E EXIGIR O IMPOSSÍVEL.

Os que se lembram desse tempo sabem como no nosso peito se misturavam uma imenso desejo de partilha e solidariedade e ainda muitas canções, imagens e poemas. Vinham de França, de Inglaterra, da América, de Cuba, da Bolívia, de todo o mundo onde houvesse alguém a sofrer ou a sonhar.

Portugal era cinzento, ,militaresco, triste, medíocre, repressivo, pequenino, miserável.

Por dentro de nós, no entanto, os corpos explodiam de ansiedade e tudo era possível.

Lá longe, muito para lá de Vilar Formoso, havia o Vietname, o Che Guevara, o Make Love not War, o Brassens, o Ferré, o Brel, a Colette Magny, os Beatles e os Stones, o Living Theatre, o Paco Ibañez, o Patxi Andion, o Pi de la Serra,o Vítor Jara,o Chico Buarque, Alan Guinsberg, o Bob Dylan, o Pete Seeger, o desejo de saber mais e mais, a inquietude a rebentar por todos os cantos, a desobediência, a certeza de que as ditaduras iriam cair e que a felicidade estava ali quase á mão de semear.

Não sei se sabia então aonde queria chegar. Sei que não era a este mundo ultra-liberal corrupto e descartável que cheguei, que chegámos.

Comemorar estes 40 anos é também reavivar a sede, a inquietação, a rebeldia, com a forma que elas possam ter nos dias que correm.

Vou trazer para aqui as minhas memórias desses meus 17 anos no nosso mês de Maio de 68.

domingo, 27 de abril de 2008

PACO IBAÑEZ

PALABRAS PARA JULIA

Tú no puedes volver atrás
porque la vida ya te empuja
como un aullido interminable
interminable.

Te sentirás acorralada
te sentirás perdida o sola
tal vez querrás no haber nacido
no haber nacido.

Pero tú siempre acuérdate
de lo que un día yo escribí
pensando en ti pensando en ti
como ahora pienso.

La vida es bella, ya verás
como a pesar de los pesares
tendrás amigos, tendrás amor
tendrás amigos.

Un hombre solo, una mujer
así tomados, de uno en uno
son como polvo, no son nada
no son nada.

Entonces siempre acuérdate
de lo que un día yo escribí
pensando en ti pensando en ti
como ahora pienso.

Nunca te entregues ni te apartes
junto al camino, nunca digas
y aqui me quedo no puedo más
y aquí me quedo.

La vida es bella, ya verás
como a pesar de los pesares
tendrás amigos, tendrás amor
tendrás amigos.

Y siempre siempre acuérdate
de lo que un día yo escribí
pensando en ti como ahora pienso
como ahora pienso.


De José Agustín Goytisolo com arranjo de Paco Ibañez

sábado, 26 de abril de 2008

ROCHA VIEIRA

Vivemos tempos de crise. São tempos de máscaras e aparências, em que se esquece o valor do serviço e o respeito pela realidade. São tempos que ignoram o passado da independência e anunciam um futuro sem liberdade.

Rocha Vieira

O Público, 25 de Abril de 2008

VASCO LOURENÇO

Acredito nos que defendem acima de tudo a liberdade e na sua capacidade para se baterem por ela. (...) [Mas] lembremo-nos de Brecht, não fiquemos alheios, até que, ao chegar a nossa vez, concluamos que já é tarde.


Vasco Lourenço

O Público, 25 de Abril de 2008

OS QUE PARTIRAM

Lembro alguns dos companheiros que partiram e que merecem ser lembrados em Abril.

ZECA, ADRIANO, PAREDES, ARY DOS SANTOS, MÁRIO VIEGAS, DENIS CINTRA, TÓ MACEDO, SERGINHO MESTRE, CARLOS GIL.

Para todos eles um cravo.

Para todos nós também!

CANTA CANTA AMIGO CANTA

(Quem se lembra desta canção do Tó Macedo que nos fazia cantar e parecia tornar-nos tão mais próximos uns dos outros?)

Canta canta amigo canta
vem cantar a nossa canção
tu sozinho não és nada
juntos temos o mundo na mão

Erguer a voz e cantar
é força de quem é novo
viver sempre a esperar
fraqueza de quem é povo

Viver em casa de tábuas
à espera dum novo dia
enquanto a terra engole
a tua antiga alegria

Canta canta amigo canta
vem cantar a nossa canção
tu sozinho não és nada
juntos temos o mundo na mão

O teu corpo é um barco
que não tem leme nem velas
a tua vida é uma casa
sem portas e sem janelas

Não vás ao sabor do vento
aprende a canção da esperança
vem semear tempestades
se queres colher a bonança

Canta canta amigo canta
vem cantar a nossa canção
tu sozinho não és nada
juntos temos o mundo na mão


Letra e música de TÓ MACEDO

quinta-feira, 24 de abril de 2008

25 DE ABRIL


JOSÉ AFONSO

GRÂNDOLA, VILA MORENA

Grândola vila morena
Terra da fraternidade
O povo é quem mais ordena
Dentro de ti ó cidade

Dentro de ti ó cidade
O povo é quem mais ordena
Terra da fraternidade
Grândola vila morena

Em cada esquina um amigo
Em cada rosto igualdade
Grândola vila morena
Terra da fraternidade

Terra da fraternidade
Grândola vila morena
Em cada rosto igualdade
O povo é quem mais ordena

À sombra de uma azinheira
Que já não sabia a idade
Jurei ter por companheira
Grândola a tua vontade

Grândola a tua vontade
Jurei ter por companheira
À sombra de uma azinheira
Que já não sabia a idade.

quarta-feira, 23 de abril de 2008

AFLOR DA LIBERDADE


JOSÉ GOMES FERREIRA




MAIO - ABRIL

XXXIII
(Vou terminar com o símbolo, já tão gasto, da criança: justamente aquele que joga o berlinde no canteiro diante da minha janela. Canta, canta, Poeta, a alegria falhada da tua Revolução verdadeira)



No recanto do jardim
neste dia nevoento forrado de olhos cegos,
o menino pôs-se a escavar a terra
e, de repente, parou ao sentir a mão a arder
com manchas de sol puro
enterrado pela morte dos deuses
que lá deixaram
a esperança doce
da pele dos dedos.

Ah!, deixa, deixa ardê-la bem,
a mão,
o pulso,
o braço
archote da Labareda Inocente
com que um dia criarás
um mundo diferente
com outro peso branco nas sombras, até dos assassinos.

Um mundo de fábricas de justiça delicadas
onde, em vez de folhas,
cresçam nas árvores
vento de cabelos femininos.

E em cada pedra, em cada fruto, em cada lago, em cada pétala,
em cada vulcão,
ouviremos todos bater
no centro do planeta
o teu coração com ritmo de pólen
- menino das mãos a arder.

segunda-feira, 21 de abril de 2008

MARIA KEIL


Pintura de Maria Keil

MANUEL ALEGRE

ABRIL DE SIM ABRIL DE NÃO

Eu vi Abril por fora e Abril por dentro
vi o Abril que foi e Abril de agora
eu vi Abril em festa e Abril lamento
Abril como quem ri como quem chora.

Eu vi chorar Abril e Abril partir
vi o Abril de sim e Abril de não
Abril que já não é Abril por vir
e como tudo o mais contradição.

Vi o Abril que ganha Abril que perde
Abril que foi Abril e o que não foi
eu vi Abril de ser e de não ser.

Abril de Abril vestido (Abril tão verde)
Abril de Abril despido (Abril que dói)
Abril já feito. E ainda por fazer.

domingo, 20 de abril de 2008

JOÃO ABEL MANTA


SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN

REVOLUÇÃO

Como casa limpa
Como chão varrido
Como porta aberta

Como puro início
Como tempo novo
Sem mancha nem vício

Como a voz do mar
Interior de um povo

Como página em branco
Onde o poema emerge

Como arquitectura
Do homem que ergue
Sua habitação

UM ABRIL EM ODEMIRA


2004, Odemira
Xico Fanhais, Tino Flores, José Fanha, Afonso Dias, Manuel Freire... e venham mais cinco!

BALANÇO PROVISÓRIO

Estamos mais gordos mais magros
talvez mais denso
ou mais pesado o nosso olhar
temos pressa de ternura
angústias de vez em quando
e umas contas de telefone atrasadas
para pagar.

Temos falta de cabelo
três ou quatro cicatrizes
sofremos de inquietação.
Muitas vezes nos disseram
como é rápido o deslize
mesmo assim nunca deixámos
de dar corda ao coração.

Daqueles que já partiram
guardamos silêncio e nome
e uma improvável mistura
de amargura e rebeldia
nas palavras desordeiras
que dizem redizem cantam
relembrando dia a dia
como é feita de azinheiras
a capital da alegria.

Muitas ondas já morreram
outras tantas vão nascer
muitos rios já se cansaram de correr até á foz
águas claras que se foram
outras águas se turvaram
e agora restamos nós.

Somos muitos somos poucos
calmamente radicais
sabemos vozes antigas
trazemos a lua ao peito
amamos sempre demais.

Neste caminho tomado
fomos traídos trocados
vendidos ao deus dará.
Nem por isso desistimos
e assim nos vamos achando
perdidos de andar às voltas
nas voltas que a vida dá.

Somos uns bichos teimosos
peixes loucos aves rindo
plantas poetas palhaços
e portanto resumindo
somos mais do que nos querem
estamos vivos
somos lindos.

José Fanha

sexta-feira, 18 de abril de 2008

EDUARDO GAGEIRO


Foto de Eduardo Gageiro

JOSÉ CARLOS ARY DOS SANTOS

SONETO DO TRABALHO


Das prensas dos martelos das bigornas
das foices dos arados das charruas
das alfaias dos cascos e dar dornas
é que nasce a canção que anda nas ruas.

Um povo não é livre em águas mornas
não se abre a liberdade com gazuas
à força do teu braço é que transformas
as fábricas e as terras que são tuas.

Abre os olhos e vê. Sê vigilante
a reacção não passará diante
do teu punho fechado contra o medo.

Levanta-te meu Povo. Não é tarde.
Agora é que o mar canta é que o sol arde
pois quando o povo acorda é sempre cedo.

quinta-feira, 17 de abril de 2008

FRANCISCO RELÓGIO


Pintura de Francisco Relógio

MARIA TERESA HORTA

MULHERES DE ABRIL

Mulheres de Abril
somos
mãos unidas

certeza já acesa
em todas
nós

Juntas formamos
fileiras
decididas

ninguém calará
a nossa
voz

Mulheres de Abril
somos
mãos unidas

na construção
operária
do país

Nos ventres férteis
a vontade
erguida

de um Portugal
que o povo
quis

quarta-feira, 16 de abril de 2008

BARTOLOMEU CID DOS SANTOS


Gravura de Bartolomeu Cid dos Santos

JORGE DE SENA

“NUNCA PENSEI VIVER…”


Nunca pensei viver para ver isto;
a liberdade – (e as promessas de liberdade)
restauradas. Não, na verdade, eu não pensava
- no negro desespero sem esperança viva –
que isto acontecesse realmente. Aconteceu.
E agora, meu general?

Todos morreram de opressão ou de amargura,
tantos se exilaram ou foram exilados,
tantos viveram um dia-a-dia cínico e magoado,
tantos se calaram, tantos deixaram de escrever,
tantos desaprenderam que a liberdade existe –
E agora, povo português?

Essas promessas – há que fazer depressa
que o povo as entenda, creia mais em si mesmo
do que nelas, porque elas só nele se realizam
e por ele. Há que, por todos os meios,
abrir as portas e as janelas cerradas quase cinquenta anos –
E agora, meu general?

E tu povo, em nome de quem sempre se falou,
ouvir-se-á a tua voz firme por sobre os clamores
com que saúdas as promessas de liberdade?
Tomarás nas tuas mãos, com serenidade e coragem,
aquilo que, numa hora única, te prometem?
E agora, povo português?

terça-feira, 15 de abril de 2008

NIKIAS SKAPINAKIS


Pintura de Nikias Skapinakis

MANUEL ALEGRE

TROVAS DO MÊS DE ABRIL


Foram dias foram anos a esperar por um só dia.
Alegrias. Desenganos. Foi o tempo que doía
Com seus riscos e seus danos. Foi a noite e foi o dia
Na esperança de um só dia.

Foram batalhas perdidas. Foram derrotas vitórias.
Foi a vida (foram vidas). Foi a História (foram histórias)
Mil encontros despedidas. Foram vidas (foi a vida)
Por um só dia vivida.

Foi o tempo que passava como nunca se passasse.
E uma flauta que cantava como se a noite rasgasse
Toda a vida e uma palavra: liberdade que vivia
Na esperança de um só dia.

Musa minha vem dizer o que nunca então disse
Esse morrer de viver por um dia em que se visse
um só dia e então morrer. Musa minha que tecias
um só dia dos teus dias.

Vem dizer o puro exemplo dos que nunca se cansaram
musa minha onde contemplo os dias que se passaram
sem nunca passar o tempo. Nesse tempo em que daria
a vida por um só dia.

Já muitas águas correram já muitos rios secaram
batalhas que se perderam batalhas que se ganharam.
Só os dias morreram em que era tão curta a vida
Por um só dia vivida.

E as quatros estações rolaram com seus ritmos e seus ritos.
Ventos do Norte levaram festas jogos brincos ditos.
E as chamas não se apagaram. Que na ideia a lenha ardia
Toda a vida por um dia.

Fogos-fátuos cinza fria. Musa minha que cantavas
A canção que se vestia com bandeiras nas palavras:
Armas que o tempo tecia. Minha vida toda a vida
Por um só dia vivida.

segunda-feira, 14 de abril de 2008

EDUARDO GAGEIRO


Foto de Eduardo Gageiro

SIDÓNIO MURALHA

POEMA DE ABRIL


A farda dos homens
voltou a ser pele
(porque a vocação
de tudo o que é vivo
é voltar às fontes).
Foi este o prodígio
do povo ultrajado,
do povo banido
que trouxe das trevas
pedaços de sol.

Foi este o prodígio
de um dia de Abril,
que fez das mordaças
bandeiras ao alto,
arrancou as grades,
libertou os pulsos,
e mostrou aos presos
que graças a eles
a farda dos homens
voltou a ser pele.

Ficou a herança
de erros e buracos
nas árduas ladeiras
a serem subidas
com os pés descalços,
mas no sofrimento
a farda dos homens
voltou a ser pele
e das baionetas
irromperam flores.

Minha pátria linda
de cabelos soltos
correndo no vento,
sinto um arrepio
de areia e de mar
ao ver-te feliz.
Com as mãos vazias
vamos trabalhar,
a farda dos homens
voltou a ser pele.

domingo, 13 de abril de 2008

JOSÉ RODRIGUES

Pintura de José Rodrigues

JAIME ROCHA

ABRIL

Tu és aquele astro decisivo,
concha rebentada,
portão invadido para Maio;

O teu ventre lançou figos vulcânicos,
morangos, uvas encarnadas,
trouxe cestos de toda a fruta,
cabazes,
cântaros de sonhos, amores despertos;

Vieste dentro de um corpo de vidro,
com uma alma maior que as mãos,
uma canção azul a aprender a andar,
tão longe e tão perto
como um comboio de brinquedo.

Tu és esse astro sim,
e outro ainda e outro,
um novelo de pinças
que dormem ao ciclo das flores,
à espera dos homens do futuro.

sábado, 12 de abril de 2008

JORGE PINHEIRO


Pintura de Jorge Pinheiro

JORGE DE SENA

CANTIGA DE ABRIL



Às Forças Armadas e ao povo de Portugal
«Não hei-de morrer sem saber qual a cor da liberdade»
J. de S.


Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.

Quase, quase cinquenta anos
reinaram neste país,
a conta de tantos danos,
de tantos crimes e enganos,
chegava até à raiz.

Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.

Tantos morreram sem ver
o dia do despertar!
Tantos sem poder saber
com que letras escrever
com que palavras gritar!

Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.

Essa paz do cemitério
toda prisão ou censura,
e o poder feito galdério,
sem limite e sem cautério,
todo embófia e sinecura.

Qual a cor da liberdade?
É verde e vermelha.

Esse ricos sem vergonha,
esses pobres sem futuro,
essa emigração medonha,
e a tristeza uma peçonha
envenenando o ar puro.

Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.

Essas guerras de além-mar
gastando as armas e a gente,
esse morrer e matar
sem sinal de se acabar
por política demente.

Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.

Esse perder-se no mundo
o nome de Portugal,
essa amargura sem fundo,
só miséria sem segundo
só desespero fatal.

Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.

Quase, quase cinquenta anos
durou esta eternidade,
numa sombra de gusanos
e em negócios de ciganos,
entre mentira e maldade.

Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.

sexta-feira, 11 de abril de 2008

RUAS DA MINHA CIDADE


JOAQUIM PESSOA

RUAS DE LISBOA

Ruas da minha cidade
veias que o meu sangue abraça
e põe cravos de ansiedade
na lapela de quem passa.

Ruas da minha cidade
onde perco o coração.
Poema diz a verdade!
Diz a verdade canção!

Ruas da minha cidade
amanhecendo a firmeza
duma ponte entre a saudade
e um Abril à portuguesa.

Ruas da minha cidade
onde vingo as minhas asas.
O meu nome é liberdade
e moro em todas as casas.

Ruas da minha cidade
praças da minha alegria
onde antes da claridade
era noite todo o dia.

Ruas da minha cidade
onde o velho é sempre novo:
as ruas não têm idade
porque são todas do povo.

Ruas da minha cidade
becos de ganga puída.
Oficinas da verdade
dos operários desta vida.

Ruas da minha cidade
janelas do meu olhar
onde os pardais da amizade
à tarde vêm poisar.

Ruas da minha cidade
rasgadas por minha mão.
A gente passa à vontade
quando pisa o nosso chão.

Ruas da minha cidade
Aonde eu quero morrer
Com cravos de eternidade
Dos meus olhos a nascer.

quarta-feira, 9 de abril de 2008

FILHOS DE ABRIL


JOSÉ JORGE LETRIA

O QUE AQUELA NOITE ME QUIS DAR


Eu não estava em casa nessa noite, filho,
nem podia estar. Estava nas ruas com os
[soldados
que rumavam às rádios e aos quartéis,
[engalanados
de sombra e de júbilo, a ver o que aquela
[noite
ia dar, o que a nossa liberdade prometia
[ser.
E tu, filho, tinhas a idade rumorejante
desse Abril embalado por uma canção do
[Zeca.
Como posso eu explicar-te tudo aquilo
que tu nasceste para aprender, para viver?
Eu estava aquartelado no meu silêncio
de pétalas, sílabas e marés, no meu dédalo
de vozes embriagadas pelo vento,
na coragem errante das pelejas da infância
e pouco ou nada sabia do mistério desse
[mês
capaz de transformar em assombro as
[nossas vidas.
Sim, sou eu neste retrato antigo,
a receber em festa os exilados, os que
[chegavam
com grinaldas de cantigas e a flor de uma
[ilusão
bordada a sangue e espuma no capote das
[nocturnas caminhadas.
Sim, sou eu a escrever a primeira
[reportagem
do primeiro de muitos dias em que o
[tempo
deixou de contar, em que os relógios
se tornaram corolas de paixão e riso
na lapela larga da alegria desta pátria.

Eu não estava em casa nessa noite, filho,
estava a afinar o coração pelo tom
das mais belas melodias que alguém pode
[aprender
para dar a quem ama a paz de um sono
sem tormento.

segunda-feira, 7 de abril de 2008

E ASSIM SE FEZ A PAZ


HÉLIA CORREIA

25 DE ABRIL


Agora deve-se beber, ohé, dançai
sobre este chão que estala com o cheiro
das coisas prometidas, com o fresco
tambor da ansiedade.

É a festa, mulheres!
Que sangue vibra,
que flor ou menstruo? Cor
que abotoais nas blusas, que atirais
na direcção do sol.
Espantosamente
se desfaz a montanha.

Hoje é a ceifa, ohé!
Beijai a terra,
soletrai-a com sede e devagar
como se toma a posse do amor
e se mordem os frutos.

Salve, mãe, o teu ventre perfumado
pelo nosso triunfo.

Bebamos, pois o vinho destas vozes,
soltemos estes cravos como potros
embriagados.
Como intensas éguas
incendiárias.

Cantai, cantai, crianças, o esplendor
de que nasceis herdeiras.

Erguei nas vossas mãos o ar por onde
esvoaça esta alegria.

Que ninguém adormeça.
Por que dias,
meses a fio, e anos, dançaremos
por sobre a claridade.

Vinde, bebei, ciganos:
eis a pátria.

sábado, 5 de abril de 2008

A POESIA ESTAVA NA RUA


Era Abril, a poesia estava na rua e Vieira da Silva deu conta disso neste belíssimo cartaz.

ABRIL

Havia uma lua de prata e sangue
em cada mão.

Era Abril.

Havia um vento
que empurrava o nosso olhar
e um momento de água clara a escorrer
pelo rosto de mães cansadas.

Era Abril que descia
aos tropeções
as ladeiras da cidade.

Abril
tingindo de perfume
os hospitais
e colando um verso branco em cada farda.

Era Abril
o mês imprescindível que trazia
um sonho de bagos de romã
e o ar
a saber a framboesas.

Abril
um mês de flores concretas
colocadas na espoleta do desejo
flores pesadas de seiva e cânticos azuis
um mês de flores
um dia
um mar de flores
um mês.

Havia barcos a voltar
de parte nenhuma
em Abril
e homens que escavavam a terra
em busca da vertical.

O nosso lar passou a ser a rua
nesse mês sem sono.

Era Abrile
eu soltei o sumo
das palavras
e vi
dicionários a voar
nesse mês
e mulheres que se despiam abraçando
a pele das oliveiras.

Era Abril
que veio
que ardeu
e que partiu.

Abril
que deixou sementes prateadas
germinando longamente
no olhar dos meninos por haver.


José Fanha, em "Tempo Azul"

quinta-feira, 3 de abril de 2008

BIBLIOTECA CAMÕES 1


Na Biblioteca Camões, com meninos da ADECO - Associação de Desenvolvimento Comunitário da Freguesia das Mercês.

Desenho da Sancha.

BIBLIOTECA CAMÕES 2


Na Biblioteca Camões, com os meninos da ADECO - Associação de Desenvolvimento Comunitário da Freguesia das Mercês.

Desenho da Beatriz Leandro

BIBLIOTECA CAMÕES 3


Na Biblioteca Camões com meninos da ADECO - Associação de Desenvolvimento Comunitário da Freguesia das Mercês.
Desenho de Catarina Campos.