terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

PARA SABER COMO É QUE ACABA A HISTÓRIA

Acabo de ler “O ANJO LITERÁRIO” do guatemalteco Eduardo Halfon, ed. Cavalo de Ferro.

É um livro muito divertido, um acumulado de pequenas histórias, contos, reflexões, entrevistas a escritores, um caos que nos agarra e através do qual o autor procura descobrir o que é que lna vida de um homem ou de yuma mulher o leva alguém à criação literária, onde é que está o clique? Em que idade acontece? Em circunstâncias.

Eduardo Halfon não consegue dar resposta a essa pergunta inicial e o leitor diverte-se mas também fica sem saber o que é que nos leva a começaer a escrever?

A propósito, lembro-me de uma frase de um dos escritores cujos livros visito com frequência: António Muñoz Molina. Numa entrevista a um jornal português há uns anos atrás, à pergunta tonta e ronceira “Escreve para quê?”, Muñoz Molina responde:


“ESCREVO PARA SABER COMO É QUE ACABA A HISTÓRIA”

sábado, 23 de fevereiro de 2008

À BEIRA DO MAR DE ESPINHO

À BEIRA DO MAR DE ESPINHO

(Com especial ternura para a Isabel e a Alexandra da Biblioteca Municipal de Espinho e para os alunos da Univérsidade Senior de Espinho)




São verdes azuis e cinzentas as palavras
que este mar me atira.
Dizem-me uma e outra e outra vez:
eu sou o mar
o teu profundo pai
e não te podes libertar da minha onda.
Estarei sempre
repetidamente
ao pé de ti
à frente atrás
ao lado
e mais além
por dentro do teu sangue.
Eu sou a fronteira que leva
mais longe o teu destino.

O ESPELHO DA ALMA

O ESPELHO DA ALMA

(Pequenas deambulações)

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Aos sábados, a "Babelia", magnífico suplemento cultural do jornal "El País", publica "Ida y vuelta" uma crónica do escritor António Munñoz Molina.

A de dia 16 intitulava-se "Novela de una cara" e tecia interessantes considerações sobre um retrato e sobre o misterioso romance que se lhe pode adivinhar por trás.

Reproduzia um quadro de Romaine Brooks. Falava, de seguida, sobre o mistério que podemos adivinhar por trás de um retrato, "... a promessa de uma história que estamos impacientes por saber."

Uma frase de Muñoz Molina ficou-me:


"A CARA É UM ESPELHO DA ALMA, MAS DA ALMA DE QUEM O ESTÁ A VER."


Molina cita a seguir Oscar Wilde que afirmava haver quem tire o rosto para mostrar a máscara que esconde por baixo.

Lembrei-me de uma outra afirmação de Ocar Wilde:


"QUALQUER RETRATO PINTADO COM SENTIMENTO É UM RETRATO DO ARTISTA, NÃO DO MODELO."

"Á BEIRA DO MAR"


"À beira do mar", (1912) Romaine Brooks
(publicado em "Babelia", suplemento cultural do jornal "El País", 16.02.08)

sábado, 16 de fevereiro de 2008

LEGENDAS

Ensinar a ver cinema pode ser uma actividade importante no sentido de promover formas de consumo cultural que fujam ao pronto a mastigar e deitar fora.

Ganhar o gosto pela leitura completa-se e existe num conjunto de prátcas de leitura que incluem ver cinema, ouvir música, visitar arquitecturas, apreciar obras de artes plásticas, confrontar-se com o teatro, voar na dança, etc, etc.

Cinema, proponho-o aos meus alunos sempre que posso.

Esta aconteceu comigo.

Um aluno do 8º ano a ver a comédia "Vigaristas de Bairro" de Woody Allen:

“Ó setôr… O que é que ele vai a fazer agora?”

“Não estás a ler as legendas?”

“Não tenho paciência!”

Fiquei na dúvida... Será que o aluno não tinha paciência ou não tinha competência para ler rapidamente as legendas? Ou uma das coisas era resultado da outra?

Parece-me que também por aqui anda a iliteracia escondida com rabo de fora.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

OS RESUMOS DA LITERATURA

Cada vez mais a literatura é reduzida a resumos.

Chega-se ao fim do 12º ano, por vezes, sem ter lido um livro inteiro. Apenas resumos.

Pergunto-me se alguns professores terão lido mais que resumos das obras que trabalham com os seus alunos.

No último número do “Magazine Littéraire”, num artigo intitulado “Como ensinar a literatura”, afirma o seu autor que o ensino de literatura no liceu, cada vez mais técnico, está a negligenciar a especificidade e a beleza das obras. Eu diria que ngligencia o cheiro, o tacto, o som, a alma das obras

O jornal “O Sol” e o jornal “El País” estão publicar resumos de grandes obras da literatura com o desejo (por certo louvável da parte de alguns dos envolvidos) de que as crianças se familiarizem com os Grandes Romances da Literatura.

Mas tenho dúvidas. Muitas dúvidas. Pergunto-me se, em nome da vulgarização de certos livros, não se estará a afastar o futuro leitor do prazer maior, sumptuoso, fantástico da sua leitura.

E pergunto-me ainda se todos falamos da mesma coisa quando estamos a falar de “LER”. Que tipo de leitura pretendemos que os nossos jovens conquistem?

Disse-me um amigo que via as pessoas a ler mais nos transportes públicos. Lêem o “Destak”, o “Metro”… Será que isso significa ler mais em geral ou apenas ler mais esse tipo de leitura?

Perguntei-me o que fazemos quando nos dedicamos à leitura e fiz uma lista de respostas que poderia continuar muito para além deste espaço.

Lemos por entretenimento. Lemos á superfície. Lemos no fundo. Lemos de lado. Lemos de frente.

Lemos à procura de emoções. Lemos para aprender, para viajar, para ser, para sobreviver, para, para rir, para chorar.

Lemos para nos conhecermos a nós próprios, para nos ficcionarmos, para nos descobrirmos.

Lemos para nos descentrarmos. Lemos para nos entendermos com o outro, com o diferente. e para descobrirmos que fazemos parte de um mundo muito mais vasto do que a nossa rua.

Será que tudo isto, ou mesmo parte, uma pequena parte de tudo isto, cabe num resumo?

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

GLOBALIZAÇÃO E ESPERANÇA

Um artigo assinado por Luís Francisco no jornal “Sexta” de hoje afirma que das quase sete mil línguas vivas no planeta muitas desaparecerão até ao fim do século.

Este é o anúncio de uma terível catástrofe ecológica e cultural.

Cada língua relaciona-se com o mundo dos objectos, das imagens e dos sentimentos de uma forma absolutamente única.

O género humano constitui-se biologicamente uno e culturalmente, linguísticamente, diverso. E essa diferença sempre constituiu um factor de enriquecimento.

“Com a desaparição de uma língua nós perdemos para sempre certas negociações com a esperança.”

GEORGES STEINER

(Magazine Littéraire, Junho 2006-08-10, entrevista conduzida por François L’yvonnet)

domingo, 3 de fevereiro de 2008

O RACISMO NÃO EXISTE - 1969/70


TEATRO COM URGÊNCIA

1969 - Associação de Estudantes do Instituto Superior Técnico

(Creio que era presidente da Associação o Zé Mariano Gago)

O A.P. Braga queria revitalizar o Grupo de Teatro da Associação. Pensou fazer um espectáculo de poesia sobre o racismo, tema quente que na altura puxava pela Guerra Colonial e pela guerra do Vietname à cabeça. E por muitas outras coisas. A luta pelos direitos cívicos nos EUA, a memória ainda muito viva memória da guerra da Argélia, os emigrantes portugueses em França, etc, etc.

Éramos 5 ou 6 no início. As coisas cresceram inesperadamente. No final éramos trinta e tal. Tínhamos escrito e encenado em conjunto um espectáculo teatral muito incisivo e moderno onde valiam todas as técnicas inclusivamente algumas que fomos buscar a grupos que estavam na berra como o Living Theatre.

O "Racismo" era feito com urgência, com raiva, com tripas, com amor, também com medo , mas com uma alegria difícil de repetir.

Tornou-se num êxito representado durante meses e foi possível porque à data ainda prevalecia a prática implícita da autonomia da Universidade que impedia teoricamente a PIDE e a Censura de intervirem dentro das Associações de Estudantes.

Não podíamos levar o espectáculo para fora da Associação, mas chegou a haver camionetas alugadas a trazer gente de fora de Lisboa para assistir ali.

É claro que tínhamos a PIDE à porta e que provocações houve mais que muitas. E quando um ano depois se quis estrear, o segundo espectáculo já foi mesmo proibido.

Alguns nomes dos envolvidos: Amadeu, António Mil-Homens, A P. Braga, Carlos Braga (Braguinha), Carlos Lopes, Joaquim Gil Nave, Joaquim Vieira, este que se assina José Fanha... E outros a quem peço desculpa pela falta de memória.

O RACISMO NÃO EXISTE


A minha estreia no teatro há 38 anos.

sábado, 2 de fevereiro de 2008

PREVISÕES DE UMA VIDENTE EM 1992

"GIRAS E PIROSAS"

Foi o único trabalho que fiz para a SIC. Era uma sitcom passada num cabeleireiro. Tinha começado coxo pela pena de um homem que percebia mal o humor protuguês e fez uma coisa um tanto à deriva.

Calhou-me escrever a partir do 4º episódio e tentar pôr o barco a navegar. Dei muita força á personagem de uma vidente que fazia grandes previsões políticas para o futuro.

Esta de que se fala aqui em baixo, da privatização do governo, era na época um delírio. Mas hoje... Quem se admiraria de ver o Ministério da Agricultura vendido a uma empresa de pesticidas ou o Ministério da Saúde entregue a uma empresa de salsichas, apenas com o intuito de os tornar saudavelmente rentáveis?