A criança modela-se.
Ajuda-a a modelar-se oferecendo-lhe tudo quanto tenhas de mais autêntico dentro de ti.
Oferece-te a ti próprio como modelo.
Faz de modelo, não só com o teu corpo de Homem, mas também com o que resta da tua espontaneidade infantil para o Amor.
Homens capazes de Amor são aqueles que foram crianças ou que se reconciliaram com a criança que foram.
Se amas a criança que em ti existe, então podes amar as crianças.
Podes fazer um filho.
Se a rejeitaste ou se com ela és irreconciliável então só podes gostar de bonecos de pasta, autómatos de lata e bugigangas para enfeitar o teu espaço esvaziado. Compra-os na loja, não faças filhos.
Não te ocupes dos filhos dos outros.
Mas se recuperaste essa criança, se tomaste conhecimento de que uma vontade infantil de sentir, experimentar e saber, existe em ti…
Então podes estender os braços à criança que está à tua frente.
Educar é oferecer-se como modelo,
educar é respeitar o seu próprio modelo.
Educar é respeitar a criação do Homem
e do seu Universo.
Educar é respeitar a criança e a criatividade infantil.
Se podes ser infantil, podes ser Homem, podes ser Mestre.
JOÃO DOS SANTOS
em “Ensinaram-me a ler o mundo à minha volta”, ed. Assìrio & Alvim
segunda-feira, 31 de dezembro de 2007
sexta-feira, 28 de dezembro de 2007
SÔDADE DI CABO VERDE
Um blog serve para partilhar paixões. Uma das minhas é Cabo Verde e a sua música. Começou em 79 e é uma paixão cheia de momentos fortes, amigos muitos, sôdade sem fim.
A minha relação com a extraordinária música caboverdeana começou em 79 no convívio com o falecido Cabral, assistente da TAP, e o seu conjunto “Cacimba da Madrugada” que me acompanhou de noite até ao nascer do sol numa serenata memorável de mornas e coladeras até à porta do velho hotel italiano do tempo da 2ª Guerra na Preguiça, Ilha do Sal.
Passa essa paixão pelas noites quentes da Prainha em que ouvi pela primeira vez a voz do Ildo Lobo e a música poderosíssima dos Tubarões com quem depois me cruzei em vários lugares do mundo e claro que também em Cabo Verde.
A Cesária já tinha alguns fans indefectíveis e eu inclusive, muito antes de ter sido descoberta pelo mundo.
Mas houve mais.
Delirei com o violino do Travadinha numa noite louca organizada pelo meu amigo Leão Lopes. Dancei quase até cair com o som do Zézé de Nha Reinalda e dos seus Finaçon .
Tremi ao ouvir gravações de Codé Di Dona.
Ri-me a bom rir com o Bana durante uma bruta briga de gente da terra com marinheiros coreanos na Pracinha do Mindelo e trago sempre muita música dele na memória.
Assisti a uma roda de mulheres da Cidade Velha a tocar batuque com uma força de fazer tremer a terra.
Ouvi e vibrei com a arte do Paulino Vieira por aqui e por ali.
Emocionei-me por ali e por aqui com a voz da minha muito querida amiga Celina Pereira. Abracei o Tito Paris e o Dany Silva e embarquei naquelas vozes que nos levam pelos sete mares do mundo.
Ouvi a jovem Lura e percebi que a música de Cabo Verde é um filão de alma grande que não tem fim.
Apanhei este disco de que vos falo agora. Nancy Vieira. Nunca tinha ouvido falar. É do melhor que tenho ouvido nos últimos anos. Há talvez um mês que o ouço todos os dias. É doce e forte. Vai direito ao coração e ao corpo. Dá para dançar e pensar. Como toda a tanta e tão boa música de Cabo Verde.
A minha relação com a extraordinária música caboverdeana começou em 79 no convívio com o falecido Cabral, assistente da TAP, e o seu conjunto “Cacimba da Madrugada” que me acompanhou de noite até ao nascer do sol numa serenata memorável de mornas e coladeras até à porta do velho hotel italiano do tempo da 2ª Guerra na Preguiça, Ilha do Sal.
Passa essa paixão pelas noites quentes da Prainha em que ouvi pela primeira vez a voz do Ildo Lobo e a música poderosíssima dos Tubarões com quem depois me cruzei em vários lugares do mundo e claro que também em Cabo Verde.
A Cesária já tinha alguns fans indefectíveis e eu inclusive, muito antes de ter sido descoberta pelo mundo.
Mas houve mais.
Delirei com o violino do Travadinha numa noite louca organizada pelo meu amigo Leão Lopes. Dancei quase até cair com o som do Zézé de Nha Reinalda e dos seus Finaçon .
Tremi ao ouvir gravações de Codé Di Dona.
Ri-me a bom rir com o Bana durante uma bruta briga de gente da terra com marinheiros coreanos na Pracinha do Mindelo e trago sempre muita música dele na memória.
Assisti a uma roda de mulheres da Cidade Velha a tocar batuque com uma força de fazer tremer a terra.
Ouvi e vibrei com a arte do Paulino Vieira por aqui e por ali.
Emocionei-me por ali e por aqui com a voz da minha muito querida amiga Celina Pereira. Abracei o Tito Paris e o Dany Silva e embarquei naquelas vozes que nos levam pelos sete mares do mundo.
Ouvi a jovem Lura e percebi que a música de Cabo Verde é um filão de alma grande que não tem fim.
Apanhei este disco de que vos falo agora. Nancy Vieira. Nunca tinha ouvido falar. É do melhor que tenho ouvido nos últimos anos. Há talvez um mês que o ouço todos os dias. É doce e forte. Vai direito ao coração e ao corpo. Dá para dançar e pensar. Como toda a tanta e tão boa música de Cabo Verde.
quarta-feira, 26 de dezembro de 2007
NA VOLTA DO CORREIO
As palavras têm uma coisa simpática: reproduzem-se. Ou melhor, nós enviamos aos amigos algumas palavras com aquela sabedoria ou falta de sabedoria de que somos capazes e, na volta do correio, recebemos outras palavras, quantas vezes mais saborosas que as nossas.
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É o que me tem acontecido este Natal. Atirei palavras a eito e tenho recebido textos e poemas de aquecer a alma. Cá vai que me foi enviado pela minha amiga Guadalupe. Bem haja!
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É o que me tem acontecido este Natal. Atirei palavras a eito e tenho recebido textos e poemas de aquecer a alma. Cá vai que me foi enviado pela minha amiga Guadalupe. Bem haja!
NO CAMINHO DA UTOPIA
A utopia está lá no horizonte.
Aproximo-me dois passos, ela se afasta dois passos.
Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos.
Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei.
Para que serve a utopia?
Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar.
Eduardo Galeano (Escritor uruguaio)
Aproximo-me dois passos, ela se afasta dois passos.
Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos.
Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei.
Para que serve a utopia?
Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar.
Eduardo Galeano (Escritor uruguaio)
segunda-feira, 24 de dezembro de 2007
PALAVRAS DE NATAL
Escrever é uma festa, uma aventura, um mergulho, uma viagem.
Escrever é uma cana de pesca que lançamos para dentro e para fora de nós. O anzol vai por ali abaixo e na volta vêm emoções, afectos, dores, sonhos, ilusões, utopias.
Quando escrevemos, estamos a abrir novos espaços, galáxias, continentes, oceanos fantásticos que só existem através das palavras.
Quando escrevemos tudo é possível. Podemos inventar o mundo e inventarmo-nos a nós próprios. Podemos chamar alguém que está longe ou já partiu para regressar ao nosso convívio no canto da saudade e da memória.
Por tudo isto, em certas épocas, desatamos a escrever a quem amamos. Às vezes nem temos tempo para parar um pouco a dar espessura e verdade às palavras que enviamos. Ou falha-nos a imaginação no meio da lufa-lufa da vida. Ou tornamo-nos presas do mecanismo mais ou menos perverso que envolve o mecanismo das comemorações. Socorremo-nos então de frases feitas, cartões, e-mais enviados e reenviados.
O Natal é assim. Tornou-se assim? Ou foi sempre assim? Não sei.
Sei que para mim, repito, escrever é uma festa. E com esta festa comemoro a outra, a do Natal. Nascem palavras. Nascem ideias. Nasce e renasce a vida. Uma festa para viver por dentro do coração.
E nesta festa, em volta das palavras, relembro-vos a todos, amigas e amigos queridos, mais antigos ou mais recentes, gente com quem marchei braço a braço para conquistar a liberdade, para sonhar, para partilhar o novelo dos afectos e o fogo das paixões, amigos ao lado de quem mergulho nos mistérios da vida, com quem partilho o deslumbre, a inquietação ou a desobediência.
A todos gostava de juntar num grande abraço e lembrar um poema do David Mourão-Ferreira, dos mais singelos que conheço.
Escrever é uma cana de pesca que lançamos para dentro e para fora de nós. O anzol vai por ali abaixo e na volta vêm emoções, afectos, dores, sonhos, ilusões, utopias.
Quando escrevemos, estamos a abrir novos espaços, galáxias, continentes, oceanos fantásticos que só existem através das palavras.
Quando escrevemos tudo é possível. Podemos inventar o mundo e inventarmo-nos a nós próprios. Podemos chamar alguém que está longe ou já partiu para regressar ao nosso convívio no canto da saudade e da memória.
Por tudo isto, em certas épocas, desatamos a escrever a quem amamos. Às vezes nem temos tempo para parar um pouco a dar espessura e verdade às palavras que enviamos. Ou falha-nos a imaginação no meio da lufa-lufa da vida. Ou tornamo-nos presas do mecanismo mais ou menos perverso que envolve o mecanismo das comemorações. Socorremo-nos então de frases feitas, cartões, e-mais enviados e reenviados.
O Natal é assim. Tornou-se assim? Ou foi sempre assim? Não sei.
Sei que para mim, repito, escrever é uma festa. E com esta festa comemoro a outra, a do Natal. Nascem palavras. Nascem ideias. Nasce e renasce a vida. Uma festa para viver por dentro do coração.
E nesta festa, em volta das palavras, relembro-vos a todos, amigas e amigos queridos, mais antigos ou mais recentes, gente com quem marchei braço a braço para conquistar a liberdade, para sonhar, para partilhar o novelo dos afectos e o fogo das paixões, amigos ao lado de quem mergulho nos mistérios da vida, com quem partilho o deslumbre, a inquietação ou a desobediência.
A todos gostava de juntar num grande abraço e lembrar um poema do David Mourão-Ferreira, dos mais singelos que conheço.
SURDINA DE NATAL PARA OS MEUS NETOS
Ó David Ó Inês
Vamos ver o Menino
inda mais pequenino
que vocês
Vamos vê-lo tapado
sob o céu do futuro
com a sombra de um muro
a seu lado
Vamos vê-lo nós três
novamente a nascer
Vamos ver se vai ser
desta vez
David Mourão-Ferreira
Vamos ver o Menino
inda mais pequenino
que vocês
Vamos vê-lo tapado
sob o céu do futuro
com a sombra de um muro
a seu lado
Vamos vê-lo nós três
novamente a nascer
Vamos ver se vai ser
desta vez
David Mourão-Ferreira
sábado, 22 de dezembro de 2007
A ESCRITA E A VIDA
A minha amiga Margarida Graça trouxe-me esta frase do professor Jorge do Ó:
"A escrita pode ser a hipótese de a vida ser uma obra de arte."
Vale a pena "mastigar" estas palavras até ao osso. Pode ser uma boa história de Natal
"A escrita pode ser a hipótese de a vida ser uma obra de arte."
Vale a pena "mastigar" estas palavras até ao osso. Pode ser uma boa história de Natal
quarta-feira, 19 de dezembro de 2007
A BRINCAR COM COISAS MUITO SÉRIAS
As palavras são o mais maravilhoso brinquedo que me deram em pequeno.
Sempre gostei de brincar com palavras. Esticá-las e dobrá-las na oficina da escrita. Fazer equilibrios instáveis com a música delas. Trocar-lhes o sentido. Despenteá-las. Inventar comboinhos de rimas e delírios. Dar a volta às composturas e bem pensâncias com que nos querem encerrar, diminuir e tornar em senhores muito amestrados.
Brincar ao absurdo talvez seja um acto de total liberdade. Acto maior do ser criança. E de ser poeta.
Sempre gostei de brincar com palavras. Esticá-las e dobrá-las na oficina da escrita. Fazer equilibrios instáveis com a música delas. Trocar-lhes o sentido. Despenteá-las. Inventar comboinhos de rimas e delírios. Dar a volta às composturas e bem pensâncias com que nos querem encerrar, diminuir e tornar em senhores muito amestrados.
Brincar ao absurdo talvez seja um acto de total liberdade. Acto maior do ser criança. E de ser poeta.
TRICOLÉ
TRICOLÉ
Caçador que vai à caça
à caça do tricolá
à ida bebe café
à volta só bebe chá.
Caçador que vai à caça
à caça do tricolé
à ida vai a cavalo
à volta já vem a pé
Caçador que vai à caça
à caça do tricoli
à ida vai pelo longe
à volta vem por aqui.
Caçador que vai à caça
à caça do tricoló
à ida vai de comboio
à volta vem de trenó.
Caçador que vai à caça
à caça do tricolu
à ida vai de casaco
à volta vem todo nu.
(de José Fanha, em "Cantigas & cantigos para formigas e formigos, a publicar)
Caçador que vai à caça
à caça do tricolá
à ida bebe café
à volta só bebe chá.
Caçador que vai à caça
à caça do tricolé
à ida vai a cavalo
à volta já vem a pé
Caçador que vai à caça
à caça do tricoli
à ida vai pelo longe
à volta vem por aqui.
Caçador que vai à caça
à caça do tricoló
à ida vai de comboio
à volta vem de trenó.
Caçador que vai à caça
à caça do tricolu
à ida vai de casaco
à volta vem todo nu.
(de José Fanha, em "Cantigas & cantigos para formigas e formigos, a publicar)
SE TU VISSES O QUE EU VI
SE TU VISSES O QUE EU VI
Se tu visses o que eu vi
na Rua do Lá Vai Um
uma velha muito velha
tropeçou e catrapum!
Se tu visses o que eu vi
no Beco do Fala Só
um juiz do tribunal
às costas da bisavó!
Se tu visses o que eu vi
na Travessa da Sofia
um soldado da marinha
a casar-se com uma enguia!
Se tu visses o que eu vi
no Largo do Navegante
três macacos macacões
ao colo de um elefante!
Se tu visses o que eu vi
num canto da minha rua
um poeta barrigudo
a deitar versos à lua!
(de José Fanha, em "Cantigas & cantigos para formigas e formigos", a publicar)
Se tu visses o que eu vi
na Rua do Lá Vai Um
uma velha muito velha
tropeçou e catrapum!
Se tu visses o que eu vi
no Beco do Fala Só
um juiz do tribunal
às costas da bisavó!
Se tu visses o que eu vi
na Travessa da Sofia
um soldado da marinha
a casar-se com uma enguia!
Se tu visses o que eu vi
no Largo do Navegante
três macacos macacões
ao colo de um elefante!
Se tu visses o que eu vi
num canto da minha rua
um poeta barrigudo
a deitar versos à lua!
(de José Fanha, em "Cantigas & cantigos para formigas e formigos", a publicar)
sexta-feira, 14 de dezembro de 2007
quarta-feira, 12 de dezembro de 2007
A PORTA QUE ABRE O LIVRO
Os marcadores são a porta que abre o livro e nos pisca o olho. "Entra!" diz o marcador. Outras vezes sussurra-nos: "Vá... Já estás a cair de sono!" e pede-nos para fechar o livro e deixá-lo também a ele, marcador, descansar na sua cama de letras.
Fez-se um concurso de frases sobre a leitura na EB 23 da Venda do Pinheiro. Ganharam estas três que e estão por baixo.A Sandra António fez a ilustração. Saiu uma colecção de marcadores muito divertidos. Tudo por iniciativa da responsável pelo Centro de Recursos, Jacqueline Duarte.
(aproveite quem gosta de marcadores e visite http://biblioteca-eb23ctx.blogspot.com/ onde há tempos houve uma magnífica exposição justamente de marcadores)
terça-feira, 11 de dezembro de 2007
DO MIA COUTO
AVESSO BÍBLICO
No início,
já havia tudo.
Mas Deus era cego
e, perante tanto tudo,
o que ele viu foi o Nada.
Deus tocou a água
e acreditou ter criado o oceano.
Tocou o chão
e pensou que a terra nascia sob os seus pés.
E quando a si mesmo se tocou
ele se achou o centro do Universo.
E se julgou divino.
Estava criado o Homem.
(em "idades cidades divindades", ed. Caminho, 2007)
No início,
já havia tudo.
Mas Deus era cego
e, perante tanto tudo,
o que ele viu foi o Nada.
Deus tocou a água
e acreditou ter criado o oceano.
Tocou o chão
e pensou que a terra nascia sob os seus pés.
E quando a si mesmo se tocou
ele se achou o centro do Universo.
E se julgou divino.
Estava criado o Homem.
(em "idades cidades divindades", ed. Caminho, 2007)
PARA O MIA COUTO
Para o Mia Couto
.
Elefantemos portanto.
Deixemos esta precária pele
aprender outros saberes.
Deixemos
portantomente
o olhar do paquiderme
ensinar ao passarinho
as paisagens do deslumbre
das escritas mais antigas.
Permitamos que o vento sopre.
E que a pedra exista.
E que o sol dispare a sua fúria
Em todas as direcções.
E que a lua se entretenha
no seu jogo de brilhar.
Elefantemos portanto.
Ou,
melhor dizendo,
permitamos que um silêncio muito antigo
venha
carregado de silvos e sussurros
venha
conduzir-nos a palavra
pelas veredas impalpáveis
do mistério.
(em "Elogio dos peixes das pedras e dos simples", José Fanha)
.
Elefantemos portanto.
Deixemos esta precária pele
aprender outros saberes.
Deixemos
portantomente
o olhar do paquiderme
ensinar ao passarinho
as paisagens do deslumbre
das escritas mais antigas.
Permitamos que o vento sopre.
E que a pedra exista.
E que o sol dispare a sua fúria
Em todas as direcções.
E que a lua se entretenha
no seu jogo de brilhar.
Elefantemos portanto.
Ou,
melhor dizendo,
permitamos que um silêncio muito antigo
venha
carregado de silvos e sussurros
venha
conduzir-nos a palavra
pelas veredas impalpáveis
do mistério.
(em "Elogio dos peixes das pedras e dos simples", José Fanha)
UMA FESTA INQUIETA, TERNA, DIVERTIDA
Há cerca de 3 meses meti as mãos à net nesta aventura de partilhar memórias, afectos, imagens, notícias, visitas a escolas e bibliotecas, textos, poemas, sei lá que mais... Tudo o qu viesse á rede e fosse peixe.
Pensei, no entanto, que aquilo que me motivava podia não ter interesse para outros. Pensei que recordar momentos de uma vida de vagabundagem activa pelas artes e pelo espectáculo podia ser um exercício de egocentrismo pateta e balofo.
Tive, portanto, alguma dúvida àcerca da utilidade disto tudo. Pus um contador de visitas para ver o que é que acontecia. Ao fim de um mês contabilizei uma média de cerca de 40 visitas diárias.
Aí comecei a pensar que esta sequência organicamente desorganizada pode fazer sentido para outras pessoas. Pode dar notícia do que se passa fora dos centros. Pode lançar sementes. Pode acordar memórias que se juntem a outras memórias. Sei lá... Se os que passam de visita por aqui deixarem uma palavra pode até transformar-se num fórum.
Uma pequenina festa inquieta, terna e divertida. Se assim for já é uma vitória e uma vitória muito saborosa.
Pensei, no entanto, que aquilo que me motivava podia não ter interesse para outros. Pensei que recordar momentos de uma vida de vagabundagem activa pelas artes e pelo espectáculo podia ser um exercício de egocentrismo pateta e balofo.
Tive, portanto, alguma dúvida àcerca da utilidade disto tudo. Pus um contador de visitas para ver o que é que acontecia. Ao fim de um mês contabilizei uma média de cerca de 40 visitas diárias.
Aí comecei a pensar que esta sequência organicamente desorganizada pode fazer sentido para outras pessoas. Pode dar notícia do que se passa fora dos centros. Pode lançar sementes. Pode acordar memórias que se juntem a outras memórias. Sei lá... Se os que passam de visita por aqui deixarem uma palavra pode até transformar-se num fórum.
Uma pequenina festa inquieta, terna e divertida. Se assim for já é uma vitória e uma vitória muito saborosa.
segunda-feira, 10 de dezembro de 2007
UM ERRO
Publiquei um poema escrito por duas meninas, Margarida e Raquel, enviado entre outros de outros meninos pela Professora Rita Carrapato.
Erro meu porque a Margarida Raquel eram afinal duas meninas, a Margarida e a Raquel. Aqui fica a emenda e aproveito para publicar mais dois poemas de meninos da mesma escola de Évora. Merecem que muitas pessoas lhes deixem aqui uma palavra de ternura porque os seus trabalhos poéticos são verdadeiramente comoventes.
Erro meu porque a Margarida Raquel eram afinal duas meninas, a Margarida e a Raquel. Aqui fica a emenda e aproveito para publicar mais dois poemas de meninos da mesma escola de Évora. Merecem que muitas pessoas lhes deixem aqui uma palavra de ternura porque os seus trabalhos poéticos são verdadeiramente comoventes.
MARGARIDA E RAQUEL
Sol,
tocaste a tua melodia para mim.
Quando ela acabou
o Outono acordou.
Tocaram à porta os trovões
o vento tocou na sua harpa
e as nuvens emocionadas
choraram e disseram:
“Cada nota musical
é uma letra do Outono!”
Os trovões foram-se embora,
uma borracha os apagou.
A chuva ficou com febre,
fechou a porta do olhar
e adormeceu
até ao amanhecer.
Margarida e Raquel, Escola EB 1, Av. heróis do Ultramar, Évora
tocaste a tua melodia para mim.
Quando ela acabou
o Outono acordou.
Tocaram à porta os trovões
o vento tocou na sua harpa
e as nuvens emocionadas
choraram e disseram:
“Cada nota musical
é uma letra do Outono!”
Os trovões foram-se embora,
uma borracha os apagou.
A chuva ficou com febre,
fechou a porta do olhar
e adormeceu
até ao amanhecer.
Margarida e Raquel, Escola EB 1, Av. heróis do Ultramar, Évora
HELENA E RAQUEL
As cores do Outono
são como um coração morto.
Um dia sonhei que estava
num campo só de flores
e estava a chorar…
…Apanhei muitas flores
daquelas que se sopram
e voa tudo…tudo…
Helena e Raquel, Escola EB 1 da Av. Heróis do Ultramar, Évora
são como um coração morto.
Um dia sonhei que estava
num campo só de flores
e estava a chorar…
…Apanhei muitas flores
daquelas que se sopram
e voa tudo…tudo…
Helena e Raquel, Escola EB 1 da Av. Heróis do Ultramar, Évora
DANIEL GEADAS
Não sei o que sinto.
Ninguém sabe o que sinto.
Mas o meu coração descreve
lágrimas impossíveis de tocar.
Será que sei do que estou a falar?
Daniel Geadas, Escola EB1 da Av. Heróis do Ultramar, Évora
Ninguém sabe o que sinto.
Mas o meu coração descreve
lágrimas impossíveis de tocar.
Será que sei do que estou a falar?
Daniel Geadas, Escola EB1 da Av. Heróis do Ultramar, Évora
domingo, 9 de dezembro de 2007
ADEUS PAI
Aqui vai mais uma fotografia pescada do baú das memórias boas. É do belíssimo filme "ADEUS PAI" de Luís Filipe Rocha.
Aqui eu fazia de RODINHAS, um homem que tinha perdido as pernas na guerra de África, um homem que fazia guerra contra os pretos e, afinal, tinha sido um preto a salvar-lhe a vida.
Uma personagem que reflecte a forma muito peculiar como os portugueses andaram pelo mundo.
Quem não viu o filme não o perca se o encontrar. Não por mim. Mas por tudo o resto. Uma história muito simples, muito emocionante e supreendente sobre as relações entre um pai e um filho. Para todas as idades.
Aqui eu fazia de RODINHAS, um homem que tinha perdido as pernas na guerra de África, um homem que fazia guerra contra os pretos e, afinal, tinha sido um preto a salvar-lhe a vida.
Uma personagem que reflecte a forma muito peculiar como os portugueses andaram pelo mundo.
Quem não viu o filme não o perca se o encontrar. Não por mim. Mas por tudo o resto. Uma história muito simples, muito emocionante e supreendente sobre as relações entre um pai e um filho. Para todas as idades.
sábado, 8 de dezembro de 2007
HISTÓRIAS
HISTÓRIAS
Conta-me uma história
carregada de orientes
músicas suaves
e perfumes.
Uma história envolta em pérolas
princesas
e peixes deslumbrantes.
Senta o meu olhar na tenda do deserto
sob a grande lua.
Peço: mostra-me os teus mapas irreais.
Fala-me do mar
ilhas misteriosas
a pimenta e a canela.
Desenha com palavras o brilho dos topázios
e o deslumbre sonoro
das intensas noites tropicais.
Não te contenhas. Voa.
Tece palavras e milagres.
Inventa-te anil vermelha e violeta.
Rouba à terra as cores ferruginosas.
Rouba aos rios o seu leito luxuoso de calhaus rolantes.
Toca os meus lábios com a seda sequiosa dos teus lábios.
Conta-me uma história
de ladrões felizes.
("Tempo azul", José Fanha)
Conta-me uma história
carregada de orientes
músicas suaves
e perfumes.
Uma história envolta em pérolas
princesas
e peixes deslumbrantes.
Senta o meu olhar na tenda do deserto
sob a grande lua.
Peço: mostra-me os teus mapas irreais.
Fala-me do mar
ilhas misteriosas
a pimenta e a canela.
Desenha com palavras o brilho dos topázios
e o deslumbre sonoro
das intensas noites tropicais.
Não te contenhas. Voa.
Tece palavras e milagres.
Inventa-te anil vermelha e violeta.
Rouba à terra as cores ferruginosas.
Rouba aos rios o seu leito luxuoso de calhaus rolantes.
Toca os meus lábios com a seda sequiosa dos teus lábios.
Conta-me uma história
de ladrões felizes.
("Tempo azul", José Fanha)
quinta-feira, 6 de dezembro de 2007
LER, PENSAR, PARTILHAR A LEITURA EM ÉVORA
Em Évora reune-se um grupo que podia ser mas não é exactamente uma Comunidade de Leitores. Um grupo de professores que pretendem reflectir sobre a leitura e as formas de incrementar a leitura e a sua partilha entre os alunos de uma escola e fora do espaço curricular.
Mais do que isso. Trata-se de um grupo que procura lançar a prática da partilha de leituras entre professores e pais. Partilha das ficções que cada um constrói na leitura de um mesmo livro, partilha de inquietações e sonhos que vêm à tona das palavras quando pomos em comum este vício bom que é ler.
Como é natural, um grupo que quer pensar sobre leitura, tem de ler. Por isso, é a partir da prática da partilha de leituras que procuramos entender e criar um modelo de organização e de dinâmica novas Comunidades de Leitores que daqui se pretende que venham a nascer.
A iniciativa é patrocinada pela Câmara Municipal de Évora. A casa que nos alberga é a Escola EB23 André de Resende. E, mais cedo ou mais tarde, este caminho terá de dar frutos. Desse caminho continuarei a dar notícias.
Mais do que isso. Trata-se de um grupo que procura lançar a prática da partilha de leituras entre professores e pais. Partilha das ficções que cada um constrói na leitura de um mesmo livro, partilha de inquietações e sonhos que vêm à tona das palavras quando pomos em comum este vício bom que é ler.
Como é natural, um grupo que quer pensar sobre leitura, tem de ler. Por isso, é a partir da prática da partilha de leituras que procuramos entender e criar um modelo de organização e de dinâmica novas Comunidades de Leitores que daqui se pretende que venham a nascer.
A iniciativa é patrocinada pela Câmara Municipal de Évora. A casa que nos alberga é a Escola EB23 André de Resende. E, mais cedo ou mais tarde, este caminho terá de dar frutos. Desse caminho continuarei a dar notícias.
terça-feira, 4 de dezembro de 2007
DOCAS
Escrevi os textos para o "DOCAS", programa de humor da TVI, em 1996.
Em cada um havia um convidado. Neste dia foi esse actor imenso que se chamava Henrique Viana.
Quinze dias antes desta fotografia eu tinha partido o esterno e duas costelas num acidente de automóvel. As dores eram bastantes mas não resisti ao gozo de posar neste preparo ao lado do Henrique.
Deixou-nos há pouco tempo e deixou muita saudade a quem teve a felicidade de trabalhar com ele.
Em cada um havia um convidado. Neste dia foi esse actor imenso que se chamava Henrique Viana.
Quinze dias antes desta fotografia eu tinha partido o esterno e duas costelas num acidente de automóvel. As dores eram bastantes mas não resisti ao gozo de posar neste preparo ao lado do Henrique.
Deixou-nos há pouco tempo e deixou muita saudade a quem teve a felicidade de trabalhar com ele.
domingo, 2 de dezembro de 2007
A POESIA E OS MENINOS
Trabalhar a poesia com meninos, ajudá-los a descobrir que podem habitar outra dimensão das palavras, pode ser extremamente gratificante.
No entanto, por vezes, a poesia é confundida com a rima ou com a quadra, ou seja, com a forma. E a forma pode ser e pode não ser o caminho para chegar à poesia. A forma pode até ser inimiga da poesia. Pode espartilhá-la e esvaziá-la. Mas também lhe pode dar uma ressonância própria e encantadora. Depende da mão que a escreve e da voz que a torna em ouro.
Numa sala da Escola EB 1 da Venda do Pinheiro, meninos houve que me disseram que a poesia era o maravilhoso e o fantástico. Aí temos um caminho para a poesia. Também não será o único. Há outros que passam pela descoberta da largueza que as palavras nos concedem, pelo prazer de virar o mundo ao contrário através da força insurrecta que o verso tem, pelo diálogo com as dores e as alegrias guardadas na memória, e tantos outros caminhos, todos eles pequenos ou grandes rios
do grande mar da poesia.
Comecei a falar de poesia com os meninos da Escola EB1 da Av. heróis do Ultramar de Évora. A professora Rita Carrapato continuou. estão aqui alguns dos resultados.
No entanto, por vezes, a poesia é confundida com a rima ou com a quadra, ou seja, com a forma. E a forma pode ser e pode não ser o caminho para chegar à poesia. A forma pode até ser inimiga da poesia. Pode espartilhá-la e esvaziá-la. Mas também lhe pode dar uma ressonância própria e encantadora. Depende da mão que a escreve e da voz que a torna em ouro.
Numa sala da Escola EB 1 da Venda do Pinheiro, meninos houve que me disseram que a poesia era o maravilhoso e o fantástico. Aí temos um caminho para a poesia. Também não será o único. Há outros que passam pela descoberta da largueza que as palavras nos concedem, pelo prazer de virar o mundo ao contrário através da força insurrecta que o verso tem, pelo diálogo com as dores e as alegrias guardadas na memória, e tantos outros caminhos, todos eles pequenos ou grandes rios
do grande mar da poesia.
Comecei a falar de poesia com os meninos da Escola EB1 da Av. heróis do Ultramar de Évora. A professora Rita Carrapato continuou. estão aqui alguns dos resultados.
JOÃO MATALOTO e GONÇALO
O SOL
O sol brilha
como uma fantasia
e como duas rolas a cantar.
João Mataloto e Gonçalo, Escola EB1, Av. heróis do Ultramar, Évora
O sol brilha
como uma fantasia
e como duas rolas a cantar.
João Mataloto e Gonçalo, Escola EB1, Av. heróis do Ultramar, Évora
DÉBORA
O mar é sereno
e quando vêm aquelas tempestades enormes
ele fica nervoso
como um rei exaltado.
Mas… com a companhia da brisa
o mar acalma e dorme em paz.
Débora, Escola EB1 da Av. Heróis do Ultramar, Évora
e quando vêm aquelas tempestades enormes
ele fica nervoso
como um rei exaltado.
Mas… com a companhia da brisa
o mar acalma e dorme em paz.
Débora, Escola EB1 da Av. Heróis do Ultramar, Évora
MARGARIDA RAQUEL
Sol,
tocaste a tua melodia para mim.
Quando ela acabou
o Outono acordou.
Tocaram à porta os trovões
o vento tocou na sua harpa
e as nuvens emocionadas
choraram e disseram:
“Cada nota musical
é uma letra do Outono!”
Os trovões foram-se embora,
uma borracha os apagou.
A chuva ficou com febre,
fechou a porta do olhar
e adormeceu
até ao amanhecer.
Margarida Raquel, Escola EB1 da Av. Heróis do Ultramar, Évora
tocaste a tua melodia para mim.
Quando ela acabou
o Outono acordou.
Tocaram à porta os trovões
o vento tocou na sua harpa
e as nuvens emocionadas
choraram e disseram:
“Cada nota musical
é uma letra do Outono!”
Os trovões foram-se embora,
uma borracha os apagou.
A chuva ficou com febre,
fechou a porta do olhar
e adormeceu
até ao amanhecer.
Margarida Raquel, Escola EB1 da Av. Heróis do Ultramar, Évora
sábado, 1 de dezembro de 2007
A FADA PALAVRINHA
Desde o ano de 2006 que tenho colaborado com o projecto "A FADA PALAVRINHA" do Departamento de Cultura da Câmara Municipal de Évora que visa estabelecer uma relação regular quer presencial quer por net de um escritor com um grupo de meninos de uma escola do 1º Ciclo.
O primeiro grupo com que trabalhei foi o da sala da Professora Rita Carrapato na EB 1 da Av. Heróis do Ultramar em Évora. Estabelecemos uma relação tão forte e doce que passado um ano e estando já a trabalhar com outra Escola e outro professor, sempre que vou a Évora não deixo de visitar os meus amigos e de me surpreender com os trabalhos que fazem quer em poesia quer em desenho.
Aqui deixo alguns exemplos de desenhos a partir do livro "O DIA EM QUE A MATA ARDEU" w um grande abrço de agradececimento pelo muito que me têm dado estes meninos e a sua professora.
O primeiro grupo com que trabalhei foi o da sala da Professora Rita Carrapato na EB 1 da Av. Heróis do Ultramar em Évora. Estabelecemos uma relação tão forte e doce que passado um ano e estando já a trabalhar com outra Escola e outro professor, sempre que vou a Évora não deixo de visitar os meus amigos e de me surpreender com os trabalhos que fazem quer em poesia quer em desenho.
Aqui deixo alguns exemplos de desenhos a partir do livro "O DIA EM QUE A MATA ARDEU" w um grande abrço de agradececimento pelo muito que me têm dado estes meninos e a sua professora.
sexta-feira, 30 de novembro de 2007
SOBRE A IMPUREZA
(para o António Pinho Vargas)
Sou impuro.
Ponto.
Dado a mestiçagens.
Ponto.
Sou cambota de automóvel.
Pássaro.
Palmeira.
Durmo sonos de esmeralda
e de pimenta.
Tenho um heterónimo
lunar
pronto a implodir
nas cordilheiras do Sul.
Inclino o tempo
que me é dado
ao riso dos meninos
e ao lamento pungente
dos violinos perdidos
no centro
da escuridão.
Todo o silêncio me é música.
Toda a geometria é o meu lugar.
Todos os lugares
acordam no meu peito.
(“Elogio dos peixes das pedras e dos simples”, José Fanha)
Sou impuro.
Ponto.
Dado a mestiçagens.
Ponto.
Sou cambota de automóvel.
Pássaro.
Palmeira.
Durmo sonos de esmeralda
e de pimenta.
Tenho um heterónimo
lunar
pronto a implodir
nas cordilheiras do Sul.
Inclino o tempo
que me é dado
ao riso dos meninos
e ao lamento pungente
dos violinos perdidos
no centro
da escuridão.
Todo o silêncio me é música.
Toda a geometria é o meu lugar.
Todos os lugares
acordam no meu peito.
(“Elogio dos peixes das pedras e dos simples”, José Fanha)
UMA CANÇÃO DIFERENTE
Um dia o Pedro Osório telefonou-me. Era para fazermos uma canção. Queria levar a Lúcia, filha do Carlos Alberto Moniz e da Maria do Amparo ao Festival da Canção da RTP. Nem hesitei. Conhecia a Lucinha quase de bébé. Nem hesitei.
Queríamos fazer uma canção diferente do que era costume nos anos 90. Com outra estaleca. Não foi fácil fazer a letra porque trabalhar com o Pedro Osório é um previlégio mas o seu rigor e a sua exigência vão até ao mais pequeno pormenor.
A canção chamou-se "O MEU CORAÇÃO NÃO TEM COR". Era uma festa. Não fast-food musical mas música profundamente popular.
Inesperadamente ganhou o Festival da RTP cá em Portugal e foi ao Eurofestival em Oslo onde a Lúcia encantou toda a gente com a sua extrema simpatia e o som do cavaquinho com que andava por toda a parte.
Tornou-se numa das favoritas e teve a melhor classificação de todas as canções portuguesas que até hoje concorreram ao Festival da Eurovisão. Nunca foi gravada em disco. Vá-se lá saber porquê. Mas fica aqui. Para que a ouça quem quiser.
Queríamos fazer uma canção diferente do que era costume nos anos 90. Com outra estaleca. Não foi fácil fazer a letra porque trabalhar com o Pedro Osório é um previlégio mas o seu rigor e a sua exigência vão até ao mais pequeno pormenor.
A canção chamou-se "O MEU CORAÇÃO NÃO TEM COR". Era uma festa. Não fast-food musical mas música profundamente popular.
Inesperadamente ganhou o Festival da RTP cá em Portugal e foi ao Eurofestival em Oslo onde a Lúcia encantou toda a gente com a sua extrema simpatia e o som do cavaquinho com que andava por toda a parte.
Tornou-se numa das favoritas e teve a melhor classificação de todas as canções portuguesas que até hoje concorreram ao Festival da Eurovisão. Nunca foi gravada em disco. Vá-se lá saber porquê. Mas fica aqui. Para que a ouça quem quiser.
segunda-feira, 26 de novembro de 2007
BARTOLOMEU CAMPOS DE QUEIRÓS
Bartolomeu é um amigo de Minas Gerais, escritor com vasta e maravilhosa obra virada para a infância e a juventude.
Anda por escolas e bibliotecas a contar histórias, a espalhar ternura e a semear versos. Até já passou pelas "Palavras Andarilhas" em Beja. É dos nossos.
Vale a pena visitá-lo e conhecer-lhe a arte. Segue uma amostra a seguir. Para mais pode espreitar-se a morada: http://www.caleidoscopio.art.br/bartolomeuqueiros/
TINHA SÓ DUAS PERNAS
"Meu pai dirigia um caminhão muito grande e bonito. Viajava para longe, levando manteiga para as cidades que só produziam pão. Bom Destino tinha pão e manteiga. Passava dias distantes e voltava trazendo uma carroceria de notícias.
Eu ficava impressionado como era grande o mundo do meu pai.Ele colocava um travesseiro sobre seus joelhos, me assentava em cima e me entregava o volante para eu dirigir. Naquele tempo eu não sabia nem frear meus pensamentos. Tinha só duas pernas; imagina dirigir um caminhão com dez rodas.
Depois, como seria possível eu aprender a dirigir, se minha alegria eram as paisagens! No caminhão havia um espelho de lado. Eu apreciava ver meu pai olhando para a frente e correndo os olhos sobre o que estava atrás. Nesses momentos ele possuía muitos olhares.".
"O olho de vidro do meu avô", Bartolomeu Campos de Queirós
Eu ficava impressionado como era grande o mundo do meu pai.Ele colocava um travesseiro sobre seus joelhos, me assentava em cima e me entregava o volante para eu dirigir. Naquele tempo eu não sabia nem frear meus pensamentos. Tinha só duas pernas; imagina dirigir um caminhão com dez rodas.
Depois, como seria possível eu aprender a dirigir, se minha alegria eram as paisagens! No caminhão havia um espelho de lado. Eu apreciava ver meu pai olhando para a frente e correndo os olhos sobre o que estava atrás. Nesses momentos ele possuía muitos olhares.".
"O olho de vidro do meu avô", Bartolomeu Campos de Queirós
domingo, 25 de novembro de 2007
MIGUEL TORGA NA VENDA DO PINHEIRO
Na Escola EB 23 da Venda do Pinheiro está a decorrer a comemoração dos 100 anos do nascimento de Miguel Torga, organizada com o entusiasmo e a dedicação da Jacqueline Duarte, coordenadora da Biblioteca.
Participação especial da Fernanda Frazão a contar de uma forma muito especial um conto dos "Bichos".
Participação especial da Fernanda Frazão a contar de uma forma muito especial um conto dos "Bichos".
sábado, 24 de novembro de 2007
PARABÉNS
Ontem, a BIBLIOTECA DE ALCOBAÇA fez anos. Que pena não ter podido lá ir. É um espaço caloroso, cheio de luz, aberto à fantasia das palavras e à imaginação dos cenários.
Parabéns Madalena. Parabéns Claudia.
Como algumas outras espalhadas pelo país, esta Biblioteca faz muito com poucos meios e um grande entusiasmo.
Se tivessem mais meios, mais apoio, se este país descobrisse que sem um grande salto nos hábitos de leitura em Portugal não há desenvolvimento económico, nem requalificação profissional, nem cidadania sólida... Isso é que era uma grande prenda de anos para todos nós.
Parabéns Madalena. Parabéns Claudia.
Como algumas outras espalhadas pelo país, esta Biblioteca faz muito com poucos meios e um grande entusiasmo.
Se tivessem mais meios, mais apoio, se este país descobrisse que sem um grande salto nos hábitos de leitura em Portugal não há desenvolvimento económico, nem requalificação profissional, nem cidadania sólida... Isso é que era uma grande prenda de anos para todos nós.
PABLO NERUDA
I
Porque é que os imensos aviões
não passeiam com os seus filhos?
Qual é o pássaro amarelo
que enche o ninho de limões?
Porque é que não ensinam
a tirar mel do sol aos helicópteros?
Onde é que a lua cheia
deixou~o seu saco nocturno de farinha?
V
Que guardas na tua bossa?
perguntou o camelo à tartaruga.
E a tartaruga perguntou:
E tu, que conversas tens com as laranjas?
Terá mais folhas uma pereira
que em Busca do Tempo Perdido?
Porque se suicidam as folhas
quando se sentem amarelas?
VIII
Que coisa irrita os vulcões
que cospem fogo, frio e fúria?
Porque é que Cristóvão Colombo
não pôde descobrir a Espanha?
Quantas perguntas tem um gato?
As lágrimas que não se choram
esperam em pequenos lagos?
Ou serão rios invisíveis
que correm até à tristeza?
Pablo Neruda, “Livro das perguntas” (1974),
Tradução José Fanha
Porque é que os imensos aviões
não passeiam com os seus filhos?
Qual é o pássaro amarelo
que enche o ninho de limões?
Porque é que não ensinam
a tirar mel do sol aos helicópteros?
Onde é que a lua cheia
deixou~o seu saco nocturno de farinha?
V
Que guardas na tua bossa?
perguntou o camelo à tartaruga.
E a tartaruga perguntou:
E tu, que conversas tens com as laranjas?
Terá mais folhas uma pereira
que em Busca do Tempo Perdido?
Porque se suicidam as folhas
quando se sentem amarelas?
VIII
Que coisa irrita os vulcões
que cospem fogo, frio e fúria?
Porque é que Cristóvão Colombo
não pôde descobrir a Espanha?
Quantas perguntas tem um gato?
As lágrimas que não se choram
esperam em pequenos lagos?
Ou serão rios invisíveis
que correm até à tristeza?
Pablo Neruda, “Livro das perguntas” (1974),
Tradução José Fanha
sexta-feira, 23 de novembro de 2007
MEMÓRIAS - 1977
Da gaveta onde guardo as memórias boas repesquei este disco. Um single. Veja-se só quem participou na sua gravação e produção. Quase todos grandes e queridos amigos hoje em dia.
FACE A
EU SOU PORTUGUÊS AQUI
Voz: José Fanha - Guitarra: Pedro Caldeira Cabral
FACE B
TERRA MÃE
Letra: Dulce Fanha - Música: Joaquim Gil Nave
Vozes: Adelaide Ferreira, Argentina Rocha, Fernando Tordo, Luísa Basto, Paulo Carvalho
Acústicas e arranjo: Júlio Pereira
Flauta: Rão Kyao
Acordeão: Helder Reis
Baixo: Paulo Godinho
Bateria: Vítor Mamede
Fotos: Rui Pacheco
Arranjo gráfico: Manuel Botelho
FACE A
EU SOU PORTUGUÊS AQUI
Voz: José Fanha - Guitarra: Pedro Caldeira Cabral
FACE B
TERRA MÃE
Letra: Dulce Fanha - Música: Joaquim Gil Nave
Vozes: Adelaide Ferreira, Argentina Rocha, Fernando Tordo, Luísa Basto, Paulo Carvalho
Acústicas e arranjo: Júlio Pereira
Flauta: Rão Kyao
Acordeão: Helder Reis
Baixo: Paulo Godinho
Bateria: Vítor Mamede
Fotos: Rui Pacheco
Arranjo gráfico: Manuel Botelho
quinta-feira, 22 de novembro de 2007
ESCOLA EB 1 DA PÓVOA DA GALEGA
Vou lá de vez em quando visitar a minha amiga Ana França, visitar o espaço mágico que ela criou na Biblioteca da Escola.
Há escolas em que a magia acontece quando as pessoas despenteiam o dia-a-dia e desatam a trabalhar na margem de cá da alegria.
Sempre que lá passo levo poemas e histórias. Desta vez foram as "CANTIGAS & CANTIGOS" e "O DIA EM QUE O MAR DESAPARECEU". (Os pássaros bisnaus não descansam!)
Há escolas em que a magia acontece quando as pessoas despenteiam o dia-a-dia e desatam a trabalhar na margem de cá da alegria.
Sempre que lá passo levo poemas e histórias. Desta vez foram as "CANTIGAS & CANTIGOS" e "O DIA EM QUE O MAR DESAPARECEU". (Os pássaros bisnaus não descansam!)
terça-feira, 20 de novembro de 2007
ESCOLA EB 1 JI DO ALTO DO MOINHO, SEIXAL
Há escolas onde entramos e o trabalho feito pelos professores com os meninos é de tal qualidade que nos faz pensar que crescer pode ser uma coisa luminosa se nos deixarem voar em vez de nos criarem justificações, avaliações, reuniões e outras atrapalhações que matam a beleza do ensino no ovo.
Nem todas as escolas são assim tão capazes de contornar a burocracia cínica com que as querem estrangular. Nem todos os professores são assim tão disponíveis para o milagre que pode e devia ser sempre ensinar. Mas a Escola do Alto do Moinho no Seixal é comoventemente assim.
E foi comovido que fiquei ao entrar nesta Escola, ao falar com os meninos, ao partilhar com eles histórias, poemas e palavras, e ao ver o trabalho feito à volta de dois livros meus, "O DIA EM QUE O MAR DESAPARECEU" e "O DIA EM QUE A MATA ARDEU", onde se contam as maldades feitas por uma horrível família de pássaros Bisnaus.
Resolvi trazer para aqui as colagens de dois destes meninos que é uma forma pequenina de lhes agradecer a eles e aos professores o muito que me ofereceram a mim.
Nem todas as escolas são assim tão capazes de contornar a burocracia cínica com que as querem estrangular. Nem todos os professores são assim tão disponíveis para o milagre que pode e devia ser sempre ensinar. Mas a Escola do Alto do Moinho no Seixal é comoventemente assim.
E foi comovido que fiquei ao entrar nesta Escola, ao falar com os meninos, ao partilhar com eles histórias, poemas e palavras, e ao ver o trabalho feito à volta de dois livros meus, "O DIA EM QUE O MAR DESAPARECEU" e "O DIA EM QUE A MATA ARDEU", onde se contam as maldades feitas por uma horrível família de pássaros Bisnaus.
Resolvi trazer para aqui as colagens de dois destes meninos que é uma forma pequenina de lhes agradecer a eles e aos professores o muito que me ofereceram a mim.
segunda-feira, 19 de novembro de 2007
domingo, 18 de novembro de 2007
A SENHORA CONCEIÇÃO
A SENHORA CONCEIÇÃO
A senhora Conceição
é um pássaro remoto
um dinossauro espantado
incapaz de usar sapatos por medida.
A senhora Conceição
tem muita dificuldade
em ir a pé ao correio.
Tem duas galinhas
uma videira pequena
agriões
batatas
e uma dor nas costas já faz
para cima de dez anos.
A senhora Conceição
teve marido
e três filhos
todos vivos benza-os Deus.
A senhora Conceição
persiste de roupa preta
em volta dos coentros e dos cravos
e faz de cada couve-galega uma bandeira
na sua Sierra Maestra de 4 por 5 metros
a cheirar a rosmaninho.
A senhora Conceição
talvez não entenda nada do que eu digo
mas é para ela que eu digo
e penso
para que o seu sorriso bom
frutifique á margem da usura.
José Fanha, "Elogio dos peixes das pedras e dos simples"
A senhora Conceição
é um pássaro remoto
um dinossauro espantado
incapaz de usar sapatos por medida.
A senhora Conceição
tem muita dificuldade
em ir a pé ao correio.
Tem duas galinhas
uma videira pequena
agriões
batatas
e uma dor nas costas já faz
para cima de dez anos.
A senhora Conceição
teve marido
e três filhos
todos vivos benza-os Deus.
A senhora Conceição
persiste de roupa preta
em volta dos coentros e dos cravos
e faz de cada couve-galega uma bandeira
na sua Sierra Maestra de 4 por 5 metros
a cheirar a rosmaninho.
A senhora Conceição
talvez não entenda nada do que eu digo
mas é para ela que eu digo
e penso
para que o seu sorriso bom
frutifique á margem da usura.
José Fanha, "Elogio dos peixes das pedras e dos simples"
sexta-feira, 16 de novembro de 2007
LEITURAS
“As histórias completamente verídicas só interessam à polícia”
Jorge Semprún, “Vinte anos e um dia, Ed. Asa
“Conta-me uma história de amor, uma história oriental, uma bela história de amor, de ciúme, de sangue e de morte! Conta-me uma história, senão mato-te!”
Tahar Ben Jelloun, “Amores feiticeiros”, Ed. Cavalo de Ferro
“Como existia um mistério eu voltaria a ser homem, e não um homem qualquer, mas um ser atraído para o inexplicável pelo fio maravilhoso da poesia.”
Jesús Zárate, “A prisão”, Ed. Oicina do Livro
Jorge Semprún, “Vinte anos e um dia, Ed. Asa
“Conta-me uma história de amor, uma história oriental, uma bela história de amor, de ciúme, de sangue e de morte! Conta-me uma história, senão mato-te!”
Tahar Ben Jelloun, “Amores feiticeiros”, Ed. Cavalo de Ferro
“Como existia um mistério eu voltaria a ser homem, e não um homem qualquer, mas um ser atraído para o inexplicável pelo fio maravilhoso da poesia.”
Jesús Zárate, “A prisão”, Ed. Oicina do Livro
quinta-feira, 15 de novembro de 2007
quarta-feira, 14 de novembro de 2007
O PERIGO DA POESIA
“Um poema não serve para ganhar dinheiro mas serve para reorganizar o mundo”
Cornelius Castoriadis
Cornelius Castoriadis
segunda-feira, 12 de novembro de 2007
CONTRA A MINHA VONTADE
Contratado contra a minha vontade para a fábrica das ideias
recusei-me a assinar o ponto
Mobilizado mesmo assim para o exército das ideias
desertei
Nunca compreendi grande coisa
Não há grandes coisas
nem pequenas coisas
Há outras coisas
Outras coisas
são o que eu gosto o que me agrada
e o que eu faço
Jacques Prévert
(Tradução José Fanha)
recusei-me a assinar o ponto
Mobilizado mesmo assim para o exército das ideias
desertei
Nunca compreendi grande coisa
Não há grandes coisas
nem pequenas coisas
Há outras coisas
Outras coisas
são o que eu gosto o que me agrada
e o que eu faço
Jacques Prévert
(Tradução José Fanha)
UM PEIXE UMA HISTÓRIA
Às vezes ponho-me a misturar coisas e coisinhas e a colá-las assim como se deitasse a linha ao mar das imagens à procura de um peixe ou de uma história.
Ofício inquieto de quem só sabe fazer outras coisas.
Ofício inquieto de quem só sabe fazer outras coisas.
domingo, 11 de novembro de 2007
O ENSINO SEGUNDO GEORGE STEINER
“(Para se ser professor) É preciso ser-se um dador, ser-se um pouco louco, é preciso estar-se nu e não ter vergonha da nudez.”
George Steiner, “Quatro entrevistas com George Steiner”,
“A educação moderna cada vez se assemelha mais a uma amnésia institucionalizada. Deixa o espírito da criança vazio do peso das referências vividas. Substitui o saber de cor, que é também um saber do cor(ação), pelo caleidoscópio transitório dos saberes efémeros.”
George Steiner, “O silêncio dos livros”
“O mau ensino, a rotina pedagógica , esse tipo de instrução que, conscientemente ou não, é cínico nos seus objectivos puramente utilitários, é ruinosa. Arranca a esperança pela raiz.”
George Steiner, “As lições dos Mestres”
George Steiner, “Quatro entrevistas com George Steiner”,
“A educação moderna cada vez se assemelha mais a uma amnésia institucionalizada. Deixa o espírito da criança vazio do peso das referências vividas. Substitui o saber de cor, que é também um saber do cor(ação), pelo caleidoscópio transitório dos saberes efémeros.”
George Steiner, “O silêncio dos livros”
“O mau ensino, a rotina pedagógica , esse tipo de instrução que, conscientemente ou não, é cínico nos seus objectivos puramente utilitários, é ruinosa. Arranca a esperança pela raiz.”
George Steiner, “As lições dos Mestres”
“NÃO DEIXEM QUE OS ESTUDOS ESTRAGUEM A VOSSA EDUCAÇÃO”
“NÃO DEIXEM QUE OS ESTUDOS ESTRAGUEM A VOSSA EDUCAÇÃO”
esta frase foi dita por Pete Seeger, autor e cantor Folk e activista político americano, dirigindo-se aos estudantes numa visita à Faculdade de Letras de Lisboa em Dezembro de 1981.
Pete Seeger (n. 1919) é uma personagem lendária com muitos pontos em comum com o nosso Zeca Afonso. Foi preso nos anos 50 durante o macartismo, mas continuou a percorrer a América com as suas baladas e canções de protesto. Com Woody Guthrie constitui uma das principais influências da música e da poesia de Bob Dylan.
Em 1981 esteve em Lisboa. Tive a felicidade de o conhecer e falar com ele e com o Zeca no final de um concerto memorável no Pavilhão Carlos Lopes.
Recentemente estive a dizer poesia aos estudantes de português da Universidade de Rutgers, New Jersey. Portugueses, peruanos, mexicanos e americanos. Devolvi-lhes esta frase de Pete Seeger que me parece muito mais séria do que possa parecer à primeira vista.
esta frase foi dita por Pete Seeger, autor e cantor Folk e activista político americano, dirigindo-se aos estudantes numa visita à Faculdade de Letras de Lisboa em Dezembro de 1981.
Pete Seeger (n. 1919) é uma personagem lendária com muitos pontos em comum com o nosso Zeca Afonso. Foi preso nos anos 50 durante o macartismo, mas continuou a percorrer a América com as suas baladas e canções de protesto. Com Woody Guthrie constitui uma das principais influências da música e da poesia de Bob Dylan.
Em 1981 esteve em Lisboa. Tive a felicidade de o conhecer e falar com ele e com o Zeca no final de um concerto memorável no Pavilhão Carlos Lopes.
Recentemente estive a dizer poesia aos estudantes de português da Universidade de Rutgers, New Jersey. Portugueses, peruanos, mexicanos e americanos. Devolvi-lhes esta frase de Pete Seeger que me parece muito mais séria do que possa parecer à primeira vista.
MIA COUTO
"O mundo sabe
que, para ser belo
necessita ser escrito."
O POETA E A CIGARRA (Em "idades cidades divndades")
que, para ser belo
necessita ser escrito."
O POETA E A CIGARRA (Em "idades cidades divndades")
PEDRA A PEDRA
É uma pedra
cada frase amável
cada pensamento que me envia
o meu irmão sonhando.
Uma pedra cada verso cada gota de lua ou brilho
de ametista cada lágrima correndo
pelos troncos de uma selva
desventrada.
É uma pedra
a água que cai do céu
e a outra que desce das cordilheiras e beija
borboletas impossíveis.
É uma pedra
duas pedras pequeninas
o riso das minhas filhas.
E o abraço vertical de cada amigo.
E o beijo da mulher amada.
E juntando pedra a pedra
verso a verso
pensamento a pensamento
asa de pomba a peito de jaguar
vai acontecendo a casa do poema
do amor
da mesa posta
a casa onde cada pedra tem
uma longa história
para contar.
José Fanha
cada frase amável
cada pensamento que me envia
o meu irmão sonhando.
Uma pedra cada verso cada gota de lua ou brilho
de ametista cada lágrima correndo
pelos troncos de uma selva
desventrada.
É uma pedra
a água que cai do céu
e a outra que desce das cordilheiras e beija
borboletas impossíveis.
É uma pedra
duas pedras pequeninas
o riso das minhas filhas.
E o abraço vertical de cada amigo.
E o beijo da mulher amada.
E juntando pedra a pedra
verso a verso
pensamento a pensamento
asa de pomba a peito de jaguar
vai acontecendo a casa do poema
do amor
da mesa posta
a casa onde cada pedra tem
uma longa história
para contar.
José Fanha
sábado, 10 de novembro de 2007
O ARTUR DISSE
O Artur disse mais ou menos assim:
“Não suporto a arte conceptual. Quero que o artista me mostre imagens e me conte histórias, mesmo que eu não as entenda.”
Eu disse:
“Cá por mim, à filosofia prefiro a literatura. Vai muito mais fundo.”
E ficámos os dois de acordo.
“Não suporto a arte conceptual. Quero que o artista me mostre imagens e me conte histórias, mesmo que eu não as entenda.”
Eu disse:
“Cá por mim, à filosofia prefiro a literatura. Vai muito mais fundo.”
E ficámos os dois de acordo.
NOVA BIBLIOTECA NA ESCOLA SECUNDÁRIA LEAL DA CÂMARA
Quinta feira à noite foi a inauguração da nova Biblioteca na Escola Secundária Leal da Câmra, em Rio de Mouro, Concelho de Sintra com mais de cem pessoas entre alunos, pais, professores e convidados.Escusado será dizer que ver nascer uma biblioteca é mais uma pequena grande esperança de que cresça o prazer pela leitura e também a profundidade e espessura desse acto tão fantástico e ao mesmo tempo tão perigoso que é ler.
A festa foi muito especial. Começou com uma pequena e doce representação dos alunos da Escola dirigidos pelo Rui Mário do Grupo de Teatro Tapafuros.
Um egiptólogo, o Doutor José das Candeias Sales, falou da mãe de todas as bibliotecas que foi a Biblioteca de Alexandria. Uma bela lição a que se seguiu poesia e mais poesia que contou com a participação da minha querida amiga e excepcional declamadora que é a Elsa Noronha, comigo e com alunos, pais e professores que quiseram também dizer poesia, celebrar os seus poetas, lembrar as suas velhas paixões ou as suas descobertas recentes.
Eu, por mim, descobri com grande emoção um vasto grupo de jovens e professores que abraçaram há cerca de 6 meses a partilha da paixão pela poesia e que quiserem viver pela voz as palavras de Fernando Pessoa, Sophia, Jorge de Sena, Ruy Belo, Frederico Garcia Lorca e vários outros. Tudo isto também graças ao entusiasmo, alegria e dedicação da Professora Liliana Silva, responsável pela biblioteca.
De toda a noite o que mais me tocou e me ficou a aquecer a memória foi ver um jovem de de 17 anos a falar emocionado da recente descoberta da poesia de Lorca. Contou-nos como foi difícil lá chegar. Lorca não é fácil mas depois de conseguir abrir a porta... As coisas boas, digo eu, não têm de ser fáceis. A aprendizagem não tem de ser fácil. Mas depois de abrir a porta...
Eu já sabia, mas reforcei a certeza de que há gente por aí pronta a crescer, a transcender-se e a transformar o mundo e o nosso pequeno Portugal numa coisa muito mais habitável.
A festa foi muito especial. Começou com uma pequena e doce representação dos alunos da Escola dirigidos pelo Rui Mário do Grupo de Teatro Tapafuros.
Um egiptólogo, o Doutor José das Candeias Sales, falou da mãe de todas as bibliotecas que foi a Biblioteca de Alexandria. Uma bela lição a que se seguiu poesia e mais poesia que contou com a participação da minha querida amiga e excepcional declamadora que é a Elsa Noronha, comigo e com alunos, pais e professores que quiseram também dizer poesia, celebrar os seus poetas, lembrar as suas velhas paixões ou as suas descobertas recentes.
Eu, por mim, descobri com grande emoção um vasto grupo de jovens e professores que abraçaram há cerca de 6 meses a partilha da paixão pela poesia e que quiserem viver pela voz as palavras de Fernando Pessoa, Sophia, Jorge de Sena, Ruy Belo, Frederico Garcia Lorca e vários outros. Tudo isto também graças ao entusiasmo, alegria e dedicação da Professora Liliana Silva, responsável pela biblioteca.
De toda a noite o que mais me tocou e me ficou a aquecer a memória foi ver um jovem de de 17 anos a falar emocionado da recente descoberta da poesia de Lorca. Contou-nos como foi difícil lá chegar. Lorca não é fácil mas depois de conseguir abrir a porta... As coisas boas, digo eu, não têm de ser fáceis. A aprendizagem não tem de ser fácil. Mas depois de abrir a porta...
Eu já sabia, mas reforcei a certeza de que há gente por aí pronta a crescer, a transcender-se e a transformar o mundo e o nosso pequeno Portugal numa coisa muito mais habitável.
A POESIA DOS SONS COM RÃO KYAO
Sob o tema de A POESIA DOS SONS têm acontecido algumas conversas entre um poeta e alguns músicos amigos. em várias bibliotecas do Concelho de Mafra. Na Malveira, em Setembro, a conversa foi com Luís Pedro Fonseca, em Mafra, Outubro, foi com o Fernando Tordo, em Novembro será com o Rão Kyao na Ericeira como abaixo vem anunciado. Os lugares já estão quase todos reservados, por isso...
sexta-feira, 9 de novembro de 2007
CARTAS AO MEU FILHO (2)
Meu querido filho,
Um dia, quando eu te fiz a pergunta sacramental, o que é que queres ser quando fores grande?, tu respondeste-me muito tranquilamente que querias ser pintor.
Eu tremi. E é irónico um poeta a tremer, a temer, quando o filho lhe diz que também, à sua maneira, quer ser poeta. Eu tremi, meu filho. E sei porque é que tremi.
Percebi desde logo que tinhas escolhido o caminho mais belo e, se calhar, por isso mesmo, o mais difícil. Aquele que está mais afastado do mundo mecanicista em que vivemos. Aquele que te vai fazer voar até alturas impensáveis e mergulhar no mais fundo de ti e dos homens teus irmãos.
Vais trabalhar com as mais complexas matérias que habitam desde sempre o coração dos homens: os símbolos. Tu sabes, já sabes hoje, que os símbolos são as palavras e as formas que desde sempre nos permitiram dialogar com as nossas angústias e os nossos medos mais fundos. São as chaves que te permitirão entrar em terríveis e complexos labirintos cuja saída só tu poderás encontrar.
Mesmo assim, sabendo tudo isto, escolheste o caminho mais difícil, aquele que te vai trazer muito mais dúvidas que certezas, muito mais infinito que descontos para a reforma.
Vais trabalhar sem repartição nem horário. Levarás o teu ofício colado à pele para todo o lado. Não poderás fugir a essa febre. Tudo, a lágrima e a dor, a revolta e o júbilo, o pão e o vinho, a tua juventude e o teu envelhecimento, um corpo de mulher e um riso de criança, tudo te vai servir de matéria prima. Estás condenado a uma fantástica doença.
Tem sido um pouco assim a minha vida e, pelos vistos, à tua própria maneira, assim será a tua. Os teus passos vão levar-te a andar sempre e sempre à volta dessa fome de tudo ao mesmo tempo a que se chama Arte. Arte das palavras, das formas e das cores, da música, da dança. Arte. Tão incompreendida nesta sociedade que tudo quer reduzir ao pacote de margarina, ás pobres vedetas da televisão ou às modas que ainda mal o são e já deixaram de ser.
Não há dúvida de que escolheste o caminho mais difícil. Aquele que ninguém trilhou. Porque é o teu, só teu, e como dizia o poeta espanhol António Machado: “Caminhante, não há caminho/ faz-se o caminho ao andar.”
Vais esbarrar com muitas dificuldades e mais incompreensões. Vais sofrer na pele o ferrete de assistir ao êxito ribombante das vedetas descartáveis, dos opinosos iníquos, dos comerciantes de influências, dos fabricantes de “facas sem lâmina a que lhes falta o cabo”, como dizia o Alexandre O’Neill. Tudo isso vai acontecer enquanto tu atravessas as noites lutando contigo em busca de uma cor azul, de um perfil exacto, de uma grande harmonia ou de um imenso desacato.
Julgo que já não podes voltar atrás. Escolheste o caminho mais difícil. E, por isso, meu filho, estou cheio de orgulho em ti.
Um dia, quando eu te fiz a pergunta sacramental, o que é que queres ser quando fores grande?, tu respondeste-me muito tranquilamente que querias ser pintor.
Eu tremi. E é irónico um poeta a tremer, a temer, quando o filho lhe diz que também, à sua maneira, quer ser poeta. Eu tremi, meu filho. E sei porque é que tremi.
Percebi desde logo que tinhas escolhido o caminho mais belo e, se calhar, por isso mesmo, o mais difícil. Aquele que está mais afastado do mundo mecanicista em que vivemos. Aquele que te vai fazer voar até alturas impensáveis e mergulhar no mais fundo de ti e dos homens teus irmãos.
Vais trabalhar com as mais complexas matérias que habitam desde sempre o coração dos homens: os símbolos. Tu sabes, já sabes hoje, que os símbolos são as palavras e as formas que desde sempre nos permitiram dialogar com as nossas angústias e os nossos medos mais fundos. São as chaves que te permitirão entrar em terríveis e complexos labirintos cuja saída só tu poderás encontrar.
Mesmo assim, sabendo tudo isto, escolheste o caminho mais difícil, aquele que te vai trazer muito mais dúvidas que certezas, muito mais infinito que descontos para a reforma.
Vais trabalhar sem repartição nem horário. Levarás o teu ofício colado à pele para todo o lado. Não poderás fugir a essa febre. Tudo, a lágrima e a dor, a revolta e o júbilo, o pão e o vinho, a tua juventude e o teu envelhecimento, um corpo de mulher e um riso de criança, tudo te vai servir de matéria prima. Estás condenado a uma fantástica doença.
Tem sido um pouco assim a minha vida e, pelos vistos, à tua própria maneira, assim será a tua. Os teus passos vão levar-te a andar sempre e sempre à volta dessa fome de tudo ao mesmo tempo a que se chama Arte. Arte das palavras, das formas e das cores, da música, da dança. Arte. Tão incompreendida nesta sociedade que tudo quer reduzir ao pacote de margarina, ás pobres vedetas da televisão ou às modas que ainda mal o são e já deixaram de ser.
Não há dúvida de que escolheste o caminho mais difícil. Aquele que ninguém trilhou. Porque é o teu, só teu, e como dizia o poeta espanhol António Machado: “Caminhante, não há caminho/ faz-se o caminho ao andar.”
Vais esbarrar com muitas dificuldades e mais incompreensões. Vais sofrer na pele o ferrete de assistir ao êxito ribombante das vedetas descartáveis, dos opinosos iníquos, dos comerciantes de influências, dos fabricantes de “facas sem lâmina a que lhes falta o cabo”, como dizia o Alexandre O’Neill. Tudo isso vai acontecer enquanto tu atravessas as noites lutando contigo em busca de uma cor azul, de um perfil exacto, de uma grande harmonia ou de um imenso desacato.
Julgo que já não podes voltar atrás. Escolheste o caminho mais difícil. E, por isso, meu filho, estou cheio de orgulho em ti.
domingo, 4 de novembro de 2007
ALEX PONTO COM - AVENTURAS VIRTUAIS
Mais um livro. É o 5º publicado nos últimos 3 meses! Para jovens a partir dos 10 anos. As ilustrações são do João-meu filho-Fanha. É o segundo volume de umas aventuras que me divertem muito. No primeiro, o Alex caiu dentro do computador. Neste segundo:
"O simpático Joe Silicone está de volta. Resolveu visitar Alex e os seus amigos.
Foi ele quem os acompanhou na primeira aventura desta série, quando todos caíram no mundo virtual e foram jogar ao vivo um perigosíssimo jogo comandado pela maléfica Maspúcia.
O problema é que Joe Silicone é um ser virtual com vários problemas de adaptação ao mundo real.
Pode mudar de tamanho e tornar-se enorme ou muito pequeno, sai pelas janelas, alimenta-se de gigabytes, causa inúmeros desarranjos e desatinos.
O pior, no entanto, é que quando passou do mundo virtual ao mundo real deixando um caminho aberto por onde chega Maspúcia com o seu exército de Esqueletos Bailarinos, aranhas gigantes e toda uma série de seres sem sentimentos e prontos a destruir tudo em seu redor.
Joe Silicone, Alex e o seu grupo de amigos vão ter de enfrentar um desafio assustador e quase desesperado onde, mesmo assim, ainda há espaço para o nascimento do afecto e do amor."
"O simpático Joe Silicone está de volta. Resolveu visitar Alex e os seus amigos.
Foi ele quem os acompanhou na primeira aventura desta série, quando todos caíram no mundo virtual e foram jogar ao vivo um perigosíssimo jogo comandado pela maléfica Maspúcia.
O problema é que Joe Silicone é um ser virtual com vários problemas de adaptação ao mundo real.
Pode mudar de tamanho e tornar-se enorme ou muito pequeno, sai pelas janelas, alimenta-se de gigabytes, causa inúmeros desarranjos e desatinos.
O pior, no entanto, é que quando passou do mundo virtual ao mundo real deixando um caminho aberto por onde chega Maspúcia com o seu exército de Esqueletos Bailarinos, aranhas gigantes e toda uma série de seres sem sentimentos e prontos a destruir tudo em seu redor.
Joe Silicone, Alex e o seu grupo de amigos vão ter de enfrentar um desafio assustador e quase desesperado onde, mesmo assim, ainda há espaço para o nascimento do afecto e do amor."
sábado, 3 de novembro de 2007
POUCOS MAS BONS
Recordo frequentemente a amizade e companheirismo que me uniram e unem ao Carlos Paredes, quer do convívio entre palcos, algumas viagens e espectáculos quer de um tempo em que jantávamos juntos com alguma frequência ali para as bandas de Benfica.
Em baixo uma fotografia na Casa do Alentejo em Lisboa com um outro querido amigo que foi o actor Rogério Paulo.
Hoje relembro do Carlos Paredes esta pequena história que nunca esquecerei.Íamos fazer uma sessão de música e poesia em Vendas Novas, segundo creio. Era domingo, almoçámos umas migas pelo caminho e, quando chegámos, só tínhamos um funcionário da Câmara Municipal para nos abrir o velho Cine-Teatro. Era improvável aparecer público para nos ver, disse-nos ele, porque o sector da Câmara que devia noticiar e divulgar o acontecimento se tinha esquecido de o fazer. Apareceram mesmo assim cerca de 10 pessoas. Não chegavam para encher a primeira fila de uma imensa plateia que teria umas centenas de lugares horrivelmente vazios.
Dizer poesia para uma imensa sala vazia é um arrepio. Eu estava gelado e sugeri ao Paredes que desistíssemos daquela sessão e combinássemos com a Câmara Municipal fazê-la noutra data."Então e estes, amigo Fanha?", perguntou-me o Paredes, apontando para os pouquíssimos presentes. "Estão cá para nos ver, não estão? São poucos mas bons! Vamos a eles!"E o Paredes tocou com o entusiasmo e o empenho com que tocaria numa daquelas grandes salas de concertos da Europa onde também levava a sua maravilhosa arte.
Depois desta grande lição que o Paredes me deu nunca mais pensei em desistir de um compromisso para dizer poesia, nem que tenha apenas um espectador.
Em baixo uma fotografia na Casa do Alentejo em Lisboa com um outro querido amigo que foi o actor Rogério Paulo.
Hoje relembro do Carlos Paredes esta pequena história que nunca esquecerei.Íamos fazer uma sessão de música e poesia em Vendas Novas, segundo creio. Era domingo, almoçámos umas migas pelo caminho e, quando chegámos, só tínhamos um funcionário da Câmara Municipal para nos abrir o velho Cine-Teatro. Era improvável aparecer público para nos ver, disse-nos ele, porque o sector da Câmara que devia noticiar e divulgar o acontecimento se tinha esquecido de o fazer. Apareceram mesmo assim cerca de 10 pessoas. Não chegavam para encher a primeira fila de uma imensa plateia que teria umas centenas de lugares horrivelmente vazios.
Dizer poesia para uma imensa sala vazia é um arrepio. Eu estava gelado e sugeri ao Paredes que desistíssemos daquela sessão e combinássemos com a Câmara Municipal fazê-la noutra data."Então e estes, amigo Fanha?", perguntou-me o Paredes, apontando para os pouquíssimos presentes. "Estão cá para nos ver, não estão? São poucos mas bons! Vamos a eles!"E o Paredes tocou com o entusiasmo e o empenho com que tocaria numa daquelas grandes salas de concertos da Europa onde também levava a sua maravilhosa arte.
Depois desta grande lição que o Paredes me deu nunca mais pensei em desistir de um compromisso para dizer poesia, nem que tenha apenas um espectador.
sexta-feira, 2 de novembro de 2007
RAÚL SOLNADO
Há pessoas com quem nos cruzamos ao longo da vida. Pessoas que nos marcam muito mesmo que o nosso convívio não seja sempre muito intenso.Comigo tem sido o caso do Raúl Solnado.
A fotografia abaixo é das filmagens de "Querido avô", uma série da RTP (1997) que eu escrevi e em que o Raúl era o magnífico personagem principal, um avô cheio de ternura, de poesia e de alguma saudável irresponsabilidade que arrastava e deixa-se arrastar pelo neto para aventuras muito pouco converncionais. Era um avô exactamente como eu, como nós todos gostaríamos de ter tido.
A série não teve grande impacto na altura. Não recordo mas talvez tenha passado nalgum horário menos nobre. Ou terá tido pouca divulgação. Coisas comuns nas televisões quando se trata de produtos mais delicados e menos vazios.
É pena. Era uma delícia. Divertimo-nos muito a fazer o "Querido avô". E creio que quem teve oportunidade de ver também se deve ter divertido bastante.Contava ainda com a participação do Ricardo Carriço, da Rita Salema e do Duarte que fazia o neto traquinas. Uma bela equipa em que participava ainda a Ângela Pinto.
Mas hoje quero, sobretudo, lembrar o Raúl Solnado. Porque trabalhar com o Raúl é uma festa. Ser amigo do Raúl é um luxo.
A fotografia abaixo é das filmagens de "Querido avô", uma série da RTP (1997) que eu escrevi e em que o Raúl era o magnífico personagem principal, um avô cheio de ternura, de poesia e de alguma saudável irresponsabilidade que arrastava e deixa-se arrastar pelo neto para aventuras muito pouco converncionais. Era um avô exactamente como eu, como nós todos gostaríamos de ter tido.
A série não teve grande impacto na altura. Não recordo mas talvez tenha passado nalgum horário menos nobre. Ou terá tido pouca divulgação. Coisas comuns nas televisões quando se trata de produtos mais delicados e menos vazios.
É pena. Era uma delícia. Divertimo-nos muito a fazer o "Querido avô". E creio que quem teve oportunidade de ver também se deve ter divertido bastante.Contava ainda com a participação do Ricardo Carriço, da Rita Salema e do Duarte que fazia o neto traquinas. Uma bela equipa em que participava ainda a Ângela Pinto.
Mas hoje quero, sobretudo, lembrar o Raúl Solnado. Porque trabalhar com o Raúl é uma festa. Ser amigo do Raúl é um luxo.
quinta-feira, 1 de novembro de 2007
O DIA EM QUE A MATA ARDEU
Começa assim:
"No sítio em que eu moro, um pouco mais à frente, quando acabam as ruas e as casas, começa uma mata que gosto muito de visitar. Ali, tudo é bonito e verde, e eu até costumo dizer que é a minha mata.Minha, minha, não é. Isto é só uma maneira de dizer... Como toda a gente sabe, a Natureza não tem dono."
Depois vai chegar a família dos pássaros Bisnaus...
"Veio o pai Bisnau que tinha cara de mau e cuspia para o chão.A mãe Bisnau, D. Bisnuca que era embirrenta, gosmenta e muitíssimo zaruca.A filha Bisnica, estica-larica, que pintava o bico de verniz e passava o dia a tirar macacos do nariz.E o filho Bisneco que comia até rebentar e ficava como uma bola a rebolçar."
Fizeram tantas que até conseguiram pegar fogo à mata. À "minha" mata!
E é desse desatre que este livrinho trata. Edição da Gailivro. Ilustrações da minha amiga Maria João Gromicho. Uma delícia.
"No sítio em que eu moro, um pouco mais à frente, quando acabam as ruas e as casas, começa uma mata que gosto muito de visitar. Ali, tudo é bonito e verde, e eu até costumo dizer que é a minha mata.Minha, minha, não é. Isto é só uma maneira de dizer... Como toda a gente sabe, a Natureza não tem dono."
Depois vai chegar a família dos pássaros Bisnaus...
"Veio o pai Bisnau que tinha cara de mau e cuspia para o chão.A mãe Bisnau, D. Bisnuca que era embirrenta, gosmenta e muitíssimo zaruca.A filha Bisnica, estica-larica, que pintava o bico de verniz e passava o dia a tirar macacos do nariz.E o filho Bisneco que comia até rebentar e ficava como uma bola a rebolçar."
Fizeram tantas que até conseguiram pegar fogo à mata. À "minha" mata!
E é desse desatre que este livrinho trata. Edição da Gailivro. Ilustrações da minha amiga Maria João Gromicho. Uma delícia.
domingo, 21 de outubro de 2007
EU SOU PORTUGUÊS AQUI
Foi na "Visita da Cornélia", Agosto de 77, que declamei pela primeira este poema que tem sido uma ponte calorosa com tanta, tanta gente.
EU SOU PORTUGUÊS AQUI
Eu sou português
aqui
em terra e fome talhado
feito de barro e carvão
rasgado pelo vento norte
amante certo da morte
no silêncio da agressão.
Eu sou português
aqui
mas nascido deste lado
do lado de cá da vida
do lado do sofrimento
da miséria repetida
do pé descalço
do vento.
Nasci
deste lado da cidade
nesta margem
no meio da tempestade
durante o reino do medo.
Sempre a apostar na viagem
quando os frutos amargavam
e o luar sabia a azedo.
Eu sou português
aqui
no teatro mentiroso
mas afinal verdadeiro
na finta fácil
no gozo
no sorriso doloroso
no gingar de um marinheiro.
Nasci
deste lado da ternura
do coração esfarrapado
eu sou filho da aventura
da anedota
do acaso
campeão do improviso
trago as mãos sujas do sangue
que empapa a terra que piso.
Eu sou português
aqui
na brilhantina em que embrulho
do alto da minha esquina
a conversa e a borrasca
eu sou filho do sarilho
no gesto desmesurado
nos cordéis do desenrasca.
Nasci
aqui
no mês de Abril
quando esqueci toda a saudade
e comecei a inventar
em cada gesto
a liberdade.
Nasci
aqui
ao pé do mar
de uma garganta magoada no cantar.
Eu sou a festa
inacabada
quase ausente
eu sou a briga
a luta antiga
renovada
ainda urgente.
Eu sou português
aqui
o português sem mestre
mas com jeito.
Eu sou português
aqui
e trago o mês de Abril
a voar
dentro do peito.
EU SOU PORTUGUÊS AQUI
Eu sou português
aqui
em terra e fome talhado
feito de barro e carvão
rasgado pelo vento norte
amante certo da morte
no silêncio da agressão.
Eu sou português
aqui
mas nascido deste lado
do lado de cá da vida
do lado do sofrimento
da miséria repetida
do pé descalço
do vento.
Nasci
deste lado da cidade
nesta margem
no meio da tempestade
durante o reino do medo.
Sempre a apostar na viagem
quando os frutos amargavam
e o luar sabia a azedo.
Eu sou português
aqui
no teatro mentiroso
mas afinal verdadeiro
na finta fácil
no gozo
no sorriso doloroso
no gingar de um marinheiro.
Nasci
deste lado da ternura
do coração esfarrapado
eu sou filho da aventura
da anedota
do acaso
campeão do improviso
trago as mãos sujas do sangue
que empapa a terra que piso.
Eu sou português
aqui
na brilhantina em que embrulho
do alto da minha esquina
a conversa e a borrasca
eu sou filho do sarilho
no gesto desmesurado
nos cordéis do desenrasca.
Nasci
aqui
no mês de Abril
quando esqueci toda a saudade
e comecei a inventar
em cada gesto
a liberdade.
Nasci
aqui
ao pé do mar
de uma garganta magoada no cantar.
Eu sou a festa
inacabada
quase ausente
eu sou a briga
a luta antiga
renovada
ainda urgente.
Eu sou português
aqui
o português sem mestre
mas com jeito.
Eu sou português
aqui
e trago o mês de Abril
a voar
dentro do peito.
quinta-feira, 18 de outubro de 2007
A VISITA DA CORNÉLIA
Em 1977, está agora a fazer 30 anos, eu tinha 26 anos e participei num concurso de televisão muito, muito popular. Chamava-se “A Visita da Cornélia”.
O concurso tinha sido inventado pelo Zé Fialho Gouveia e pelo Raul Solnado. E era tão popular que até tinha uma revista todas as semanas, a “Vacavisão”.
Cada concorrente tinha um par. O meu par era a minha amiga Alice Brito.
Cada par tinha de cumprir 10 provas. Algumas eram provas criativas como dança, teatro, quadra, texto sob um tema, canção. Essas provas eram pontuadas por um júri que era formado pelo Raul Calado, a Maria João Seixas, o Luís de Sttau Monteiro, a Maria Leonor e o Paulo Renato.
Havia outras provas que não eram criativas e não tinham de ser pontuadas pelo júri: como deitar bonecos a baixo com bolas de pano, responder a perguntas sobre um romance que era obrigatório ler com antecedência, descobrir diferenças entre dois desenhos aparentemente iguais, etc.
O concorrente mais bem pontuado ia para um podium e ali ficava semana após semana até que outros concorressem tivessem maior pontuação e os tirassem de lá. Fiquei 13 semanas no podium. Por isso toda a gente na rua me conhecia e vinha falar comigo. Eu era uma vedeta. Mas ser vedeta tem vantagens e desvantagens. Um dia destes conto o resto.
O concurso tinha sido inventado pelo Zé Fialho Gouveia e pelo Raul Solnado. E era tão popular que até tinha uma revista todas as semanas, a “Vacavisão”.
Cada concorrente tinha um par. O meu par era a minha amiga Alice Brito.
Cada par tinha de cumprir 10 provas. Algumas eram provas criativas como dança, teatro, quadra, texto sob um tema, canção. Essas provas eram pontuadas por um júri que era formado pelo Raul Calado, a Maria João Seixas, o Luís de Sttau Monteiro, a Maria Leonor e o Paulo Renato.
Havia outras provas que não eram criativas e não tinham de ser pontuadas pelo júri: como deitar bonecos a baixo com bolas de pano, responder a perguntas sobre um romance que era obrigatório ler com antecedência, descobrir diferenças entre dois desenhos aparentemente iguais, etc.
O concorrente mais bem pontuado ia para um podium e ali ficava semana após semana até que outros concorressem tivessem maior pontuação e os tirassem de lá. Fiquei 13 semanas no podium. Por isso toda a gente na rua me conhecia e vinha falar comigo. Eu era uma vedeta. Mas ser vedeta tem vantagens e desvantagens. Um dia destes conto o resto.
PROENÇA-A-NOVA
Portugal é um país de grandes contrastes. Se ao abrir uma porta ainda podemos encontrar gente a viver no séc. XIX, na porta do lado podemos já respirar o ar dos séculos que estão para vir.
É o que acontece em Proença-a-Nova com o Centro de Ciência Viva da Floresta. Um edfício encantador com museu interactivo de ciência da floresta, uma equipa apaixonada pelo trabalho que faz, uma Câmara orgulhosa de poder oferecer à sua população, e não só, um equipamento tão como este.
É o que acontece em Proença-a-Nova com o Centro de Ciência Viva da Floresta. Um edfício encantador com museu interactivo de ciência da floresta, uma equipa apaixonada pelo trabalho que faz, uma Câmara orgulhosa de poder oferecer à sua população, e não só, um equipamento tão como este.
No meio, um auditório mesmo bom para contar histórias que foi o que eu lá fui fazer. A meninos e a pais. As histórias casam bem com a natureza, com os seus habitantes, com as suas forças vitais, com aqueles que querem aprender a respeitá-las
Foi bom.
Trouxe de lá alguns dos belos marcadores de livros ali editados com o perfil das folhas das principais árvores existentes em Portugal. Estão aqui em baixo. São um mimo.
EÇA AGORA
Depois de "OS NOVOS MISTÉRIOS DE SINTRA" e de "O CÓDIGO d'AVINTES, os sete voltam a atacar. Desta vez...
Tudo começa no Alegrete, palacete meio arruinado em que vive Afonso da Maia, avô de Carlos da Maia, jovem médico que se vai apaixonar por Maria Hermengarda, fugindo dos ataques sensuais da Condessa de Varinho e deixando de lado a espampanante Lara Marlene, filha do riquíssimo Silvestre do Ó Saraiva, construtor civil que fez a sua larga fortuna por métodos muito pouco recomendáveis.À volta de Carlos movimentam-se João da Régua, o novíssimo rico damário malcede, Honório Borralho, o eterno futuro-ministro, Palma Cavalito, director da "Trombeta do Demónio", e muitas outras personagens mais ou menos descendentes dos seus antecedentes nos famosos “Maias” que se movimentam efervescentemente numa crónica de costumes ao gosto deste tempo prodigioso do replay e do fast food.No meio da confusão é o próprio Eça de Queiroz que, por via do seu fantasma, vem tentar pôr alguma ordem entre personagens e autores.
Tudo começa no Alegrete, palacete meio arruinado em que vive Afonso da Maia, avô de Carlos da Maia, jovem médico que se vai apaixonar por Maria Hermengarda, fugindo dos ataques sensuais da Condessa de Varinho e deixando de lado a espampanante Lara Marlene, filha do riquíssimo Silvestre do Ó Saraiva, construtor civil que fez a sua larga fortuna por métodos muito pouco recomendáveis.À volta de Carlos movimentam-se João da Régua, o novíssimo rico damário malcede, Honório Borralho, o eterno futuro-ministro, Palma Cavalito, director da "Trombeta do Demónio", e muitas outras personagens mais ou menos descendentes dos seus antecedentes nos famosos “Maias” que se movimentam efervescentemente numa crónica de costumes ao gosto deste tempo prodigioso do replay e do fast food.No meio da confusão é o próprio Eça de Queiroz que, por via do seu fantasma, vem tentar pôr alguma ordem entre personagens e autores.
quarta-feira, 17 de outubro de 2007
quinta-feira, 11 de outubro de 2007
SWEENY TODD
Estreou-se ontem e é um espectáculo excepcional.
Participei fazendo a versão para português.
Foi dos trabalhos mais difíceis que já fiz mas valeu a pena porque é sempre bom trabalhar com o João Lourenço e a Vera San Payo Lemos e com eles tenho a certeza de que o rigor e a exigência proporcionam grandes espectáculos de Teatro.
Participei fazendo a versão para português.
Foi dos trabalhos mais difíceis que já fiz mas valeu a pena porque é sempre bom trabalhar com o João Lourenço e a Vera San Payo Lemos e com eles tenho a certeza de que o rigor e a exigência proporcionam grandes espectáculos de Teatro.
terça-feira, 9 de outubro de 2007
ZULAIDA E O POETA
Livro acabadinho de sair. E bonito graças às ilustrações da Inês Maçano
Duas histórias de amor e uma de Natal.
- A Histórias dan Rainha das sombras que um dia viu desaparecer a sua própria sombra.
- A história de Zulaida que foi salva da clausura pelo amor de um poeta e pela força do seu canto.
- A história de Benjamim o passarinheiro, que acreditava em coisas impossíveis.
Também eu acredito em coisas impossíveis. Já tinha idade para ter juízo, dirão. Mas as palavras não me deixam descolar-me deste lado de cá da vida onde vivem as histórias.
Duas histórias de amor e uma de Natal.
- A Histórias dan Rainha das sombras que um dia viu desaparecer a sua própria sombra.
- A história de Zulaida que foi salva da clausura pelo amor de um poeta e pela força do seu canto.
- A história de Benjamim o passarinheiro, que acreditava em coisas impossíveis.
Também eu acredito em coisas impossíveis. Já tinha idade para ter juízo, dirão. Mas as palavras não me deixam descolar-me deste lado de cá da vida onde vivem as histórias.
domingo, 7 de outubro de 2007
CARTAS AO MEU FILHO (1)
Meu querido filho,
Estou há tempos para te escrever mas a vida, sabes como é, inventa mil tropeços e os dias vão passando e, de repente, vou para te sentar ao colo e dar-te a sopa quente quando me apercebo de que tu até já tens barba e és um homem.
Digamos que estou numa daquelas idades em que se tem a presunção de saber meia dúzia de coisas bem sabidas. No entanto, aqui entre nós, quantas vezes já vi surgir uma rajada de vento que nos derruba as certezas e, no lugar delas, deixa um monte de dúvidas e perguntas.
É neste fazer e desfazer que a vida tem tanto de terrível como de maravilhoso, tal e qual o grande mar que lá numa funda oficina de algas e espuma vai construindo os seus fantásticos universos de calcário.
Já devo estar a armar-me em poeta. Pelo menos é o que eu penso que tu pensas. E, além disso, eu vinha para te falar de outra coisa.
Vinha para te falar do momento forte e largo em que nasceste.
Era domingo. Eu sabia que estava para acontecer um tremor de terra na minha vida. Mas não lhe adivinhava a força nem o quanto ele ia rasgar-me e acrescentar-me.
Eu tinha 20 e tal anos e era eterno. Melhor dizendo, eu sabia que todos nós envelhecemos e morremos. Mas nessa altura era eterno. Já tinha sentido o bafo da morte nos meus braços onde a minha linda avó deitara a cabeça, cansada de respirar. Mas apesar de tudo era longe dos meus ossos jovens que a morte passara. A velhice ficava a uma distância muito grande e eu era definitivamente eterno.
Era domingo, portanto, quando tu chegaste. Eras um corpinho vermelho em cima de panos verdes, o maior acordo e desacordo que já vi em toda a minha vida.
Eras um grito de mundo a rebentar, um grito chegado do mais fundo do sangue e da Terra, o grito vermelho e verde da tremenda violência que é começar a respirar.
E eu chorei e chorei, como só um homem pode chorar quando lhe nasce um filho. E nem tinha mãos que te agarrassem. E nem palavras porque não as há quando tudo é um vulcão que desata a explodir pela primeira vez e o universo começa a inchar e a correr em todas as direcções.
Fiquei pequenino, vaca e burro de Presépio a olhar para ti. Recolhi-te na côncava do coração e lá ficaste para sempre, enquanto as estações corriam e correm mudando o lugar dos dentes e fazendo nascer uma e outra e outra vez a flor irrepetível.
Agora, de repente, já tens barba e um incêndio de ideias a romper nos olhos e queres ser um homem inteiro, um artista, uma ave, um cidadão de pé nos braços da dignidade, e amas uma menina, uma mulher como tu, e eu digo Boa Viagem e parece que foi ontem o dia em que chegaste e eu perdi para sempre a eternidade.
Estou há tempos para te escrever mas a vida, sabes como é, inventa mil tropeços e os dias vão passando e, de repente, vou para te sentar ao colo e dar-te a sopa quente quando me apercebo de que tu até já tens barba e és um homem.
Digamos que estou numa daquelas idades em que se tem a presunção de saber meia dúzia de coisas bem sabidas. No entanto, aqui entre nós, quantas vezes já vi surgir uma rajada de vento que nos derruba as certezas e, no lugar delas, deixa um monte de dúvidas e perguntas.
É neste fazer e desfazer que a vida tem tanto de terrível como de maravilhoso, tal e qual o grande mar que lá numa funda oficina de algas e espuma vai construindo os seus fantásticos universos de calcário.
Já devo estar a armar-me em poeta. Pelo menos é o que eu penso que tu pensas. E, além disso, eu vinha para te falar de outra coisa.
Vinha para te falar do momento forte e largo em que nasceste.
Era domingo. Eu sabia que estava para acontecer um tremor de terra na minha vida. Mas não lhe adivinhava a força nem o quanto ele ia rasgar-me e acrescentar-me.
Eu tinha 20 e tal anos e era eterno. Melhor dizendo, eu sabia que todos nós envelhecemos e morremos. Mas nessa altura era eterno. Já tinha sentido o bafo da morte nos meus braços onde a minha linda avó deitara a cabeça, cansada de respirar. Mas apesar de tudo era longe dos meus ossos jovens que a morte passara. A velhice ficava a uma distância muito grande e eu era definitivamente eterno.
Era domingo, portanto, quando tu chegaste. Eras um corpinho vermelho em cima de panos verdes, o maior acordo e desacordo que já vi em toda a minha vida.
Eras um grito de mundo a rebentar, um grito chegado do mais fundo do sangue e da Terra, o grito vermelho e verde da tremenda violência que é começar a respirar.
E eu chorei e chorei, como só um homem pode chorar quando lhe nasce um filho. E nem tinha mãos que te agarrassem. E nem palavras porque não as há quando tudo é um vulcão que desata a explodir pela primeira vez e o universo começa a inchar e a correr em todas as direcções.
Fiquei pequenino, vaca e burro de Presépio a olhar para ti. Recolhi-te na côncava do coração e lá ficaste para sempre, enquanto as estações corriam e correm mudando o lugar dos dentes e fazendo nascer uma e outra e outra vez a flor irrepetível.
Agora, de repente, já tens barba e um incêndio de ideias a romper nos olhos e queres ser um homem inteiro, um artista, uma ave, um cidadão de pé nos braços da dignidade, e amas uma menina, uma mulher como tu, e eu digo Boa Viagem e parece que foi ontem o dia em que chegaste e eu perdi para sempre a eternidade.
sexta-feira, 5 de outubro de 2007
29 ANOS DE DIFERENÇA E SEMPRE A POESIA
Mão amiga enviou-me estas duas imagens. E foi a mesma mão que as tirou às duas com 29 anos de diferença. Ambas no Porto. No meio, dores e tristezas, alegrias, pequenos naufrágios, grandes sonhos, os amigos, os afectos, a vida. E a poesia. Sempre.
segunda-feira, 1 de outubro de 2007
CANTIGAS & CANTIGOS
CANTIGA FELINA
Eu sou uma gata gatona gatinha
pequena ladina
feroz e feliz e felina.
Eu sou uma gata que come fanecas e figos
Feijão e favona e favinha
e….
comigo ninguém faz farinha!
Eu sou uma gata gatona gatinha
facira furtiva
fadista fiel e festiva.
Eu sou uma gata que foge da fúria do fogo
fanhosa felpuda fininha
e…
comigo ninguém faz farinha!
Eu sou uma gata gatona gatinha
uma bela figura
que fala que funga e que fura.
Eu sou uma gata que veste um fatinho forrado
com fita fivela e fitinha.
comigo ninguém faz farinha!
Eu sou uma gata gatona gatinha
pequena ladina
feroz e feliz e felina.
Eu sou uma gata que come fanecas e figos
Feijão e favona e favinha
e….
comigo ninguém faz farinha!
Eu sou uma gata gatona gatinha
facira furtiva
fadista fiel e festiva.
Eu sou uma gata que foge da fúria do fogo
fanhosa felpuda fininha
e…
comigo ninguém faz farinha!
Eu sou uma gata gatona gatinha
uma bela figura
que fala que funga e que fura.
Eu sou uma gata que veste um fatinho forrado
com fita fivela e fitinha.
comigo ninguém faz farinha!
sábado, 29 de setembro de 2007
OS MEUS AMIGOS MARCADORES
Ler inclui um vasto conjunto de práticas que variam de época para época, de local para local, de pessoa para pessoa.
Cada um lê de uma maneira própria…
No meio da sala, num cantinho escondido, numa mesa de café, no autocarro, na biblioteca, na cama.
Mas também…
Junto à lareira no Inverno, no meio da verdura inebriante de um jardim na primavera, no fresco da brisa nocturna no Verão.
Ou ainda…
De pé, sentado, de pernas para o ar, deitado.
Porventura…
De dia, de tarde de noite.
Por vezes…
A tomar chá ou café, a beber uma cerveja, a comer amendoins.
Eventualmente…
Vestido de fato e gravata, de fato de treino, de calções, de pijama.
Alguns…
Com um lápis ruído na mão ou a torcer e retorcer uma ponta de cabelo.
Todos nós temos os nossos rituais de leitura e os nossos auxiliares. De entre os muitos auxiliares de leitura possíveis gosto de nomear o marcador.
Há quem o use apenas para cumprir uma função: marcar a página em que se parou a leitura sem ter que a dobrar ou danificar.
Mas o marcador traz consigo uma mensagem. É colorido ou sombrio. Reproduz uma obra de arte. Traz um desenho. Fala por vezes de outro livro.
O marcador é um amigo, uma espécie de mediador entre nós, o livro que lemos e o próprio acto de leitura. O marcador acaba por falar connosco, acrescentando um “ruído” de fundo aquele maravilhoso acto de ler em solidão.
Adoro marcadores. São amigos que não dispenso neste vício bom que é ler. Como quem escolhe a gravata que fique bem com uma determinada camisa, ou uma camisa que fique bem com um determinado fato, escolho cuidadosamente para cada livro que vou ler, o marcador que “lhe vai bem”.
Tenho a certeza de que o mundo fica mais feliz quando procuramos equilíbrio entre as coisas. Por isso, a escolha de uma coisa tão simples como um marcador pode ser um acto arbitrário uma atitude estética e ética como, no fundo, são todas as escolhas.
Cada um lê de uma maneira própria…
No meio da sala, num cantinho escondido, numa mesa de café, no autocarro, na biblioteca, na cama.
Mas também…
Junto à lareira no Inverno, no meio da verdura inebriante de um jardim na primavera, no fresco da brisa nocturna no Verão.
Ou ainda…
De pé, sentado, de pernas para o ar, deitado.
Porventura…
De dia, de tarde de noite.
Por vezes…
A tomar chá ou café, a beber uma cerveja, a comer amendoins.
Eventualmente…
Vestido de fato e gravata, de fato de treino, de calções, de pijama.
Alguns…
Com um lápis ruído na mão ou a torcer e retorcer uma ponta de cabelo.
Todos nós temos os nossos rituais de leitura e os nossos auxiliares. De entre os muitos auxiliares de leitura possíveis gosto de nomear o marcador.
Há quem o use apenas para cumprir uma função: marcar a página em que se parou a leitura sem ter que a dobrar ou danificar.
Mas o marcador traz consigo uma mensagem. É colorido ou sombrio. Reproduz uma obra de arte. Traz um desenho. Fala por vezes de outro livro.
O marcador é um amigo, uma espécie de mediador entre nós, o livro que lemos e o próprio acto de leitura. O marcador acaba por falar connosco, acrescentando um “ruído” de fundo aquele maravilhoso acto de ler em solidão.
Adoro marcadores. São amigos que não dispenso neste vício bom que é ler. Como quem escolhe a gravata que fique bem com uma determinada camisa, ou uma camisa que fique bem com um determinado fato, escolho cuidadosamente para cada livro que vou ler, o marcador que “lhe vai bem”.
Tenho a certeza de que o mundo fica mais feliz quando procuramos equilíbrio entre as coisas. Por isso, a escolha de uma coisa tão simples como um marcador pode ser um acto arbitrário uma atitude estética e ética como, no fundo, são todas as escolhas.
terça-feira, 25 de setembro de 2007
POESIA E FAVAS
Nem tudo na educação tem de ser subjugado à ideia de prazer.
O prazer de que se fala é, geralmente, solipsista e, pior, absolutamente superficial. Se o livro é muito grande e se esse facto prenuncia uma falta de prazer, dá-se a ler apenas um resumo. Se o resumo também está longe da ideia de prazer dá-se um resumo do resumo. Se mesmo assim, o jovem não encontra prazer naquelas 10 linhas escorridas, dá-se-lhe um CD interactivo e, como é necessário cumprir o programa, acaba-se a enviar os meninos para a investigação na net, ou seja, copy and paste, copiar , colar e imprimir.
Através de sucessivas reformas tão cheias de pântanos pedagógicos como de inutilíssimas acções de formação e regulamentos cada vez mais policiais, muitos dos nossos professores têm vindo a ser transformados em funcionários públicos, bem intencionados em muitos casos, mas ronceiros e cada vez mais incapazes de acender a paixão do saber nos seus alunos.
Muitos de nós aprendemos tarde, para lá da infância ou até da juventude, a gostar de algum daqueles pratos de sabor mais complexo da nossa culinária. No meu caso foram as favas. Não as aceitei bem quando as abordei das primeiras vezes. Não é fácil gostar de umas favas guisadas com toda aquela arquitectura de sabores que as torna num prato de excepcional qualidade.
Levou tempo até que, pela mão do meu pai, aprendi a gostar de favas e apercebi-me de que tinha acedido a um espaço de prazer requintado.
Hoje estou certo de que os grandes prazeres exigem grandes trabalhos, trabalhos penosos que terminam em palácios de excepcional beleza e superior prazer.
Ler a “Guerra e paz” de Tolstoi, os poemas de Rilke, de Celan, ou os Haikai de Bashô, a Divina Comédia de Dante ou os “Lusíadas” são aventuras que exigem uma disponibilidade e, talvez, um esforço significativo. Mas no final, e até muito antes do final, que luxuoso prazer!
Não tenho dúvida em afirmar que a sabedoria implica paixão e o apelo a um prazer que não se resume ao efémero do momento mas vai muito para além dele.
Encontrar um poeta que não conhecíamos e que nos abre uma porta para novas formas de nos relacionarmos com o mundo é um prazer de raríssima intensidade.
Aconteceu-me ficar em estado de completa euforia quando entrei pela obra do mexicano Octávio Paz, dos polacos Milosz e Szymborska, do francês René Char, entre outros. Mas não foi fácil porque são escritores de outros universos culturais, com experiências históricas diferentes, com ritmos e respirações poéticas que é necessário aprender a ouvir.
Depois, quando já caminhava pelas sendas por vezes intrincadas de alguns destes poetas, mal passei ao estado de paixão, tive de falar deles aos meus amigos, quase que obrigar as pessoas à minha volta a lê-los e a ouvi-los.
Acender a paixão pelo saber nos seus alunos implica que o professor viva ele próprio apaixonado pela leitura, pelas artes plásticas, pela ciência, pelo teatro, pelo cinema, pela música, pelo melhor que a vida tem para nos oferecer.
No entanto, a palavra paixão não faz parte do oficio, em geral canhestro e básico, de um gestor e, hoje em dia, muitos professores arriscam-se a afastar-se cada vez mais do saber, não passando de meros gestores da aquisição de saberes descartáveis.
Vem isto a propósito do trabalho com crianças à volta da poesia. Muitas vezes, nas nossas escolas, cai-se num equívoco perigoso que é o que confundir poesia com rima e com uso e abuso do lugar comum mais ou menos bem intencionado.
A poesia está muito para além disso. Situa-se num espaço de relação sempre nova e sempre arriscada com a palavra. Talvez não seja difícil trabalhar poesia com crianças. Mas é certamente violento, porque esse trabalho sai fora das boas intençõezinhas e do pequenino bom senso. A palavra poética rasga o mundo, vai ao fundo inquieta e exalta.
Não conheço muitas experiências de verdadeiro mergulho na alma da poesia com crianças. Esse mergulho é lento e exige um trabalho continuado sobre essa matéria complexa que é feita de afectos e emoções.
Há muitos anos a minha querida amiga Maria Rosa Colaço publicou “A criança e a vida”, um livro maravilhoso de poesia, poesia verdadeira, grande poesia escrita pelos meninos pobres da sua sala de aula de uma escola primária. Vai na 43ª edição. O primeiro poema do livro, escrito por um menino de 9 anos fala assim do amor.
O amor
é um pássaro verde
num campo azul
no alto da madrugada
Vítor Barroca Moreira
9 anos
Neste último ano estive ligado a duas experiências de trabalho sobre poesia em duas escolas do 1º ciclo. Apesar de breve, a experiência foi muito rica. Deixo aqui dois poemas e uma pequena homenagem às professoras que agarraram essa experiência, esperando que tenham a possibilidade de a continuar. Não sei se os meninos que passaram por este trabalho virão a ser poetas. No entanto, é muito provável que venham a ser leitores de poesia e pessoas um pouco mais capazes de dialogar com as suas emoções.
Quando estou triste
as nuvens tapam o sol dentro de mim
e as paredes apertam-me
e os meus olhos deitam um mar de escuridão.
Mas de repente
o sol regressa
e os seus raios abraçam-me
e os pássaros cantam à minha volta.
Susana, Inês, Rafael,
Escola do 1º Ciclo da Venda do Pinheiro
Professora Susana Lopes
Eu sou um pássaro
chamado Noite.
Eu sou um pássaro a voar
no meio das cinzas pretas e secas
de um rosto imundo.
Ou uma tesoura a cortar
um lápis preto.
João Marreiros
Escola do 1º Ciclo da Av. Heróis do Ultramar, Évora
Professora Rita Carrapato
(Texto publicado no nº 5 da revista Perspectiva, Setembro/07)
O prazer de que se fala é, geralmente, solipsista e, pior, absolutamente superficial. Se o livro é muito grande e se esse facto prenuncia uma falta de prazer, dá-se a ler apenas um resumo. Se o resumo também está longe da ideia de prazer dá-se um resumo do resumo. Se mesmo assim, o jovem não encontra prazer naquelas 10 linhas escorridas, dá-se-lhe um CD interactivo e, como é necessário cumprir o programa, acaba-se a enviar os meninos para a investigação na net, ou seja, copy and paste, copiar , colar e imprimir.
Através de sucessivas reformas tão cheias de pântanos pedagógicos como de inutilíssimas acções de formação e regulamentos cada vez mais policiais, muitos dos nossos professores têm vindo a ser transformados em funcionários públicos, bem intencionados em muitos casos, mas ronceiros e cada vez mais incapazes de acender a paixão do saber nos seus alunos.
Muitos de nós aprendemos tarde, para lá da infância ou até da juventude, a gostar de algum daqueles pratos de sabor mais complexo da nossa culinária. No meu caso foram as favas. Não as aceitei bem quando as abordei das primeiras vezes. Não é fácil gostar de umas favas guisadas com toda aquela arquitectura de sabores que as torna num prato de excepcional qualidade.
Levou tempo até que, pela mão do meu pai, aprendi a gostar de favas e apercebi-me de que tinha acedido a um espaço de prazer requintado.
Hoje estou certo de que os grandes prazeres exigem grandes trabalhos, trabalhos penosos que terminam em palácios de excepcional beleza e superior prazer.
Ler a “Guerra e paz” de Tolstoi, os poemas de Rilke, de Celan, ou os Haikai de Bashô, a Divina Comédia de Dante ou os “Lusíadas” são aventuras que exigem uma disponibilidade e, talvez, um esforço significativo. Mas no final, e até muito antes do final, que luxuoso prazer!
Não tenho dúvida em afirmar que a sabedoria implica paixão e o apelo a um prazer que não se resume ao efémero do momento mas vai muito para além dele.
Encontrar um poeta que não conhecíamos e que nos abre uma porta para novas formas de nos relacionarmos com o mundo é um prazer de raríssima intensidade.
Aconteceu-me ficar em estado de completa euforia quando entrei pela obra do mexicano Octávio Paz, dos polacos Milosz e Szymborska, do francês René Char, entre outros. Mas não foi fácil porque são escritores de outros universos culturais, com experiências históricas diferentes, com ritmos e respirações poéticas que é necessário aprender a ouvir.
Depois, quando já caminhava pelas sendas por vezes intrincadas de alguns destes poetas, mal passei ao estado de paixão, tive de falar deles aos meus amigos, quase que obrigar as pessoas à minha volta a lê-los e a ouvi-los.
Acender a paixão pelo saber nos seus alunos implica que o professor viva ele próprio apaixonado pela leitura, pelas artes plásticas, pela ciência, pelo teatro, pelo cinema, pela música, pelo melhor que a vida tem para nos oferecer.
No entanto, a palavra paixão não faz parte do oficio, em geral canhestro e básico, de um gestor e, hoje em dia, muitos professores arriscam-se a afastar-se cada vez mais do saber, não passando de meros gestores da aquisição de saberes descartáveis.
Vem isto a propósito do trabalho com crianças à volta da poesia. Muitas vezes, nas nossas escolas, cai-se num equívoco perigoso que é o que confundir poesia com rima e com uso e abuso do lugar comum mais ou menos bem intencionado.
A poesia está muito para além disso. Situa-se num espaço de relação sempre nova e sempre arriscada com a palavra. Talvez não seja difícil trabalhar poesia com crianças. Mas é certamente violento, porque esse trabalho sai fora das boas intençõezinhas e do pequenino bom senso. A palavra poética rasga o mundo, vai ao fundo inquieta e exalta.
Não conheço muitas experiências de verdadeiro mergulho na alma da poesia com crianças. Esse mergulho é lento e exige um trabalho continuado sobre essa matéria complexa que é feita de afectos e emoções.
Há muitos anos a minha querida amiga Maria Rosa Colaço publicou “A criança e a vida”, um livro maravilhoso de poesia, poesia verdadeira, grande poesia escrita pelos meninos pobres da sua sala de aula de uma escola primária. Vai na 43ª edição. O primeiro poema do livro, escrito por um menino de 9 anos fala assim do amor.
O amor
é um pássaro verde
num campo azul
no alto da madrugada
Vítor Barroca Moreira
9 anos
Neste último ano estive ligado a duas experiências de trabalho sobre poesia em duas escolas do 1º ciclo. Apesar de breve, a experiência foi muito rica. Deixo aqui dois poemas e uma pequena homenagem às professoras que agarraram essa experiência, esperando que tenham a possibilidade de a continuar. Não sei se os meninos que passaram por este trabalho virão a ser poetas. No entanto, é muito provável que venham a ser leitores de poesia e pessoas um pouco mais capazes de dialogar com as suas emoções.
Quando estou triste
as nuvens tapam o sol dentro de mim
e as paredes apertam-me
e os meus olhos deitam um mar de escuridão.
Mas de repente
o sol regressa
e os seus raios abraçam-me
e os pássaros cantam à minha volta.
Susana, Inês, Rafael,
Escola do 1º Ciclo da Venda do Pinheiro
Professora Susana Lopes
Eu sou um pássaro
chamado Noite.
Eu sou um pássaro a voar
no meio das cinzas pretas e secas
de um rosto imundo.
Ou uma tesoura a cortar
um lápis preto.
João Marreiros
Escola do 1º Ciclo da Av. Heróis do Ultramar, Évora
Professora Rita Carrapato
(Texto publicado no nº 5 da revista Perspectiva, Setembro/07)
POEMAS PARA UM DIA FELIZ
Grandes serão alguns dos poetas cuja escrita nasce do lado nocturno da vida. Não o vamos negar. Como também não podemos esquecer os outros, que exercem a sua arte com alegria espalhada pela vida e pelo verbo, inscrevendo-se do lado do sol, do amor realizado, da paixão pelos primores da natureza.
Desde o início dos tempos que a poesia está presente onde estiver o Homem com as suas ansiedades e inquietações, as suas dúvidas, o seu júbilo de criatura capaz de gozar com êxtase o desvario do coração, a frescura da terra, a deslumbrante imensidão do universo.
Também na poesia portuguesa temos casos extraordinários de poesia feliz. Ou melhor, de poesia escrita em estado de felicidade.
Foi assim a proposta que me pus: juntar alguns poemas que nos ajudem a viver ou a tornar um dia, um único dia mais feliz.
“Poemas para um dia feliz” é o terceiro volume de uma série em que ao livro se junta um CD de Áudio com a declamação dos poemas. Porque é certo que muita poesia se apreende melhor pela música da voz e foi encostados a uma voz que muitos de nós descobrimos a festa da poesia
Desde o início dos tempos que a poesia está presente onde estiver o Homem com as suas ansiedades e inquietações, as suas dúvidas, o seu júbilo de criatura capaz de gozar com êxtase o desvario do coração, a frescura da terra, a deslumbrante imensidão do universo.
Também na poesia portuguesa temos casos extraordinários de poesia feliz. Ou melhor, de poesia escrita em estado de felicidade.
Foi assim a proposta que me pus: juntar alguns poemas que nos ajudem a viver ou a tornar um dia, um único dia mais feliz.
“Poemas para um dia feliz” é o terceiro volume de uma série em que ao livro se junta um CD de Áudio com a declamação dos poemas. Porque é certo que muita poesia se apreende melhor pela música da voz e foi encostados a uma voz que muitos de nós descobrimos a festa da poesia
TRÊS POEMAS PARA UM DIA FELIZ
ANTÓNIO BOTTO
Afirmam que a vida é breve
Engano – a vida é comprida:
Cabe nela amor eterno
E ainda sobeja vida.
RUY BELO
E TUDO ERA POSSÍVEL
Na minha juventude antes de ter saído
de casa de meus pais disposto a viajar
eu conhecia já o rebentar do mar
das páginas dos livros que já tinha lido
Chegava o mês de maio era tudo florido
o rolo das manhãs punha-se a circular
e era só ouvir o sonhador falar
da vida como se ela houvesse acontecido
E tudo se passava numa outra vida
e havia para as coisas sempre uma saída
Quando foi isso? Eu próprio não o sei dizer
Só sei que tinha o poder de uma criança
entre as coisas e mim havia vizinhança
e tudo era possível era só querer
JOSÉ FANHA
Primeiro poema para a Matilde
Planta uma rosa branca.
Não chores
se um Outono provisório vier
dispersar as pétalas
ou se a terra as dissolver
no seu labor milenar.
Muitos anos depois
numa rua improvável
alguém há-de sorrir-te
com olhos de Primavera
e dentes brancos
como as pétalas
da rosa que um dia
soltaste ao vento.
Afirmam que a vida é breve
Engano – a vida é comprida:
Cabe nela amor eterno
E ainda sobeja vida.
RUY BELO
E TUDO ERA POSSÍVEL
Na minha juventude antes de ter saído
de casa de meus pais disposto a viajar
eu conhecia já o rebentar do mar
das páginas dos livros que já tinha lido
Chegava o mês de maio era tudo florido
o rolo das manhãs punha-se a circular
e era só ouvir o sonhador falar
da vida como se ela houvesse acontecido
E tudo se passava numa outra vida
e havia para as coisas sempre uma saída
Quando foi isso? Eu próprio não o sei dizer
Só sei que tinha o poder de uma criança
entre as coisas e mim havia vizinhança
e tudo era possível era só querer
JOSÉ FANHA
Primeiro poema para a Matilde
Planta uma rosa branca.
Não chores
se um Outono provisório vier
dispersar as pétalas
ou se a terra as dissolver
no seu labor milenar.
Muitos anos depois
numa rua improvável
alguém há-de sorrir-te
com olhos de Primavera
e dentes brancos
como as pétalas
da rosa que um dia
soltaste ao vento.
sexta-feira, 21 de setembro de 2007
QUERIDAS BIBLIOTECAS
Cada vez mais as Bibliotecas fazem parte da minha vida.
Gosto de livros. Melhor, gosto de ler. Gosto tanto de ler que não sou capaz de passar um dia sem ler pelo menos uma história, uma página de um romance, um poema, qualquer coisa.
Gosto muito de ler para mim em silêncio e de ler em voz alta. De ler para os outros e de partilhar com todos as viagens, as aventuras, as emoções que a leitura me traz.
Gosto de passear pelas bibliotecas e reencontrar esses velhos amigos que são os livros já lidos. Olha “Os Três Mosqueteiros”! E “O velho que lia romances de amor”! E “O Principezinho”! E “As aventuras de João Sem Medo”!
Também gosto de conhecer novos livros. Deixam água a boca e uma vontade enorme de pegar neles e desatar a lê-los.
Adoro as Bibliotecas. Mas não é só por causa dos livros. É também pelas pessoas que lá trabalham. E as que entram para ler. E as que saem com os livros emprestados debaixo do braço. E as que lá vão contar histórias. E as que escrevem essas histórias.
Também eu gosto de escrever histórias e poemas. Por isso é que vou a muitas escolas e Bibliotecas para ler os meus livros e conhecer os meus leitores. É como se fossemos todos da mesma família. Uma família que encontra um bom bocado de felicidade em volta das palavras, dos livros e das leituras.
Por tudo isto é que, cada vez mais, as Bibliotecas fazem parte da minha vida.
E agora há ainda mais uma razão para estar tão ligado às Bibliotecas. Vai inaugurar-se a terceira Biblioteca com o meu nome! Primeiro foi o Centro de Recursos da Escola EB 23 da Venda do Pinheiro, depois a Biblioteca da EB 1 nº3 do Cacém e, finalmente, inaugura-se no dia 26 de Setembro a Biblioteca José Fanha da Escola EB 1, JI do Olival Basto
Imagine-se! Três Bibliotecas! É um mundo! Não sei se mereço tanto carinho. Não sei se consigo acrescentar-lhes alguma coisa ao muito que já fazem.
Por isso criei este blog para todos, alunos e professores destas e de todas as escolas e de todas as Bibliotecas. Para partilhar as histórias e poemas que vou escrevendo, coisas malucas que ás vezes me acontecem como acontecem a toda a gente, livros e filmes de que gosto muito especialmente, e mais as memórias antigas, algumas fotografias, enfim, bocados grandes e pequenos do que tem sido a minha vida à volta de palavras e livros e leituras.
Gosto de livros. Melhor, gosto de ler. Gosto tanto de ler que não sou capaz de passar um dia sem ler pelo menos uma história, uma página de um romance, um poema, qualquer coisa.
Gosto muito de ler para mim em silêncio e de ler em voz alta. De ler para os outros e de partilhar com todos as viagens, as aventuras, as emoções que a leitura me traz.
Gosto de passear pelas bibliotecas e reencontrar esses velhos amigos que são os livros já lidos. Olha “Os Três Mosqueteiros”! E “O velho que lia romances de amor”! E “O Principezinho”! E “As aventuras de João Sem Medo”!
Também gosto de conhecer novos livros. Deixam água a boca e uma vontade enorme de pegar neles e desatar a lê-los.
Adoro as Bibliotecas. Mas não é só por causa dos livros. É também pelas pessoas que lá trabalham. E as que entram para ler. E as que saem com os livros emprestados debaixo do braço. E as que lá vão contar histórias. E as que escrevem essas histórias.
Também eu gosto de escrever histórias e poemas. Por isso é que vou a muitas escolas e Bibliotecas para ler os meus livros e conhecer os meus leitores. É como se fossemos todos da mesma família. Uma família que encontra um bom bocado de felicidade em volta das palavras, dos livros e das leituras.
Por tudo isto é que, cada vez mais, as Bibliotecas fazem parte da minha vida.
E agora há ainda mais uma razão para estar tão ligado às Bibliotecas. Vai inaugurar-se a terceira Biblioteca com o meu nome! Primeiro foi o Centro de Recursos da Escola EB 23 da Venda do Pinheiro, depois a Biblioteca da EB 1 nº3 do Cacém e, finalmente, inaugura-se no dia 26 de Setembro a Biblioteca José Fanha da Escola EB 1, JI do Olival Basto
Imagine-se! Três Bibliotecas! É um mundo! Não sei se mereço tanto carinho. Não sei se consigo acrescentar-lhes alguma coisa ao muito que já fazem.
Por isso criei este blog para todos, alunos e professores destas e de todas as escolas e de todas as Bibliotecas. Para partilhar as histórias e poemas que vou escrevendo, coisas malucas que ás vezes me acontecem como acontecem a toda a gente, livros e filmes de que gosto muito especialmente, e mais as memórias antigas, algumas fotografias, enfim, bocados grandes e pequenos do que tem sido a minha vida à volta de palavras e livros e leituras.
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