quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

SALVEM OS RICOS, AJUDEM OS MILIONÁRIOS



(Desenho de André letria)

Imagem possível do ano que passou se exceptuarmos os que lutam contra a corrente, entre os quais os 120.000 professores que vieram para a rua, a praça pública onde desde a Grécia clássica sempre se discutiram as coisas da Polis.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

LITANIA PARA ESTE NATAL



(Foto Henry Cartier Bresson)


Vai nascer esta noite à meia-noite em ponto
num sótão num porão numa cave inundada
Vai nascer esta noite à meia-noite em ponto
dentro de um foguetão reduzido a sucata
Vai nascer esta noite à meia-noite em ponto
numa casa de Hanói ontem bombardeada

Vai nascer esta noite à meia-noite em ponto
num presépio de lama e de sangue e de cisco
Vai nascer esta noite á meia-noite em ponto
para ter amanhã a suspeita que existe
Vai nascer esta noite à meia-noite em ponto
tem no ano dois mil a idade de Cristo

Vai nascer esta noite à meia-noite em ponto
Vê-lo-emos depois de chicote no templo
Vai nascer esta noite à meia-noite em ponto
e anda já um terror no látego do vento
Vai nascer esta noite à meia-noite em ponto
para nos vir pedir contas do nosso tempo.


David Mourão-Ferreira

domingo, 21 de dezembro de 2008

PORQUE É NATAL



Queridas amigas e amigos,

O que eu gostava mesmo era de ser o Pai Natal. O verdadeiro. O autêntico. O que desce pelas chaminés e leva uma prenda a cada menino. E, já agora, a cada adulto.

Sei que já não há chaminés por onde possa escorregar um Pai Natal que se preze. Teria de aprender outros truques para entrar na casa de cada um.

Mas havia de levar prendas daquelas que não são compradas à pressa. Nem precisam de muitos laços e fitas. Prendas com prendas dentro. Das que ficam muito tempo a fazer ninho no coração das pessoas.

Levava sorrisos. Sobretudo sorrisos. Não daqueles que se acendem a medo, de espinhela dobrada, “com-licença-faz-favor”. Mas sorrisos fortes como os dos homens que são capazes de olhar de frente a vida e dar a volta aos tropeços do destino.

Levava palavras. Palavras escritas devagarinho e com todas as letras. Palavras fraternas e limpas como as pedrinhas que se apanha à beira mar. Cada uma escolhida de propósito para cada pessoa.

Levava livros também. Daqueles que nos oferecem muitas horas de viagens verdadeiras, de alegria, de espanto, de maravilha, de medo, de ternura. Daqueles que nos fazem conhecer outras pessoas, com outros desejos, outras dores e outros sonhos. Livros que nos ajudam a saber que cada um de nós não é o centro do mundo e nos permitem a festa estender pontes daqui para ali, do nosso peito para o longe do universo.

Talvez não consiga levar-vos tudo isto pessoalmente. Mas segue um abraço dado com toda a força e o desejo de muita luz neste Natal.

José Fanha

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

LA SAETA



Há canções que nos marcam e nos comovem e nos acendem uma luz especial lá muito no fundo do peito.

Esta é uma delas, para mim. Poema de um dos meus poetas favoritos, António Machado. Música de Joan Manuel Serrat, aqui cantada por esse extraordinário cantor que foi Camarón de la Isla.


LA SAETA

¿ Quién me presta una escalera
para subir al madero,
para quitarle los clavos
a Jesús el Nazareno?

Saeta popular



¡Oh, la saeta, el cantar
al Cristo de los gitanos,
siempre con sangre en las manos,
siempre por desenclavar!
¡Cantar del pueblo andaluz,
que todas las primaveras
anda pidiendo escaleras
para subir a la cruz!
¡Cantar de la tierra mía,
que echa flores
al Jesús de la agonía,
y es la fe de mis mayores!
¡Oh, no eres tú mi cantar!
¡No puedo cantar, ni quiero
a ese Jesús del madero,
sino al que anduvo en el mar!

António Machado (Poeta espanhol)

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

EB 1 DA QUINTA DO CAMPO



O trabalho de muitos professores que estão á frente da dinamização das Bibliotecas Escolares é quase sempre fantástico e apaixonado como nas escola deste agrupento com as professoras Rosa Serra e Conceição Reboredo.

Deles depende a promoção do livro e da leitura que são uma das tarefas fundamentais do nosso ensino. Sem vencermos a batalha da leitura não há computador por mais magalhães que seja que nos sirva seja para o que for.

Muitos dos professores que se entregam a esta função de alma e coração receiam que a política economicista e facilitista deste governo estrangule a breve prazo as bibliotecas e o seu trabalho.

Vamos esperar que não. Que a falta de bom senso que tem campeado seja aplainada para que a luta pela exigência, pela excelência, pela leitura, pela educação no sentido mais nobre da palavra, e, já agora, pela poesia, não tenham que passar á clandestinidade.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

EL CORTE INGLÊS - NA CADEIRA DO PAI NATAL



A contar histórias e apresentar "Os sapatos do Pai Natal" sentado na cadeira do Pai Natal no 7º andar do El Corte Inglês onde se dão acontecimentos culturais de invulgar qualidade.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

KURT WEILL - SEPTEMBER SONGS




A RTP passou há alguns anos um extraordinário programa intitulado "Seprember songs" de homenagem a Kurt Weill, compositor alemão que fez a música para várias das peças e óperas de Bertolt Brecht. E não só.

Nesse programa, filmado numa velha fábrica abandonada participavam Lou Reed, P. J.Harvey, Betty Carter, Charlie Haden e outros.

Quando vi o programa comovi-me. Porque gosto muito da música de Weill. Porque em várias colaborações com o João Lourenço e a Vera San Payo fiz as versões para português de muitas letras de canções de Weill na "Ópera de três vinténs", na "Ascensão e queda da cidade de Mahagonny" e noutras.

A gravação do programa desapareceu-me. O meu amigo Tiago reencontrou as canções no You Tube. Vale a pena ver.

Aqui temos Nick Cave a cantar a célebre "Die Moritat vom Mackie Messer" da "Ópera de três vinténs" que se tornou num grande sucesso sob o título de "Mack the Knife"

domingo, 7 de dezembro de 2008

CRISE FINANCEIRA - NACIONALIZAÇÃO DE UM BANCO DE JARDIM




BANCARROTA

Crise financeira motiva nacionalização acidental de banco de jardim
Quando Joaquim Pires, jardineiro ao serviço da Câmara Municipal de Lisboa, decidiu solicitar aos seus superiores autorização para intervir num banco degradado do Jardim da Estrela, estaria longe de prever as bizarras consequências do seu zelo profissional. Duas semanas depois da participação, quando Joaquim comprara já madeira e verniz para proceder à reparação, foi surpreendido por uma nota oficial informando-o de que deveria abster-se de qualquer acção porque o referido banco entrara em processo de nacionalização. “Em quarenta anos de profissão, já vi um homem adulto a nadar com os patos e a fazer quá-quá, já encontrei reformados a jogar strip poker em pleno Inverno e até já lidei com alguém que andava a esculpir formas obscenas nos cactos, mas uma coisa destas surpreendeu-me”, refere o jardineiro. O engano ter-se-á devido a erro de processamento do sistema informático da administração central (composto por computadores Magalhães) que terá ignorado a multiplicidade de significados da palavra “banco”, depois de directivas rigorosas para lidar prontamente com todas as dificuldades de instituições bancárias e evitar o seu colapso. Sem querer reconhecer o erro, o governo prepara-se para nomear um administrador para o banco do Jardim da Estrela, bem como uma equipa de oitocentos colaboradores a tempo inteiro, instalados num edifício alugado nas imediações e submetido a dispendiosas obras de remodelação. Entretanto, Dias Loureiro deixou bem claro que nunca se sentou no banco em questão e a Presidência da República tornou público que Cavaco Silva não frequenta jardins porque a cor verde lhe provoca azia. Com o passar do tempo e o aumentar da degradação, o banco nacionalizado foi recentemente removido do local em que se encontrava, mas isso parece não incomodar ninguém.

Texto do blog INEPCIA.

sábado, 6 de dezembro de 2008

MAIS MOMENTOS



Sob direcção do Manuel Amaro da Costa, com o Rui Mendes, a fazer um pequeno papel na versão portuguesa do "Sim, sr. Ministro". Há-de ter sido lá por 1996 mais coisa menos coisa.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

MOMENTOS



Com o Joaquim de Almeida num dos programas que mais prazer me deu escrever que se chamava "DOCAS", 1996, TVI.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

COMO LA CIGARRA



Mercedes Sosa


COMO LA CIGARRA

"Tantas veces me mataron, tantas veces me morí, sin embargo estoy aquí resucitando.Gracias doy a la desgracia y a la mano con puñal, porque me mató tan mal,y seguí cantando.

Cantando al sol, como la cigarra, después de un año bajo la tierra, igual que sobreviviente que vuelve de la guerra.

Tantas veces me borraron, tantas desaparecí, a mi propio entierro fui, solo y llorando. Hice un nudo del pañuelo, pero me olvidé después que no era la única vez y seguí cantando.

Cantando al sol, como la cigarra,después de un año bajo la tierra, igual que sobreviviente que vuelve de la guerra.

Tantas veces te mataron, tantas resucitarás cuántas noches pasarás desesperando. Y a la hora del naufragio y a la de la oscuridad alguien te rescatará, para ir cantando.

Cantando al sol,como la cigarra, después de un año bajo la tierra, igual que sobreviviente que vuelve de la guerra".




María Elena Walsh - Poeta Argentina

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

VIVA A GREVE

A greve é o poder de quem não tem poder, a voz de quem não tem voz, a luz de quem vive na escuridão.

A greve é sagrada. Vem de longe. Vem do sangue, da fome, do desespero. Vem do amor aos filhos.

A greve é a festa de quebrar barreiras. O luxo da amizade e do companheirismo.

Quando não vem da remoenga burcrática, quando nasce da garganta e do coração, a greve é um poema escrito a muitas vozes.

Talvez por tudo isto os poetas estejam sempre em greve contra o lado negro da vida.

Viva a poesia! Viva nós! Viva a greve!

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

ADALBERTO ALVES RECEBE PRÉMIO SHARJAH DA UNESCO




O meu querido amigo Adalberto Alves foi laureado pela UNESCO com o Premio Sharjah 2008, que visa distinguir quem tenha contribuído de forma relevante para a promoção, preservação e revitalização da cultura árabe no mundo.

Adalberto Alves, que preside actualmente ao Centro de Estudos Luso-Árabes de Silves, foi laureado na sequência de recomendações de um júri internacional que analisou 33 candidaturas, apresentadas por 20 Estados-membros da UNESCO.

Para o Adalberto Alves, receber este prémio "é o coroar de muitos anos de trabalho de divulgação da herança árabe na cultura portuguesa".

Na sua obra vasta gostava de destacar os livros "O meu coraçõa é árabe", "Al-Mu'tamid/ Poeta do Destino".

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

UM POSTAL ERÓTICO



O meu amigo Mário Alberto foi a última pessoa a morar dentro do Parque Mayer.

Pintor, cenógrafo, boémio, iconoclasta assumidíssimo, o Mário Alberto, hoje doente, é um homem com um sentido de humor único e uma vida cheia de histórias absolutamente deliciosas e delirantes.

Conhecemo-nos quando ele desenhou a roupa para o primeiro trabalho de ficção que fiz para a RTP, uma série infantil chamada "Zarabadim". Ficámos amigos desde logo.

Numa altura de vida complicada, quando eu estava em baixo ia ter frequentemente com ele ao "escritório", ou seja, à cervejaria Ribadouro a dois passos do parque Mayer, onde o Mário "recebia" os amigos lá por volta da meia-noite.

Duas ou três histórias do Mário Alberto e todas as nuvens se me afastavam dos olhos, a alegria voltava, a gargalhada era garantida.

Um dia cheguei ao Ribadouro e o Mário Alberto quase saltava da mesa. "Ainda bem que apareces! Preciso que me escrevas um postal erótico. Mas em francês. Eu falar francês, falo como o caraças. Mas para escrever é que é mais difícil..."

O postal era para uma rapariga. Até aí tudo bem. Mas a rapariga era muito invulgar: uma beldade argelina!

Tudo tinha começado num restaurante da zona de Santos. A um canto almoçava um grupo grande de argelinos de passagem por Lisboa num cruzeiro. Entre eles, uma beldade "de fazer parar o trânsito".

O Mário Alberto não perdeu tempo. Na toalha de papel fez-lhes umas caricaturas rápidas e lá foi de toalha em punho meter conversa com eles mas, está visto, sempre de olho na beldade.

Ficaram amigos, trocaram moradas com aquela exuberância de quem sabe que nunca mais se há-de voltar a encontrar.

Mas o Mário Alberto ficou a empreender e resolveu mandar um postal erótico à rapariga e convidá-la a vir passar uns dias a Lisboa.

Com alguma apreensão lá escrevi o postal que ele já tinha bordado a desenhos devidamente alusivos.

Passaram-se dois ou três meses até voltar a vê-lo. Então e a argelina?, perguntei-lhe eu. "Nem me digas nada! Uma desgraça!" respondeu-me o Mário ironicamente pesaroso.

A argelina respondeu ao postal erótico e mostrou-se muito feliz com a perspectiva de vir ter com ele a Lisboa. Combinaram tudo. No dia aprazado o Mário Alberto muniu-se de um grande olho de rosas e foi esperá-la ao aeroporto. Mas a argelina que apareceu não era a beldade deslumbrante que ele esperava. Era outra, uma horrível, feia e "absolutamente imprópria para consumo"!

No meio das moradas recolhidas no tal restaurante, o Mário tinha baralhado as moradas da beldade com a desta sujeita que ainda por cima "... logo no primeiro dia gastou-me um pacote de esparguete daqueles que dão para um mês e esvaziou-me uma garrafa de litro de azeite!"

E depois, como é que a história acabou?, quis eu, de novo, saber. O Mário Alberto não arranjou melhor solução: fugiu para casa do irmão e só voltou à sua casa no parque Mayer quando teve a certeza que ela se tinha ido embora de vez!

Podia tirar daqui uma moral qualquer. Mas gosto da história assim mesmo, sem mais condimentos. E continuo a rir-me muito sempre que dela me lembro.



Capa de um livro que se encontra por aí nas prateleiras de algumas livrarias sobre a vida e a obra do meu amigo Mário Alberto.