sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

DEPOIMENTO

Maria Teresa Horta desenvolve uma música muito própria ligada à própria música do corpo, sendo uma das poetas que traz o corpo e o desejo de uma forma clara e livre para dentro do poema.


MARIA TERESA HORTA (1938)


DEPOIMENTO



Eis que desço
as mãos
os dedos nus

Eis que empunho
o vidro
pela face

Eis que te utilizo
e te
destruo

Eis que te construo
e te
desfaço

Eis o gume novo
desta
pedra

Eis a faca aberta
na
manhã

as árvores
ocultas
nas palavras

o couro – a violência
o trilho
a lã

Eis o linho bordado
numa cama

a linha na fímbria
da toalha

o fuso – o feltro
o fundo da memória

Eis a água
dita
como vã

depostos objectos
de batalha:

a tenda
a espada
a sela
a sede
a vela

Eis que deponho
aquilo
que me ganha

e que retomo
a seda com que visto
a faca da sede
com que rasgo

o rigor da calma
o rigor das pernas
o rigor dos seios
quando minto

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