Por vezes penso que a dimensão imensa de Fernando Pessoa deixou na sombra poetas seus contemporâneos que mereciam outra atenção.
É o caso de Almada Negreiros, alma intensa do nosso modernismo. Grande pintor, desenhador e poeta.
A FLOR
Pede-se a uma criança: Desenhe uma flor! Dá-se-lhe papel e lápis. A criança vai sentar-se no outro canto da sala onde não há mais ninguém.
Passado algum tempo o papel está cheio de linhas. Umas numa direcção , outras noutras; umas mais carregadas, outras mais leves; umas mais fáceis, outras mais custosas. A criança quis tanta força em certas linhas que o papel quase que não resistiu.
Outras eram tão delicadas que apenas o peso do lápis já era de mais.
Depois a criança vem mostrar essas linhas às pessoas: uma flor!
As pessoas não acham parecidas estas linhas com as de uma flor!
Contudo, a palavra flor andou por dentro da criança, da cabeça para o coração e do coração para a cabeça, à procura das linhas com que se faz uma flor, e a criança pôs no papel algumas dessas linhas, ou todas. Talvez as tivesse posto fora dos seus lugares, mas são aquelas as linhas com que Deus faz uma flor!
quarta-feira, 27 de agosto de 2014
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1 comentário:
LINDO! Dos mais belos poemas da nossa cultura literária.
Aliás, gosto de o considerar um princípio pedagógico, que devia estar afixado em todas as salas de aula, para RELEMBRAR que pode sempre existir uma flor onde nem sequer suspeitamos...
Flor
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