O SENTIDO
(Sobre pinturas de Joaquim Rodrigo)
I
Um dia, de manhã, ao acordar,
tomamos conhecimento
de que nada faz sentido.
Riso ou neve,
nada faz sentido.
Olhamos em redor,
encontramos o quê?
Fragmentos submersos,
membranas calcificadas,
palavras ázimas,
incêndios brancos sem qualquer correspondência
com a música nascida desse imenso continente
que é e foi e será sempre a comoção.
Um dia, de manhã, ao acordar,
o mundo torna-se inesperadamente estreito
e o tempo dos assassinos
começa a instalar-se
com seu doce sorriso sedutor.
Tudo fica ao rés de um fogo que se extingue
e Deus, tenha o nome que tiver,
terra ou mar ou vento,
não é mais que uma peça encravada
no remoer desdentado
de algum mecanismo inútil.
II
Um dia, de manhã, ao acordar,
tomamos conhecimento
de que tudo faz sentido
se soubermos encontrar o ovo essencial,
a fonte, o nome da alegria.
Rejubilamos, então.
Voltamos ao calor da terra.
Beijamos a raiz do cedro
E partimos a arder através da noite.
Aprendemos o caminho antigo
na palma da mão dos ferreiros,
dos oleiros,
os que inventam pássaros de vidro
no esconso da solidão.
É o momento em que as cores da terra
nos vêm chamar
para nos instilar a chama
do arco do seu saber.
Vermelho e sangue,
preto e ocre
são as cores
e dela somos feitos.
E há um risco demarcando
o território do silêncio
e outro
anunciando a chuva.
Barro, lama, lume,
tudo quanto somos
vinha anunciado em cada grão.
E a estrela brota cinco vezes
por dentro do coração.
E basta ler o relâmpago
e soltar a palavra
e declinar o verbo de que nasce a cor.
(de "Marinheiros de outras luas", a publicar)
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